Pitadas generosas de ousadia, grandes porções de criatividade, ingredientes de qualidade e boas receitas são o segredo do sucesso de Juscelino Pereira, fundador, há vinte anos, do Grupo Piselli, uma das mais respeitadas marcas da alta gastronomia do Brasil.
Apesar se seus restaurantes serem recomendados pelo Guia Michelin 2024, o restaurateur acredita que para se manter no topo é preciso ir sempre além. Por isso, em janeiro de 2025, ele lança a primeira loja física do empório Mercato, paraíso gourmet que, desde 2020, só existe na versão online, e inaugura a quinta unidade do restaurante Piselli, essa no Shopping Iguatemi de Campinas, no interior paulista. Nos dois projetos, Juscelino investiu R$ 4 milhões.
Lá, o empresário pretende testar novas ideias, como a de um menu mais enxuto e a inclusão de um novo prato, o risoto negro com vieiras grelhadas e bottarga, ova de tainha desidratada em sal. “Outra novidade é que o cardápio trará ainda mais doces da nossa confeitaria, pães e especiais e sanduíches, porque queremos dar um foco ao brunch”, revela o empresário ao NeoFeed.
Sabiamente, ele não vai mexer nos “queridinhos” do Piselli, como os clássicos Risotto di Pisseli (feito com ervilha, marca registrada da casa), Ravioli di Fontina alla Crema di Tartufo Nero e Saltimbocca alla romana.
Para o Mercato físico, que funcionará no mesmo espaço do restaurante de Campinas, a ideia é continuar oferecendo produtos importados, mas ampliar a oferta de itens de marca própria — algo que ele também já está testando no site da loja. A Casa Russo, grife de decoração de mesa e utensílios de cozinha idealizada por Renata Russo, esposa e sócia de Juscelino, terá uma maior variedade de artigos, especialmente louças, talheres e tolhas de mesa.
“Desejamos ampliar a linha que carrega a marca do nosso grupo para nos diferenciarmos de outros empórios e para não termos de entrar na briga de preço com concorrentes gigantes”, explica.
Ainda de olho no futuro, Juscelino tem se movimentado para abrir, em 2026, mais um combo Piselli-Mercato, a ser instalado em um condomínio de luxo, ainda em fase de projeto na região do Itaim, uma das mais valorizadas de São Paulo.
“Não posso dar mais detalhes porque sou cauteloso e aprendi, com o tempo, que uma ideia deve ser maturada antes de ser divulgada”, justifica ele. “Mas posso garantir que, como sempre fiz, cada centavo investido será para manter a qualidade do menu, dos produtos, da equipe e das boas experiências para o cliente, porque é nisso que eu acredito.”
O desastre das ervilhas
Nascido em Joanópolis, interior paulista, o restaurateur cresceu em um ambiente onde o trabalho duro e a determinação eram muito valorizados. “Meu avô contava histórias sobre Juscelino Kubitschek, sobre a construção de Brasília e sobre negócios”, lembra.
Por isso, desde cedo, Juscelino — nome escolhido pelo avô para homenagear JK — já mostrava inclinação para os negócios. Começou ajudando o pai no balcão do armazém da família. Mas, desejando ter seu próprio dinheirinho, aos 15 anos, iniciou uma horta com o objetivo de vender o que colhesse.
Dois anos depois, em um rompante de ousadia, decidiu plantar ervilhas, um cultura completamente diferente do que era cultivado na região de sua cidade natal. Com o apoio da família, tocou a ideia adiante. Foi um desastre.
As sementes eram de ervilha torta, e não aquela em grãos. Além disso, a colheita foi feita depois do tempo certo. Mas Juscelino só descobriu isso no Ceasa, com a venda já acertada e o produto embarcado no caminhão do tio. Em vez de lucro, seu primeiro negócio trouxe frustração, mas logo ele se recuperou: “Eu sou uma pessoa que sempre olha para frente”.
Na semana seguinte ao desastre das ervilhas, ele aceitou um convite para trabalhar em um restaurante simples em São Paulo. Observador, rapidamente descobriu um segredo de ouro: quanto mais agradasse aos clientes, mais recompensas teria. Seguiu seu instinto e, por causa de sua dedicação, rapidamente cresceu.
