O acordo para a fusão entre Arezzo&Co e Grupo Soma, como noticiou o NeoFeed com exclusividade, já foi selado entre Alexandre Birman e Roberto Jatahy. Os dois acordaram como será a governança e a participação de cada um na nova companhia: 56% para a Arezzo e 44% para o Soma.

O negócio, entretanto, ainda não foi assinado porque faltou “combinar com os russos”. Há resistência de acionistas relevantes no conselho do Soma, como a família Hering, e de acionistas institucionais de Arezzo. Do lado do Soma, há um questionamento sobre o preço. Afinal, não haverá prêmio, apenas uma troca de ações em que o Soma sai como o “comprado”.

Apesar de a Arezzo&Co ter a possibilidade de sair como vencedora de um negócio que vai gerar um colosso com 34 marcas, quase 22 mil funcionários, mais de 2 mil lojas – das quais 70% são franquias – e presença em 21.000 lojas multimarcas em todo o País, há investidores que questionam a transação.

A primeira questão é fazer um negócio dessa magnitude sem uma diligência. Como são empresas de capital aberto, não há muito o que se possa fazer nesse sentido. “Mas é uma questão importante. A Americanas, por exemplo, era uma empresa de capital aberto”, diz uma fonte a par das movimentações.

A segunda é sobre o endividamento do Soma. No terceiro trimestre do ano passado, segundo o balanço mais recente divulgado, a empresa tinha um caixa de R$ 175,9 milhões e uma dívida líquida de R$ 859,6 milhões. E a terceira é sobre a fragilidade do Soma diante da MP 1185, que muda a tributação no setor e acaba com o benefício de ICMS que a companhia recebe no Rio de Janeiro.

“A Arezzo também é impactada pela MP 1185, mas em uma escala bem menor do que o Soma”, diz um gestor que conhece os papéis. “Para o Soma, esse é um problemão.” Um estudo do Itaú BBA, com estimativas de perdas para as empresas varejistas, mostra bem o que significa.

Estima-se que, por conta da perda de incentivos fiscais, o Soma veria R$ 175 milhões de seu lucro desaparecer em 2024 – o que representaria 36% do seu resultado. Mais: o valuation também muda bruscamente. O impacto nos múltiplos varia de 11,4 vezes a 17,9 vezes.

Há, evidentemente, outros meios de reduzir o impacto como judicializando a questão ou repassando aumento da perda do benefício para o consumidor. “Coisa de 5%”, diz um gestor que conhece o papel. As sinergias de R$ 4,5 bilhões que estão sendo divulgadas também deixam muitas dúvidas. “É um exagero para convencer o mercado”, diz um investidor.

Mas há, obviamente, ganhos. Segundo analistas do J.P. Morgan, a fusão “poderia potencialmente gerar R$ 4 bilhões em benefícios fiscais de ágio, dependendo da estrutura do negócio, provavelmente ajudando a neutralizar o pagamento de impostos em dinheiro para mais 5 a 10 anos e quase compensando os impactos das mudanças nos incentivos de ICMS.”

Outro gestor, mais otimista com o negócio, diz que a fusão é um ganha-ganha. “A Arezzo queria comprar a Hering e preparou um amplo estudo mapeando como tornar a operação mais eficiente e lucrativa”, diz ele. “O Soma entrou no caminho e comprou a Hering de forma atabalhoada, sem plano. A entrada da Arezzo aceleraria a Hering.”

A Hering, que tem parque industrial, poderia produzir as peças da Reserva. O Soma, que é irrelevante em calçados, poderia ganhar tração no segmento dominado pela companhia da família Birman. A Arezzo, por sua vez, ganharia força em um setor no qual o grupo ainda não conseguiu deslanchar, apesar da tentativa com a marca Schutz: o vestuário feminino.

O que gera temor em todo esse emaranhado de negócios é a governança. Mesmo que os negócios sejam divididos em quatro unidades, Birman tem uma personalidade forte e centralizadora. Jatahy tem outro estilo, mas construiu um conglomerado grande. São dois egos grandes e as culturas das empresas são diferentes. Eis mais um desafio para ser costurado nos próximos dias.