A procura por ativos isentos de imposto de renda ficou menos intensa nos últimos dias. Após o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciar a possibilidade de taxar em até 10% os rendimentos que ultrapassam os R$ 600 mil por ano (ou R$ 50 mil por mês), a recomendação dos advisors é ter mais cautela com esse tipo de ativo.
O motivo? Se taxado, o investimento isento de imposto de renda pode ter rendimentos bem piores do que a renda fixa não isenta. A grande questão é que o tributo incide em cima do rendimento, o que não isentará ativos que tenham sido comprados antes da mudança de regra ser aprovada.
Essa mudança coloca à mesa a insegurança em relação à precificação dos ativos. Isso ficou expresso na falta de interessados no leilão “Rota da Celulose”, que prevê a concessão de trechos de rodovias estaduais e federais totalizando 870,3 quilômetros pelo período de 30 anos.
Previsto para acontecer no início de dezembro, o leilão foi adiado para o primeiro trimestre de 2025. Na visão do governo, esse foi um movimento natural em razão da volatilidade do mercado e das taxas futuras de juros terem subido muito.
Mas fato é que os investidores também passaram a calcular o impacto do (provável) novo imposto. Se aprovado, ele incidirá em 2026 e trará um novo componente de análise para a composição da carteira: de onde vem a maior fonte de renda do investidor.
Pelo que foi apresentado até agora, a ideia é que os investidores paguem um IR mínimo de 10%, considerando rendas tributadas (títulos não isentos e salários) e não tributadas (títulos isentos e dividendos). Quem estiver abaixo dessa alíquota, pagará o imposto complementar.
Isso significa que, dependendo da fonte de renda do investidor, ele está mais longe ou mais perto dessa marca. Enquanto os investidores CLT já são tributados em 27,5% na fonte (alíquota para renda acima de R$ 4.664,68), os empresários têm rendimentos mensais por dividendos de suas empresas, que são isentos. E os empresários que já venderam as suas companhias e vivem de rendimentos precisam estar atentos ao mix entre isentos e não isentos para não cair em uma alíquota inferior a 10% e ter taxação extra.
“O fator peso da fonte de renda passará a ser importante na decisão de investimento. Quem é CLT terá mais espaço para ter isentos na carteira do que aquele que tem sua fonte de renda em dividendos”, afirma Odilon Costa, estrategista de renda fixa e crédito privado do grupo SWM, com cerca de R$ 7 bilhões sob custódia.
O novo imposto na ponta do lápis
O especialista fez uma simulação de quanto aumentaria a carga tributária de investidores para quem tem rendimento anual de R$ 1,2 milhão e compartilhou com exclusividade com o NeoFeed.
Foi levado em conta as informações passadas até agora pelo governo de que o imposto extra incidirá sobre os rendimentos acima de R$ 600 mil por ano para quem tiver uma alíquota efetiva menor que 10%.
A carga tributária para a renda fixa não isenta considerada foi de 15%, elegível para investimentos com mais de dois anos. Não foi considerada a hipótese de tributação de dividendos na fonte - algo que ainda está em discussão.
O primeiro exemplo é um executivo CLT que recebe R$ 1 milhão de salário anual e ainda tem de rendimentos R$ 100 mil em renda fixa isenta e outros R$ 100 mil em títulos não isentos. Ele não seria afetado pela medida, pois sua alíquota efetiva seria de 24,2%. Sendo assim, pagaria R$ 290 mil por ano de imposto.
Já um empresário que ganha R$ 1 milhão por ano em dividendos da sua empresa e tem mais R$ 200 mil de rendimento dividido entre a renda fixa isenta e a não isenta, sua alíquota efetiva é de 1,3%. Sendo assim, seu imposto adicional seria de 8,7%. Ele passaria a pagar R$ 120 mil de imposto por ano, R$ 105 mil a mais do que pagava sem a alíquota extra.
O último exemplo é de cliente que vive dos seus rendimentos. O montante de R$ 1,2 milhão dele está dividido igualmente: metade em renda fixa isenta e metade em não isenta. Sua alíquota efetiva é de 7,5%. Portanto, teria um imposto adicional de 2,5% e passaria a pagar R$ 120 mil por ano - R$ 30 mil a mais do que antes da nova tributação.
Agora, se esse mesmo investidor que vive de rendimentos tivesse todo o seu patrimônio alocado em renda fixa isenta, ele não hoje não paga imposto nenhum e passaria a pagar R$ 120 mil por ano.
Se fosse ao contrário e esse investidor tivesse rendimentos apenas de renda fixa não isenta, a sua alíquota mínima já seria de pelo menos 15% - seguindo a tabela progressiva de imposto de renda da renda fixa - e não sendo afetado pelo imposto extra.
Odilon Costa alerta que os rendimentos dos títulos isentos, como LCI/LCA, CRI/CRA e debêntures incentivadas são menores no mercado exatamente pela isenção fiscal.
Se essa isenção for reduzida de uma alíquota de 15% para a 10%, segundo a proposta do governo, esses papéis já deixam se ser atrativos frente a CDBs e debêntures tradicionais, por exemplo.
“Ainda há muita incerteza se isso irá passar dessa forma para precificar novas emissões, mas já se gera a dúvida da atratividade no futuro”, diz o especialista da SWM.
“Sendo assim, principalmente quem está com uma carteira dependendo apenas de rendimentos isentos deveria pensar em diversificar e aumentar essa alíquota efetiva”, complementa.
A explicação é que os títulos isentos disponíveis no mercado possuem rentabilidade líquida similar à dos seus pares isentos. E o imposto retido na fonte, na prática, já é deduzido da rentabilidade de ativos comparáveis, embora a alíquota retida na fonte seja maior.