A venda da ClearSale para a Experian por R$ 1,98 bilhão, um negócio divulgado nesta sexta-feira, 4 de outubro, representa um gosto amargo para os investidores que entraram na abertura de capital da empresa, em julho de 2021.

A dona da Serasa está pagando R$ 10,56 por ação, um prêmio de 23,5% sobre a cotação em que as ações da ClearSale fecharam o pregão de quinta-feira, 3 de outubro. Na época do IPO, a ação da empresa brasileira da área de segurança saiu cotada a R$ 25 – e, no pico – chegou a R$ 28,50.

Levando-se a cotação da ação do IPO, a desvalorização da CleaSale é de 57%. Em relação ao seu pico, a queda é de 63%. O IPO foi ancorado pelas gestoras Equitas, Squadra, Tork e JGP.

Pedro Chiamulera e Bernardo Carvalho Lustosa detém 44% da ClearSale. A Innova Capital, de Veronica Serra, tem 8,87% e a própria Veronica aparece com 9,0% da companhia brasileira.

Com a transação, a Experian vai fechar o capital da ClearSale. O acionistas da empresa brasileira podem receber o valor em dinheiro, em BDRs da Experian, ou 95% em dinheiro e 5% em BDRs.

Os investidores reagiram bem à divulgação da venda, avaliando que, diante das circunstâncias, foi a melhor saída para a ClearSale. Por volta de 11h51, as ações da empresa subiam 10,76%, a R$ 9,47, acumulando alta de 168,17% no ano.

A companhia realizou uma teleconferência para tratar da operação, mas não abriu para perguntas, com os executivos apenas apresentando os termos da operação. O CEO da ClearSale, Eduardo Monaco, afirmou que a “combinação técnica de ambas as empresas têm potencial para estimular o desenvolvimento de ofertas mais abrangentes e superiores para os clientes mitigarem fraudes”.

O IPO de pouco mais de R$ 1 bilhão injetou cerca de R$ 600 milhões no caixa da ClearSale, que foi avaliada em R$ 4,7 bilhões, bem acima dos atuais R$ 1,8 bilhão.

A abertura de capital ocorreu num momento em que muitas companhias aproveitaram o cenário de juros historicamente baixos, com o Banco Central (BC) afrouxando a política monetária para lidar com os efeitos econômicos da pandemia de Covid-19, para abrir capital. A ClearSale conseguiu emplacar o valor por ação no topo da faixa indicativa.

Mas a reversão desse cenário acabou sendo negativa para a companhia nos anos seguintes, que acabou dragada naquilo que seus executivos classificaram como “tempestade perfeita”, pesando sobre a tese de investimento até hoje.

Com a alta acelerada da taxa básica de juros, as vendas no e-commerce despencaram. No modelo de negócios da ClearSale, a receita é gerada pela taxa de sucesso. Parte do faturamento vem da quantidade de transações analisadas. Quanto mais, melhor.

Mas existe um redutor importante: o número de fraudes. Quando as barreiras nos golpes aos operadores financeiros não funcionam, a ClearSale sofre uma queda no faturamento. É como se ela dividisse o prejuízo com os clientes.

Ao mesmo tempo, a companhia dependia muito de sua solução antifraude e grandes contratos. Para resolver isso, a ClearSale promoveu uma reestruturação organizacional, criando três unidades de negócios independentes: e-commerce, application fraud e new ventures.

O plano também envolve reduzir a dependência desses grandes clientes, principalmente marketplaces de entrega física, e avançar em segmentos diversificados de maior crescimento e rentabilidade.

Apesar de alguns sinais positivos no quarto trimestre, a companhia ainda luta para conseguir apresentar resultados sustentáveis. A situação fez com que o Santander rebaixasse a recomendação para as ações da ClearSale para neutro, no começo do ano, cortando o preço-alvo de R$ 12 para R$ 3,50.

No segundo trimestre, a receita operacional líquida caiu 6% em base anual, para R$ 119 milhões. O Ebitda ficou negativo em R$ 10,4 milhões, uma piora ante o saldo negativo de R$ 3,3 milhões do segundo trimestre de 2023, considerando os efeitos dos Programas de Incentivo de Longo Prazo (ILP) – sem esse ponto, o Ebitda ficou positivo em R$ 300 mil, revertendo o resultado negativo.

Já o prejuízo líquido aumentou de R$ 1,9 milhão para R$ 10,8 milhões. Retirando os efeitos dos ILP, a perda foi de R$ 100 mil, 95,2% menor.

Em meio a esta situação, a Serasa viu uma oportunidade para agregar uma ferramenta consolidada no mercado antifraudes em sua plataforma de produtos, expandindo sua liderança no mercado de análise de crédito, posição que foi cimentada em 2007, quando o grupo irlandês Experian comprou o controle da Serasa, em 2007, por cerca de R$ 2,3 bilhões.

“Esse movimento nos permitirá oferecer uma solução ainda mais robusta de prevenção à fraude em todas as etapas da jornada do consumidor – desde o onboarding, passando pela autenticação, até a transação final”, afirma, em nota, o CEO da Serasa Experian, Valdemir Bertolo.