Uma das principais administradoras de shoppings do País, a BRMalls é mais uma empresa do setor que, diante das restrições impostas pela Covid-19, está sendo obrigada a dar fôlego a estratégias que passam pelo formato de marketplace e pelos canais digitais.
“Nós sempre acreditamos que haveria uma evolução para novas formas de consumo e vínhamos nos preparando para essa transição nos últimos anos”, disse Ruy Kameyama, CEO da BRMalls, em teleconferência com analistas realizada nesta segunda-feira. “Com a Covid-19, acreditamos que essa transformação digital vai ser acelerada e estamos dando prioridade a essa frente.”
Com uma receita líquida de R$ 1,32 bilhão em 2019, alta de 4,5% sobre o resultado de 2018, a BRMalls tem um portfólio de 29 shoppings no País. Entre os empreendimentos sob sua gestão, figuram os Shoppings Villa Lobos e Jardim Sul, em São Paulo, Shopping Tijuca, no Rio de Janeiro, e Estação BH, em Minas Gerais.
Um dos primeiros e principais passos da BRMalls rumo à transformação digital foi dado em maio de 2018, quando a empresa investiu em uma participação minoritária na Delivery Center. A startup monta hubs em shopping centers e faz a conexão entre as compras efetuadas por aplicativos e marketplaces parceiros e os lojistas desses empreendimentos.
Com esse formato, no qual gerencia e realiza desde a coleta até a entrega dos itens na mesma hora ou no mesmo dia da realização do pedido, a Delivery Center atraiu outros aportes da BRMalls – o mais recente deles em janeiro deste ano, assim como de empresas como a Multiplan e a Cyrela Commercial Properties (CCP).
Na prática, esse modelo amplia os canais de venda dos lojistas dos empreendimentos. Além de incorporar os sites próprios desses varejistas, a plataforma da Delivery Center mantém parceria com marketplaces e aplicativos como Mercado Livre, B2W, Rappi, iFood e Uber Eats. Tudo junto e misturado.
É justamente por meio dessa plataforma que a BRMalls está colhendo resultados nesse período de Covid-19. Segundo Kameyama, o crescimento do volume transacionado por esse canal cresceu 130% em abril, quando comparado à média contabilizada em janeiro e fevereiro. Nesse intervalo, foram adicionados 150 mil itens (SKUs) à plataforma.
“Nós tivemos um crescimento de 350% no número de lojistas e assinamos mais de 150 contratos de adesão entre março e abril”, afirmou Kameyama. Ele destacou ainda que a Delivery Center já prevê ampliar nos próximos meses sua base atual de 8 para 15 marketplaces parceiros. “Essa infraestrutura está sendo essencial para absorver o aumento da demanda dos consumidores e, ao mesmo tempo, da oferta dos lojistas.”
Em abril, a plataforma da BRMalls com a Delivery Center registrou um crescimetno de 130% no volume transacionado e atraiu 150 novos lojistas
Concorrente da BRMalls e outra investidora do Delivery Center, a Multiplan também vem ressaltando os resultados obtidos com a plataforma no período. Na divulgação do seu balanço referente ao primeiro trimestre, realizada na semana passada, a empresa destacou que os pedidos online de seus empreendimentos cresceram 66,4% na primeira metade de abril quando comparados a igual período, em março.
Outro nome importante do setor, a Iguatemi é mais uma administradora que começa a extrair resultados de sua recente estratégia digital. Segundo a empresa, o marketplace Iguatemi 365, lançado em setembro de 2019, registrou um volume bruto de mercadorias (GMV) dez vezes maior em março, na comparação com as vendas apuradas em janeiro. No período, a plataforma incorporou 15 novos sellers, que representam 100 marcas, mesmo volume que o canal detinha no fim do ano passado.
Atraso
Para Alberto Serrentino, sócio da consultoria Varese, as administradoras do País demoraram para colocar em prática suas estratégias digitais. “Hoje, Magazine Luiza e B2W, por exemplo, são muito mais relevantes como shoppings digitais do que qualquer marketplace das administradoras”, afirma. “É um contrassenso, pois o processo de digitalização do setor deveria ter sido liderado pela própria indústria.”
Em contrapartida, ele entende que ainda há tempo para que o segmento recupere o tempo perdido e que a Covid-19 é uma janela para acelerar esse processo. Especialmente pelo fato de que não há perspectiva, no médio prazo, de uma retomada do fluxo pré-crise nos empreendimentos.
Serrentino ressalta, porém, alguns desafios nessa transição. “Os shoppings precisam gravitar menos em torno do tijolo e mais no entorno do cliente”, diz. Ele entende que, no Brasil, essas empresas ainda investem pouco na captura de dados dos frequentadores e no uso dessas informações para desenvolver iniciativas em parceria com os varejistas e em um escopo mais amplo de ofertas.
No mercado global, ele cita como bom exemplo dessa abordagem o grupo chinês Suning, que integra em uma única plataforma negócios como shoppings, meios de pagamento, incorporação e varejo.
“Ao mesmo tempo, essa transformação digital vai exigir que as administradoras repensem outros aspectos”, afirma. “Em particular, o fato de que essas novas modalidades de venda não cabem mais nas relações contratuais tradicionais que elas mantêm com os lojistas.”
Adesão
No caso da BRMalls, um dos fatores que estão sendo usados para ampliar a adoção do canal online por parte dos lojistas é atrelar a concessão do desconto de 100% no aluguel de abril a adesão à plataforma da Delivery Center. “Estamos levando em conta soluções que preservem o caixa e, ao mesmo tempo, impulsionem a estratégia omnichannel desses lojistas”, observou Kameyama.
O pacote incluiu outras medidas. Em março, a BRMalls concedeu 50% de desconto no valor do aluguel para os lojistas adimplentes e postergou o pagamento dos 50% restantes para fevereiro de 2021. No período, o condomínio teve uma redução média de 25%. Já o fundo de promoção também foi adiado para fevereiro do ano que vem.
Entre outras medidas de apoio aos lojistas, a BRMalls negociou a oferta de uma linha de crédito de R$ 300 milhões com o Banco Inter, com condições especiais para os varejistas
Entre outras medidas de apoio aos lojistas, a administradora negociou a oferta de uma linha de crédito de R$ 300 milhões com o Banco Inter, com condições especiais para os varejistas. E tem realizado uma série de mentorias e webinars voltada a esses parceiros, com a participação de seus executivos e de especialistas da Endeavor.
Do ponto de vista do caixa da própria administradora, Kameyama ressaltou que, apesar de uma posição confortável, a BRMalls acessou duas novas linhas de financiamento em março e abril. A primeira delas, com o Itaú Unibanco, no valor de R$ 300 milhões, e a segunda com o Bradesco, de R$ 400 milhões. “Com isso, temos cerca de R$ 1,23 bilhão em caixa, sem considerar a geração de caixa de abril”, afirmou.
O executivo também deu indicadores sobre as primeiras semanas de reabertura de dois shoppings de seu portfólio, o Iguatemi, de Caxias do Sul (RS), e o Shopping Campo Grande (MS). Nos dois empreendimentos, o índice de lojistas que já estão em operação é de 85% e está subindo gradativamente.
Já o fluxo de veículos na primeira semana de operação girou entre 60% e 85% do volume pré-pandemia, enquanto as vendas ficaram em 50% na mesma base de comparação. “Nosso foco agora é higiene máxima e zero aglomerações", disse o executivo. “Estamos menos preocupados com as vendas nesse momento. Essa retomada vai ser gradual.”
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