De garçom virou maître, sommelier e gerente de renomados restaurantes paulistanos. Por onde passava, conquistava uma legião de clientes-fãs com seu sorriso largo e excelente atendimento.
O conselho do avô
Mas a grande virada na carreira de Juscelino aconteceu mesmo em 1992, quando conseguiu uma posição no renomado restaurante Fasano. E, novamente, graças à sua dedicação e talento ele passou a comandar o Gero em 1994, uma experiência descrita como fundamental para seu crescimento profissional.
"Tenho dois ídolos: Rogério Fasano e Massimo Ferrari. Do Rogério, com quem trabalhei por anos, posso dizer que é um perfeccionista e me ensinou muito. Eu sou mais generalista, mas aprendi a defender a qualidade a qualquer custo e entendi a importância de olhar para os detalhes", elogia.
Durante seus anos no grupo Fasano, o empresário teve a oportunidade de viajar para a Itália, onde conheceu vinícolas e restaurantes renomados. Quando completou 30 anos, já estava estabelecido como um profissional respeitado no ramo.
E, inspirado por um conselho de seu avô, que dizia que "cada homem deve ter seu próprio negócio até os 35 anos", ele começou a planejar o que viria a ser o Piselli, palavra italiana que significa "ervilha" — e uma “homenagem” à sua primeira decepção como empreendedor.
Em 31 de julho de 2004, exatamente no dia em que completava 35 anos, Juscelino inaugurou o primeiro restaurante Piselli, na Rua Padre João Manuel, no bairro dos Jardins, em São Paulo, que existe até hoje. O sucesso foi imediato. Os clientes conquistados durante seus anos no Fasano compareceram em peso à abertura, surpreendendo o novo empresário.
Insights de um "fuçador"
Hoje, além dos Jardins, o Piselli tem restaurante no Shopping Iguatemi de São Paulo, uma unidade no centro histórico da cidade e outra em Brasília. Até 2018, o grupo era formado por quatro sócios-investidores. Mas em 2018, Juscelino comprou a parte deles.
Juscelino e Renata estão à frente da operação com 150 colaboradores e 200 mil clientes servidos, todos os anos, nos quatro restaurantes. O ticket médio das casa é de R$ 200.
No site, lançado em 2020, por enquanto, os números são bem mais modestos: 200 pedidos, em média, são despachados mensalmente para todo o Brasil. “Mas vamos crescer para dez mil e depois mais, porque no mundo da internet o céu é o limite”, calcula com o otimismo típico dos empreendedores.
Entre os artigos mais vendidos estão os vinhos assinados pela grife do grupo, todos produzidos na Itália, com valores entre R$ 170 e R$ 600, a garrafa. O campeão de vendas é o Piselli Rosso Piemonte (R$ 195), com uva Babera.
Os clientes da plataforma também adoram as cápsulas de café, um blend exclusivo produzido em colaboração com a Orfeu (R$33,80) e os drinques prontos, vendidos em parceria com a APTK, em uma linha que inclui, negroni, spritz, martini e citric gin, entre R$ 130 e R$ 240.
“O público online é diferente da clientela do restaurante, porque ele quer ter algum produto, geralmente da nossa marca. Compra um ou dois itens por mês. É como quisessem levar para casa um pedaço do Piselli”, afirma.
Juscelino é autodidata. “Boa parte dos insights que tenho é porque gosto de ‘fuçar.” Ele sempre gostou de ler, frequentar palestras e, agora, diz estar “viciado” em podcasts sobre marketing e negócios”.
A amizade criada com os clientes publicitários também ajudou. “Eles me ensinaram várias coisas. Entre elas, que a marca é como um ser humano: tem vida, voz e personalidade. E foi o que tentei fazer com o Piselli. A ervilha está presente no logo, em pratos, pastas e salgadinhos crocantes porque isso reforça a ideia de marca”, conta. “Desde quando iniciei o projeto, queria que minha empresa tivesse a força de uma Gillette, que virou sinônimo de lâmina”.