Em meio às perspectivas de crescimento do mercado de biogás no País e à necessidade de reduzir as emissões de metano do agronegócio, a mineira Regera está se reforçando para aproveitar a “janela de oportunidade” aberta por essas duas demandas para expandir suas operações.

Uma das pioneiras no desenvolvimento de plantas de biometano a partir do tratamento de rejeitos do agronegócio, ainda que pouco conhecida no eixo Faria Lima-Leblon, a empresa de Patos de Minas, interior de Minas Gerais, fechou um acordo com a Shift Capital e a Riza Asset para receber o primeiro aporte de capital em quase sete anos de existência.

A operação prevê um investimento inicial de R$ 80 milhões neste ano, com a possibilidade de o valor chegar a R$ 200 milhões em até dois anos. Com os recursos, a Regera pretende aumentar a quantidade de usinas próprias das atuais duas para 12 nos próximos anos.

“De dois anos para cá, o mercado de biogás aqueceu de forma absurda, e o mercado financeiro, com toda a onda ESG, enxergou a oportunidade. Estamos num momento em que esse tipo de solução é a bola da vez”, diz André Alves, co-CEO da Regera, ao NeoFeed. “Vimos uma janela de oportunidade e entendemos que, se não acelerarmos os investimentos, ficaremos para trás, por isso fomos atrás de recursos.”

A Shift e a Riza, que faz a gestão de mais de R$ 12 bilhões em 16 fundos e está voltando a investir em ativos ilíquidos, dividiram pela metade o cheque. O acordo prevê que elas terão uma participação minoritária no capital da Regera. O aporte contou com a Criteria, que atuou como assessor financeiro exclusivo da operação, e os escritórios de advocacia Machado Meyer e Manassero. O valuation não foi divulgado.

Com os R$ 80 milhões, a Regera pretende construir quatro novas unidades em 2024, uma delas no Paraná e outras três em São Paulo. No ano que vem, a partir dos recursos da segunda parte do aporte, a Regera planeja construir mais seis unidades, com os Estados ainda para serem determinados.

As unidades desenvolvidas pela Regera são capazes de dar destino a diversos tipos de resíduos de produtores rurais, de dejetos animais a restos da agricultura e carcaças animais. Esses rejeitos acabam transformados em matéria-prima para a produção de biogás, que pode ser convertido em biometano ou utilizado na produção de eletricidade, e também servem para produzir fertilizantes orgânicos.

As quatro unidades em construção terão capacidade conjunta de processar 25 mil metros cúbicos por dia de biometano e produzir 15 mil toneladas de fertilizantes por ano. Hoje, com as plantas atuais, a Regera tem capacidade de produzir cerca de 5 mil metros cúbicos de biometano por dia, tendo produzido 5 mil toneladas de biofertilizantes no ano passado.

O fertilizante produzido pela Regera é comercializado através da marca própria da empresa, a Reager. O biometano é vendido para distribuidores de gás natural que atuam nas regiões em que estão as usinas. A empresa não divulgou dados sobre faturamento.

Atração pelo interior

O fato de o biogás produzido pelas plantas da Regera poder abastecer o interior do País foi um dos fatores que atraiu a Shift, sócia de nomes como Kovi, Paketá Crédito e Zerezes. “Hoje, toda a infraestrutura de gás natural do País está no litoral, principalmente, e você não tem uma fonte no interior de gás. Estamos construindo as plantas para ser uma fonte descentralizada, resolvendo dois problemas, de emissões e abastecimento, com uma única solução”, diz Henrique Joppert, sócio e COO da Shift.

A gestora começou a olhar para o agronegócio em 2020 e um de seus primeiros investimentos foi na fintech TerraMagna, em 2021. A escolha pela Regera veio dos estudos a respeito do biogás, realizados há mais de um ano, diante do entendimento da gestora que o segmento agro precisa encontrar uma solução para a emissão de metano.

“Viemos ativamente buscando outras oportunidades no agronegócio, sempre buscando a inovação”, diz Joppert. “E vimos isso na Regera, que consegue destinar o resíduo do agronegócio. É exatamente uma solução que o setor precisa e não está bem consolidada no País, que vamos desenvolver com a Regera.”

O aporte vem em um momento promissor para o mercado de biogás. Em meio à crescente demanda por soluções verdes, os combustíveis sustentáveis estão cada vez mais no centro das atenções. Em 2022, o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro anunciou incentivos para a construção de 25 plantas de biogás e biometano.

E o Projeto de Lei (PL) 4.516/2023, conhecido como PL do Combustível do Futuro, apresentado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano passado, traz medidas para incentivar o consumo de biometano, ainda que tenha provocado polêmica.

A perspectiva é um salto na produção brasileira. De acordo com projeções da Associação Brasileira de Biogás (Abiogás), a produção de biometano deve crescer 600% até 2029, saindo do atual 1 milhão de metros cúbicos por dia para 7 milhões de metros cúbicos ao dia.

Esse cenário tem motivado outros nomes para atuar no segmento. A Atvos, uma das maiores produtoras de etanol do País, anunciou na quarta-feira, 10 de abril, a assinatura de um Memorando de Investimentos para a construção de sua primeira unidade de biometano a partir de resíduos da cana-de-açúcar.

A EB Capital também está se posicionando no segmento. A gestora pretende criar uma empresa de biogás que também terá como matéria-prima resíduos orgânicos. “Nossa ideia é ter cerca de 150 usinas em um curto período de tempo”, disse Eduardo Melzer, fundador e CEO da gestora, em entrevista ao programa É Negócio, parceria do NeoFeed e CNN Brasil, que foi ao ar em 24 de março.

Para Marco Marques, co-CEO da Regera, o fato de a empresa ter desenvolvido tecnologia própria capaz de processar vários tipos de resíduos traz um diferencial competitivo fundamental para a tese da companhia. “Hoje, tem empresas fazendo o que a gente faz, mas são especializadas em alguns tipos de resíduos, nenhuma empresa conhece como a gente tantos tipos de resíduos”, afirma marques.