Quase como uma regra, a burocracia brasileira é vista por executivos como um dos grandes obstáculos na hora de empreender no Brasil. Seja na hora de tirar uma ideia do papel, captar investimentos ou vender o negócio, os complicadores estão ali. E, na maior parte das vezes, trazem custos altos.
Essa dor foi sentida na pele e no bolso pelo americano Brian Requarth quando o então CEO e cofundador da VivaReal vendeu a operação da startup de classificados de imóveis para o OLX. “Eu passei meses estudando e tentando fazer a coisa certa na hora de abrir uma empresa. Anos depois, vi que errei”, conta o empreendedor em entrevista ao NeoFeed.
Não foi um erro qualquer. Esta falha custou, diz ele, US$ 100 milhões. O valor refere-se ao montante que poderia ter sido economizado em impostos e custos jurídicos para formalizar a venda ocorrida em 2020 por R$ 2,9 bilhões.
Para evitar que isso aconteça com novos empreendedores, Requarth, ao lado dos sócios Gina Gotthilf, que liderou a expansão internacional do aplicativo de idiomas Duolingo, e ao russo Yuri Danilchenko, ex-CTO da Escale, está ampliando o leque da Latitud, hub de conexão virtual e empreendedorismo.
Nesta terça-feira, 1º de fevereiro, a companhia lança o Latitud Go, uma solução baseada em tecnologia para facilitar e baratear os processos de abertura de empresas, captação de investimentos e operações de saída.
A ideia é ajudar os empreendedores na formulação adequada de toda a documentação necessária para que, quando a companhia precisar arcar com o pagamento de impostos, consiga economizar. Tudo dentro da lei. A expectativa é de que o serviço permita reduzir o custo a um quinto do que seria gasto.
“Não estamos reinventando a roda. Todo esse processo já é conhecido, mas custa algo em torno de US$ 30 mil inicialmente. Conseguimos reduzir esse custo para algo próximo de US$ 6 mil com o uso de tecnologia”, afirma Requarth.
Isso é feito através de práticas que envolvem a redução dos custos jurídicos com escritórios de advocacia que são parceiros da Latitud Go e, principalmente, com a abertura de uma estrutura offshore para o recolhimento de impostos com alíquotas mais baixas.
Essa sociedade extraterritorial é dividida em três partes: uma holding intermediária em Delaware, nos Estados Unidos; uma holding nas Ilhas Cayman, que pertence ao Reino Unido, mas tem sua própria política tributária e é considerada um paraíso fiscal; e uma operação na América Latina.
Sem se aprofundar no beabá tributário, essas três partes tornam os processos de captação e saída dos investimentos mais baratos, segundo Requarth. E não há nada de ilegal, segundo ele, nessa estruturação.
Dados do Banco Central revelaram que mais de US$ 85,7 bilhões foram enviados do Brasil para a Ilhas Cayman em 2019, uma alta de 27% e que faz com que o território ultramarino no Caribe lidere o ranking de países que mais recebem investimentos brasileiros.
Enquanto os investidores aplicam capital na operação sediada nas Ilhas Cayman, a saída dos empreendedores do negócio no caso de uma venda para outra empresa, por exemplo, se dá pelos EUA. Essa prática tende a crescer no futuro, com o Brasil despertando cada vez mais a atenção dos investidores internacionais.
Em 2021, startups brasileiras receberam US$ 9,4 bilhões em investimentos, conforme revelou um estudo realizado pela Distrito. O valor é 2,5 vezes maior do que o registrado em 2020.
Por enquanto, a Latitud Go é um serviço voltado apenas para empresas que estão iniciando suas jornadas. Lançado em modo de teste em agosto do ano passado, o serviço já tem 15 clientes – todos fazem parte da Latitud.
No futuro, a gama de serviços será ampliada para facilitar a transformação de negócios que já estão consolidados e precisam “corrigir” suas estruturas fiscais para evitar gastos desnecessários no futuro. Isso deve ajudar o serviço a aumentar sua rentabilidade. “É uma taxa bem pequena (a cobrada pela empresa para realizar esse serviço para novas empresas)”, diz Requarth.
De acordo com Requarth, a ideia é de que o Go apenas complemente a estratégia da Latitud e “seja um ponto de partida para os empreendedores que estão construindo negócios de tecnologia no Brasil e na América Latina”.
O Latitud surgiu, em 2020, com a ideia de ajudar a formar empreendedores em estágio inicial na América Latina através de um hub de conexão virtual.
Ao longo do tempo, foi evoluindo para outras áreas. Um fundo de venture capital foi criado por Brian e seus sócios para investir em startups em estágio inicial com cheques até US$ 250 mil. Até agora, já fez mais de três dezenas de investimentos, como a argentina Pomelo – que já recebeu três aportes desde então.
No fim do ano passado, lançou também o Latitud Launch, ferramenta que é um espaço para que startups de tecnologia da região apresentem seus produtos e estabeleçam conexões com potenciais clientes e investidores.