Desde o início da pandemia do novo coronavírus, muitas dúvidas surgiram – e ainda têm surgido – sobre o comportamento da Covid-19, como as pessoas são infectadas e o avanço da pandemia. No meio de tantas questões há, entretanto, uma certeza: a necessidade de se fazer testes em massa.

Não há um único especialista em saúde que discorde da importância de testar as populações. A Coreia do Sul, por exemplo, se tornou um caso de sucesso na contenção do vírus justamente por fazer testes, testes e mais testes com os seus cidadãos. A Nova Zelândia, que zerou as ocorrências de Covid-19, idem.

Mas há um gargalo enorme de matéria-prima e de velocidade de testagem no País. Um problema que está prestes a ser resolvido. A Mendelics, empresa especializada em testes genômicos, e o Hospital Sírio-Libanês, desenvolveram um teste que pode mudar o jogo e facilitar a abertura da economia no Brasil.

Batizado de #PARECOVID, ele usa a tecnologia RT-LAMP, é mais simples de ser realizado e consegue identificar se uma pessoa está infectada com o novo coronavírus a partir da saliva. “Temos o resultado em 1 hora e este exame pode ser feito em larga escala”, diz David Schlesinger, CEO e fundador da Mendelics, ao NeoFeed.

Ao custo médio de R$ 95,00, metade do preço dos testes feitos no mercado, a Mendelics está se preparando para realizar 110 mil exames por dia. “Desde o início dessa pandemia, em mais de 100 dias, o Brasil realizou 900 mil testes. Conseguiremos ultrapassar esse número em dez dias”, diz Schlesinger.

É, de fato, um grande salto se comparado com as inovações que foram trazidas ao mercado. O Hospital Albert Einstein, por exemplo, criou e patenteou um exame que permite ao hospital realizar 24 mil testes por semana. O laboratório Fleury, por sua vez, desenvolveu uma técnica que permite a realização de 2 mil testes por dia.

Os estudos para a criação do teste da Mendelics e do Sírio-Libanês foram realizados nos últimos dois meses e, de acordo com Schlesinger, uma grande estrutura foi montada para dar conta do volume de trabalho.

Nas últimas semanas, um prédio de quatro andares na avenida Braz Leme, no bairro de Santana, em São Paulo, que já foi ocupado pela empresa de tecnologia Totvs, passou por uma enorme reforma para abrigar esse QG dos testes em massa.

Andares foram redesenhados, equipamentos médicos instalados e 50 cientistas, pesquisadores e biólogos moleculares começaram a transitar pelos seus corredores. O investimento total deve chegar a R$ 10 milhões e contou com o apoio de Laércio Cosentino, o fundador da Totvs e também acionista da Mendelics.

Cosentino, que é presidente do conselho da Totvs e da Mendelics, mergulhou de cabeça nesse projeto. “Consumiu 150% do meu tempo, dez anos da minha longevidade e trouxe cabelos brancos”, diz ao NeoFeed. E prossegue. “Essa é uma peça importante da volta à normalidade econômica e social.”

Não à toa, a Mendelics já está sendo muito procurada por empresas de setores como o automobilístico, de varejo e serviços para que realize testes em massa em seus funcionários. “É tanta conversa que não estamos dando conta”, diz Schlesinger. “Esses testes permitirão um retorno mais seguro.”

A princípio, o negócio pode ser considerado uma mina de ouro. Afinal, vai proporcionar uma escala fora do padrão. Enquanto o estado de São Paulo inteiro tem começados a fazer entre 25 mil e 30 mil testes por dia, juntando os sistemas público e privado, só a Mendelics atingirá mais do que o triplo no mesmo espaço de tempo.

Mas o fundador da companhia e o Hospital Sírio-Libanês não querem os louros e os lucros para si. “Vamos abrir todos os protocolos e dividir o conhecimento com laboratórios de todo o Brasil”, diz Schlesinger. “Acreditamos que esse é um dever social.” Se outros laboratórios adotarem a tecnologia, o País pode chegar a 1 milhão de exames feitos diariamente.

David Schlesinger é médico, fundador e CEO da Mendelics

O que chama a atenção no teste é a simplicidade no processo. Ao contrário de testes como o de anticorpos, que detecta se a pessoa foi infectada depois de duas semanas, e do RT-PCR, que demora de entre 4h e 6h para ser feito, o teste desenvolvido pela Mendelics e o Sírio-Libanês não necessita dos reagentes que estão em falta no mercado.

A extração também é simples. Basta coletar a saliva em um tubo estéril e deixar em temperatura ambiente para que o teste seja realizado. Os estudos mostraram que as características do vírus permanecem até seis dias depois de coletada a saliva, mas, por segurança, a Mendelics estipulou um limite de três dias.

Além disso, os testes mostraram uma especificidade de 100% – ou seja, não identificaram resultados falso-positivos – e uma sensibilidade de mais de 80%. “O Sírio-Libanês foi fundamental para validarmos todos os protocolos.”

Pode parecer detalhe, mas quanto menos equipamentos são usados, mais testes podem ser feitos. O RT-PCR, por exemplo, necessita de um swab longo (um cotonete esterilizado) para extrair a mucosa, mas esse tipo de material está em falta no mercado. “O líquido conservante também está escasso.”

Outro ponto sensível é que o swab nasal pode ocasionar a contaminação do profissional de saúde, pois, no momento da coleta, quando o cotonete é direcionado no nariz ou na garganta, o paciente pode espirrar ou tossir espalhando o vírus.

A coleta para o preparo do exame é simples, mas há temor de falta de tubos no mercado

No caso do teste #PARECOVID, há também um gargalo que preocupa Schlesinger. Trata-se do tubo estéril. A maior parte da produção mundial desse insumo está concentrada na China. “Resolvemos os problemas mais complexos e os mais mundanos são os que estão dando mais trabalho”, diz Schlesinger.

Há uma disputa cada vez maior entre os países por insumos médicos. Durante essa pandemia, em várias ocasiões, os EUA, por exemplo, foram acusados de interceptar equipamentos como respiradores mecânicos que iam para outros países. “Depois que tudo passar, os países e as indústrias precisarão rever suas cadeias de produção.”

Para Schlesinger, essa pandemia tem uma característica diferente no Brasil se comparada com outros países. “Aqui, ela tem característica de endemia, quando fica o tempo todo”, afirma. Na Europa, diz ele, a curva de contaminação subiu exponencialmente e daí se estabilizou, foi caindo e parou de crescer.

“No Brasil, estamos vendo mais e mais casos. A velocidade da curva de crescimento vai diminuindo muito lentamente. É um negócio que vai se espalhando porque o Brasil é muito grande e muito desigual.”

Por isso, os testes em massa serão cruciais. “Teremos um retorno à escola, retorno ao trabalho, retorno à sociabilização. É uma volta a normalidade. Um normal de máscara, com distanciamento, mas um normal com testes simples, não invasivos, baratos, que você pode fazer de maneira recorrente.”

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