A decisão da Petrobras de não realizar o pagamento de dividendos extraordinários caiu muito mal entre analistas e investidores nesta sexta-feira, 8 de março. A frustração das expectativas criadas ao longo de 2023 está derrubando as ações da estatal, mesmo após a companhia fechar o ano passado com o segundo maior lucro de sua história.

Por volta das 15h40, as ações preferenciais da Petrobras caíam quase 9%, a R$ 36,80, sendo que abriram o dia com queda de mais de 11%. Os papéis acumulam queda de 1,2% no ano, levando o valor de mercado da companhia a R$ 532,2 bilhões.

Depois de deixar o mercado em suspense na quinta-feira, 7 de março, ao divulgar seus resultados por volta das 22h, a Petrobras anunciou que o conselho de administração decidiu que o lucro remanescente do ano passado, de R$ 43,9 bilhões, seria destinado para a reserva de remuneração do capital.

Já os dividendos que a companhia pretende pagar em relação ao resultado de 2023 podem totalizar R$ 72,4 bilhões, a depender da aprovação da assembleia de acionistas da proposta de distribuição de mais R$ 14,2 bilhões em dividendos. A assembleia está marcada para 25 de abril.

Diante da análise de que havia margem para a companhia distribuir dividendos extraordinários, analistas buscaram entender com a companhia o motivo para isso. Na teleconferência para tratar dos resultados, ocorrida nesta sexta-feira, 8 de março, a diretoria buscou esclarecer a questão, ainda que não tenha aberto o jogo totalmente.

Em meio à especulações de que os recursos poderiam ser utilizados para financiar investimentos, aquisições ou pagamento de dívidas com a União, o CEO da Petrobras, Jean Paul Prates, e a diretoria buscaram ressaltar que a reserva para onde o lucro remanescente foi não tem outra finalidade senão remunerar os acionistas.

“A reserva é voltada para dividendos”, afirmou o presidente da estatal. “Não tem que se propagar a informação errada de que esse valor é para investir ou pagar dívida.”

Segundo o CFO da companhia, Sergio Leite, o conselho de administração tomou a decisão por entender que era preciso manter um balanço robusto e ter cuidado com o uso de capital, considerando os investimentos previstos para os próximos anos e incertezas no cenário, sem entrar em detalhes sobre este segundo ponto.

O plano estratégico da Petrobras para o quinquênio de 2024 a 2028, anunciado em novembro, prevê investimentos da ordem de US$ 102 bilhões (R$ 507,4 bilhões), com redução de recursos indo para exploração e produção de petróleo e ênfase maior em projetos de energia limpa.

“Por trás da destinação dada pelo conselho [aos recursos] está a preservação de capital e cuidado com o fluxo de caixa da companhia”, afirmou Leite. “Os anos de 2024 e 2025 trazem investimentos expressivos.”

A retenção não foi unanimidade dentro do board. Prates revelou que o plano original da diretoria da Petrobras era distribuir metade do lucro remanescente, com o restante indo para a reserva.

Em maioria, os conselheiros ligados à União decidiram pela retenção integral, enquanto os conselheiros independentes queriam a distribuição. Prates disse que se absteve, porque seu voto não faria diferença, apesar de ter como intenção seguir a recomendação da diretoria.

Apesar da retenção do lucro excedente, os executivos afirmaram que o conselho pode mudar de opinião e aprovar o pagamento de dividendos extraordinários, mas disseram que não há indícios disso neste momento.

“Os recursos em reserva continuam sob análise, podendo ser distribuídos a qualquer momento”, disse Leite. “Quanto tempo vai ficar, não temos indicação de prazo neste momento.”

Reação

A decisão da Petrobras de não pagar dividendos extraordinários fez com que os resultados da companhia no quarto trimestre ficassem em segundo plano, ainda que, no geral, tenham vindo em linha com as expectativas.

Considerando que o pagamento extraordinário sustentava muitas das teses dos analistas para a empresa, sua frustração resultou em duras revisões de recomendação e preço-alvo. O Bradesco BBI e o Santander estão entre as casas que decidiram cortar suas recomendações para as ações da Petrobras, com ambas mudando de compra para neutro.

Segundo Vicente Falanga e Gustava Sadka, do Bradesco BBI, a medida trouxe incertezas para a política de dividendos da companhia. A expectativa é de que o pagamento extraordinário ficasse entre US$ 4 bilhões (R$ 20 bilhões) e US$ 5 bilhões (R$ 25 bilhões). Mas diante da frustração, eles revisaram de US$ 5 bilhões para US$ 2 bilhões as perspectivas de pagamentos de dividendos extraordinários nos próximos anos.

A perspectiva de pagamentos de dividendos extraordinários ajudava a Petrobras a se diferenciar no cenário internacional. “Sob a perspectiva de investidores olhando para mercados emergentes, acreditamos que o fluxo de recursos pode sair da Petrobras e ir para as companhias chinesas de petróleo (PetroChina e Sinopec), dado o recente turnaround na questão da disciplina de capital e os robustos programas de recompras de ações, e também para a Aramco, com a potencial oferta secundária”, diz trecho do relatório do Bradesco BBI, que também reduziu o preço-alvo das ações preferenciais de R$ 48 para R$ 41.

O Santander também promoveu um corte no preço-alvo das ações, de R$ 52 para R$ 47, destacado que sem os dividendos de curto prazo, a visibilidade quanto à estratégia de alocação de capital no curto prazo fica comprometida, considerando os US$ 18 bilhões que tem em caixa, além de apresentar um dividend yield de 9%, em linha com outras companhias.

A Petrobras fechou o quarto trimestre com um lucro de R$ 31 bilhões, queda de 28,4% em relação ao mesmo período do ano passado, em meio a um cenário em que o preço do barril de petróleo está mais baixo que um ano antes e maiores gastos com impairment e abandono de áreas.

A receita líquida recuou 20,2%, para R$ 134,2 bilhões no quarto trimestre, com a companhia afirmando que o desempenho foi afetado pelos menores volumes de vendas no mercado interno, além das questões relativas a preços do petróleo. O Ebitda caiu 8,5%, para R$ 66,8 bilhões.

Em 2023, a Petrobras fechou com um lucro líquido de de R$ 124,6 bilhões. Apesar de representar um recuo de 34% frente a 2022, o montante é o segundo maior já registrado pela companhia desde 2010 em valores nominais, segundo levantamento de Einar Rivero, da Elos Ayta Consultoria. O maior patamar atingido pela empresa foi justamente em 2022, quando registrou um lucro de R$ 188,3 bilhões.

Outros dados consolidados de 2023: a receita caiu 20,2%, para R$ 512 bilhões, enquanto o Ebitda ajustado recuou 23%, para R$ 262,2 bilhões. A dívida líquida da empresa em 2023 totalizou R$ 227,7 bilhões, alta de 1,46%, com a alavancagem alcançando 0,85 vez. O caixa da empresa registra crescimento no ano de 2023 de 19,5%, fechando em R$ 67,1 bilhões, melhor valor desde 2017 quando a empresa tinha R$ 80,7 bilhões em caixa, segundo a Elos Ayta.