O Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) manteve as taxas de juros inalteradas nesta quarta-feira, 1º de novembro, na faixa de 5,25% a 5,5% ao ano, ao mesmo tempo que deixou a porta aberta a um aumento futuro.
O crescimento robusto da economia americana, a uma taxa anualizada de 4,9% durante os três meses encerrados em setembro, continua influenciando nas decisões da autoridade monetária, que há 19 meses tenta esfriar a economia dos EUA.
Em entrevista coletiva, o presidente do Fed, Jerome Powell, deixou claro que se a economia americana continuar crescendo ou se o mercado de trabalho não retrair, a autoridade monetária poderá aumentar os juros.
“Se esse crescimento colocar em risco novos progressos na queda da inflação é justificável um maior aperto da política monetária”, advertiu Powell.
A postura cautelosa do Fed reforça a percepção de que a inflação, embora em queda, ainda não foi vencida. A taxa de inflação anual dos EUA foi de 3,7% nos 12 meses encerrados em setembro, mesmo índice de agosto.
Imediatamente após o anúncio, a ações dos EUA foram negociadas em alta, enquanto o índice Dow Jones aumentou em 0,7%. O S&P 500 atingiu a máxima da sessão, subindo 1,1%. Já o Nasdaq Composite, de alta tecnologia, teve elevação de 1,6%.
“Chegamos muito longe com esse ciclo de aumento das taxas”, afirmou o presidente do Fed. “Mas será que ‘muito longe’ é suficientemente longe? Teremos que esperar para ver”, acrescentou.
A reunião do Fed ocorreu em meio a sinais contraditórios da economia americana para reduzir a inflação. Por um lado, o crescimento no terceiro trimestre mais do que duplicou o registrado no trimestre anterior e foi acompanhado por um aumento de consumo.
Por outro, a combinação de resiliência econômica e inflação moderada deu às autoridades a esperança de que poderão conseguir desacelerar a economia de forma gradual e sem provocar recessão, o chamado “pouso suave”.
Perguntado por que o Fed tem tido sucesso em reduzir a inflação sem causar uma recessão, Powell apontou para a “eliminação das distorções” da pandemia, que permitiu que a inflação diminuísse por si só – cabendo ao Fed adotar medidas para desestimular o consumo.
Mas, segundo ele, em algum momento esse processo terminará e o Fed espera que a inflação ainda não volte aos 2% quando isso acontecer. “Nessa altura, é provável que reduzir a inflação durante o resto do caminho se torne mais doloroso”, disse, deixando a entender que o Fed precisará fazer um aumento final nas taxas nos próximos meses.
Na reunião anterior, em setembro, os integrantes do Fed previram que seria provavelmente apropriado mais um aumento de 0,25 ponto percentual nas taxas de juros antes do fim de 2023. No comunicado oficial do Fed, porém, não houve menção a essa possibilidade.
Analistas citaram a principal mudança desde então – o crescimento das taxas de juro de longo prazo dos títulos do Tesouro. Embora o Fed estabeleça os custos dos empréstimos de curto prazo, as taxas de longo prazo ajustam-se com maior atraso e por diversas razões.
O seu recente aumento tornou tudo mais caro, desde hipotecas a dívidas empresariais – o que na prática faz o trabalho do Fed de esfriar a economia. Perguntado sobre o impacto do rally dos títulos de longo prazo do Tesouro, Powell saiu pela tangente.
“As condições financeiras tornaram-se mais restritivas, mas não sabemos quão persistentes serão”, disse, acrescentando não saber como o aumento dos rendimentos dos títulos está impactando a política monetária.
O rendimento dos títulos do Tesouro de dois anos, que acompanha as expectativas de taxa de juro, caiu para 4,98% nesta quarta-feira após a reunião do Fed, o seu nível mais baixo em quase três semanas. O rendimento de 10 anos, que acompanha as expectativas de crescimento e inflação, caiu brevemente antes de se recuperar.
Dívida e títulos
O mercado financeiro ficou aliviado não apenas pela decisão do Fed de manter a taxa de juros inalterada. Horas antes da reunião do BC americano, o Departamento do Tesouro anunciou seu planejamento para emissão de títulos da dívida americana no quarto trimestre.
Em tempos de juros elevados e forte expansão fiscal do governo americano, os dois pilares do mercado de títulos – o Tesouro dos EUA, que emite títulos para bancar a dívida pública, e o Fed, que determina a taxa de juros que o governo americano paga para tomar empréstimos – vêm impactando não só a política monetária americana como a economia global.
Em agosto, quando fez o planejamento até o fim do terceiro trimestre, o Tesouro teve de vender mais obrigações de longo prazo do que o esperado, a fim de cobrir os déficits.
Nesta quarta-feira, 1º de novembro, porém, o Tesouro decidiu aumentar a emissão de títulos de prazo mais curto no ritmo estabelecido há três meses, ao mesmo tempo que vai desacelerar o ritmo das emissões dos papeis de 10 anos e 30 anos.
A medida foi bem recebida pelo mercado, que temia uma expansão de emissões dos papeis mais longos. Nos seus leilões trimestrais de reembolso na próxima semana, o Departamento do Tesouro venderá US$ 112 bilhões em dívida, valor inferior aos US$ 114 bilhões colocados em oferta no trimestre anterior.
O Tesouro precisa arrecadar US$ 776 bilhões com a vendas neste trimestre, um recorde para os últimos três meses do ano. O fato de a cotação dos títulos de longo prazo do Tesouro ser acompanhada de perto mostra como a expansão fiscal do governo americano está se tornando um problema crônico.
O déficit público americano vem crescendo como uma bola de neve, fruto de um processo que começou ainda no governo de Donald Trump, com cortes de impostos, e avançou na era Biden, com pacote de estímulos de US$ 1,9 trilhão durante pandemia.
Desde o fim de 2019, o tamanho da dívida federal cresceu em mais de US$ 9 trilhões, atingindo US$ 26,5 trilhões. Apenas o montante que os EUA pagam como despesas de juros sobre a dívida federal aumentou quase 40% no recém-terminado ano fiscal de 2023, para mais de US$ 659 bilhões.