Em 2019 a consultoria McKinsey publicou um estudo em que analisava o nível de digitalização de diferentes setores da economia. O mais avançado nesse movimento era o mercado de turismo, com 51% de digitalização. O setor de saúde aparecia diversas posições abaixo, com modestos 24%.
Não é surpresa, portanto, que o consumidor conseguisse ter acesso a produtos e serviços como passagens aéreas, compras de supermercado, entrega de comida, transportes e outros, mas ainda cuidasse de sua saúde de forma quase 100% analógica.
Ele conseguia acessar até sua vida financeira com um toque no app do celular, mas para falar com um médico, por exemplo, só indo pessoalmente ou fazendo uma ligação telefônica. Um tanto quanto jurássico. O ano de 2020, porém, representou o ponto de virada do setor.
Quantos de nós fizemos pela primeira vez uma consulta por telemedicina ou conhecemos alguém que fez? Por conta da pandemia, essa palavra que nem fazia parte do nosso vocabulário, de repente se transformou em sinônimo de acesso a saúde.
Para nós do Fleury, se transformou também em um poderoso vetor de crescimento. Lançamos o serviço de telemedicina em abril e, até dezembro, havíamos realizado 150 mil atendimentos por meio de nossos serviços digitais.
Esse é o tipo de solução em que todos ganham. Para o Fleury, representa uma avenida de crescimento. Para os médicos, uma forma de continuar atuando com segurança durante a pandemia. Para os pacientes, é uma maneira de manter os cuidados com sua saúde, com toda conveniência.
Em um recente artigo da Revista Oficial da Academia Americana de Neurologia, médicos consideraram o uso da telemedicina satisfatório em 93% dos casos e sugerem seu uso como componente de acompanhamento para 89% das consultas. Além disso, 86% dos pacientes indicaram interesse em continuar utilizando esse modelo de atenção para seu cuidado no futuro.
A telemedicina é o primeiro sinal de que o consumo de saúde ficou mais digital, porém não é o único. O acesso à saúde seguirá cada vez mais um modelo híbrido – presencial e virtual – e não se dará mais exclusivamente em instalações físicas tradicionais.
“O uso de BI e analytics será uma alavanca de transformação para melhorar a qualidade de saúde das pessoas de maneira escalável”
Outra prova da mudança de comportamento dos pacientes foi nosso crescimento em atendimento domiciliar: um aumento de quase 70% nos primeiros 9 meses de 2020, se comparado ao mesmo período do ano anterior.
Quem experimenta fazer exames laboratoriais ou de ultrassom em casa, aprova a comodidade e a segurança. Prova disso é o alto NPS (Net Promoter Score) que registramos no atendimento móvel: 82%.
Esse modelo híbrido é também uma poderosa alavanca para o crescimento da Saúde iD, a plataforma que lançamos, de forma pioneira, no segundo semestre e que já nasceu com 7 milhões de vidas. Outras empresas do mercado anunciaram depois iniciativas na direção de criar marketplaces.
Assim como já acontece em outros mercados, o setor de saúde terá de, cada vez mais, se valer do uso de dados para criar uma boa experiência de uso para os pacientes, integrando suas informações e facilitando seus cuidados (tudo isso, obviamente, respeitando com rigor a LGPD). O uso de BI e analytics será uma alavanca de transformação para melhorar a qualidade de saúde das pessoas de maneira escalável.
A segunda grande mudança que veio para ficar é que o comportamento dos pacientes em relação aos seus cuidados de saúde será cada vez mais proativo. Até recentemente, a maioria das pessoas lidava com saúde de forma reativa, basicamente cuidando das doenças à medida que essas apareciam.
Daqui pra frente, no entanto, a partir da conveniência e do acesso viabilizado pelas soluções tecnológicas, será possível se antecipar aos problemas. Em resumo, vamos, de fato, cuidar cada vez mais da SAÚDE e não da doença – o que traz benefícios não só para os pacientes, mas para a sustentabilidade de todo o setor.
Na nossa visão, 99% das necessidades de saúde serão atendidas de maneira híbrida por um ecossistema de soluções de baixa complexidade: unidades de atendimento ambulatorial, cuidados levados às casas dos pacientes, telemedicina. Hospitais continuarão tendo seu papel no tratamento de doenças graves e de cirurgias complexas.
Acreditamos que o Brasil vai seguir uma tendência que já é vista na China, onde já existem aproximadamente 500 diferentes organizações que têm foco nessa construção. Criar ambientes altamente baseados em tecnologia para acompanhar e tratar seus pacientes em suas casas e ambientes de menor complexidade.
“O Brasil vai seguir uma tendência que já é vista na China”
A Covid-19, que trouxe desafios inimagináveis para todo o planeta, obrigou as empresas que atuam no setor de saúde a acelerar suas iniciativas digitais para acompanhar as novas necessidades dos pacientes.
É difícil imaginar que quem experimentou as vantagens de um teleatendimento ou de um atendimento domiciliar, por exemplo, vá voltar ao modelo antigo depois do fim da pandemia. As empresas que não entenderem que é mandatório avançar rapidamente nessa direção, enfrentarão dificuldades num futuro próximo.
Tenho certeza que, daqui a alguns anos, o retrato da digitalização do setor – no Brasil e no mundo - será muito diferente daquele que apareceu no levantamento de 2019.
Carlos Marinelli é CEO do Grupo Fleury