À frente da FFA Financeira, Fernando Ferraz já acumulava mais de duas décadas no mercado de crédito quando decidiu testar uma nova tese. Era agosto de 2021 e o espaço escolhido foi o segmento de consignado privado, combinado a um viés de educação financeira e sustentabilidade.

Prestes a completar dois anos, o projeto está ganhando fôlego e um novo nome. Rebatizada como VIPe, a fintech está anunciando seu primeiro aporte, de R$ 110 milhões, cuja captação teve início em 2022 e está sendo concluída agora.

Uma parcela desse montante veio na forma de equity, por meio de um aporte, de valor não revelado, do fundo brasileiro Airborne Ventures. O restante da cifra está ligado a recursos de um fundo de investimento em direitos creditórios (FIDC) estruturado para financiar suas operações de crédito.

Durante a fase de validação, o time de sócios da VIPe foi reforçado por dois ex-Bradesco: Caique Galluci, com passagens, entre outras áreas, pelo Bradesco BBI; e Eduardo Kupper, que atuava como head do Inovabra, hub de inovação do banco e que é um dos fundadores do Airborne Ventures.

“No início, nossa opção foi ter uma operação bootstrap, até mesmo porque os players tradicionais de venture capital já estavam posicionados nesse espaço”, diz Kupper, ao NeoFeed. “E decidimos também ficar fora do radar até provarmos nossa tese e trocarmos nossa marca. Agora, vamos ao mercado.”

Partindo do crédito consignado privado, o modelo ao qual ele se refere tem como premissa dar um atendimento mais consultivo e de orientação financeira a clientes que, em média, ganham até quatro salários mínimos. E que, em geral, não têm acesso a esse tratamento diferenciado. Daí, o nome VIPe.

“Boa parte do mercado quer simplesmente originar o crédito rápido e bater a meta de produção”, observa Fernando Ferraz. “Isso não é sustentável, e mais ainda para esse público, que é carente de educação financeira. Você endivida e acaba prejudicando a pessoa. Ninguém sai ganhando.”

Nesse fluxo, o time da VIPe busca entender qual é a finalidade, a situação financeira e o quanto aquele crédito vai comprometer o orçamento do cliente. E, nesse processo, pode sugerir um novo valor - menor ou maior - e mesmo um outro caminho para que, por exemplo, a pessoa renegocie suas dívidas.

“Muitas vezes esse time reduz o valor solicitado inicialmente”, afirma Kupper. “O que, em tese, é contra o nosso interesse, que seria originar o máximo possível de operações.”

A mesma abordagem de atendimento é usada na cobrança e em outras etapas posteriores ao crédito. Aqui inclusive, no lugar de termos comuns no mercado, como customer success, a empresa decidiu dar outro nome à equipe responsável pela interação com os usuários, batizada de “time do afeto”.

“Ao mesmo tempo, tanto essa equipe como a de originação são compostas por pessoas diversas, que moram em regiões periféricas e enfrentam os mesmos desafios de muitos desses clientes”, afirma Ana Flavia Cabral, chief sustinability officer da VIPe.

O open finance é logo ali

Do discurso à prática, a VIPe nasce com uma base de aproximadamente cem empresas que abraçaram essa proposta de “crédito com afeto” e que somam cerca de 150 mil funcionários. Em pouco mais de um ano de operação de fato, a empresa originou quase R$ 100 milhões em crédito. “Nossa projeção é chegar a R$ 150 milhões na carteira e a cerca de R$ 200 milhões originados no fim de 2023”, diz Ferraz.

Além de financiar essas operações, parte dos recursos vem sendo aplicada na ampliação da equipe. Há um ano, o quadro era formado por doze funcionários. Atualmente, são cinquenta e o plano é fechar 2023 com até cem profissionais.

Em outra ponta, a VIPe está ampliando seu portfólio e investindo em tecnologia. As linhas de adiantamento de salário e de consórcios já foram adicionadas a esse pacote. Agora, além de produtos como seguros, um dos focos é reforçar a oferta com recursos como inteligência artificial.

Fernando Ferraz, sócio-fundador da VIPe

“Com o open finance, a ideia é fazer um acompanhamento da vida financeira desse cliente, claro, com seu consentimento”, explica Ferraz. Sob essa ótica, o plano passa, por exemplo, por antecipar problemas que o usuário possa ter e sugerir, na sequência, alternativas para solucionar essas questões.

Segundo Kupper, a ampliação desse portfólio, que pode incluir ofertas de terceiros, vai buscar cobrir três frentes: créditos emergenciais; educação financeira e produtos para equilibrar a vida financeira; e produtos em áreas como investimentos, para quem consiga atingir esse equilíbrio.

“Já estamos em fase de negociações para levantar mais recursos, em equity e via FIDC”, observa Kupper, sobre parte dos planos para financiar esse crescimento na oferta de produtos e também de crédito. “Vamos buscar algo em torno de R$ 180 milhões.”

O segmento de crédito consignado privado, em que a VIPe teve origem, vem atraindo cada vez mais players. Um dos mais recentes é o PicPay, que ingressou nessa arena em fevereiro desse ano, a partir da aquisição do marketplace BX Blue.

Entre os nomes que estão nesse mercado há mais tempo, a Paketá levantou R$ 300 milhões em um FIDC estruturado pela Milenio Capital, em dezembro de 2022. Já em janeiro desse ano, a fintech captou R$ 16 milhões em uma extensão da sua série A, realizada no fim de 2021, no valor de R$ 27 milhões.