Em março do ano passado, a The New (então conhecida como The New Butchers) atraiu os holofotes do mercado plant-based para o Brasil ao receber um investimento da Lever VC, principal gestora especializada nesse segmento e que já teve em seu portfólio empresas como Beyond Meat e Impossible Foods.
As duas empresas são as maiores expoentes do setor plant-based. A primeira está avaliada em US$ 4 bilhões no mercado privado. A segunda, por sua vez, já negocia ações na Nasdaq desde 2019 e vale US$ 1,6 bilhão, mas já chegou a ser avaliada em mais de US$ 12 bilhões.
Agora, a companhia repete a dose. Só que, dessa vez, com mais tempero. Em uma informação revelada com exclusividade ao NeoFeed, a Lever VC está aumentando sua aposta na startup brasileira com um aporte de R$ 38 milhões e está se tornando sócia majoritária da operação.
“Depois que fizemos o primeiro investimento, continuamos empolgados com o que a empresa estava fazendo ao lançar produtos que estão no topo do mercado”, diz James Caffyn, sócio da Lever VC em entrevista ao NeoFeed.
Além da The New e dessas gigantes, a Lever VC já investiu na operação de outra empresa brasileira, a NoMoo, que produz laticínios veganos. Recentemente, a companhia escalou sua operação para o continente asiático, conforme reportado com exclusividade pelo NeoFeed. Ao todo foram 19 startups investidas pela gestora desde 2018.
Fundada em 2018 por Bruno Fonseca e tendo o empresário Paulo Veras, fundador da 99, entre seus investidores, a The New estreou sua operação com um hambúrguer que imita o gosto da carne, mas sem usar proteína animal.
Depois de ampliar sua linha, agora, a startup está adicionando também hambúrguer de frango empanado, nuggets, filé de frango, filé de salmão e bolinho de bacalhau a esse "menu". Tudo feito com base em proteína vegetal.
A startup trabalha com maneiras para replicar gosto, aroma e textura do alimento original no substituto vegano. A tecnologia ajuda a escolher os ingredientes. Hoje, a aposta se dá em proteínas de ervilha, lentilha e arroz, além de gordura de coco, óleo de girassol, fibra de bambu, cebola, extrato de levedura, beterraba em pó, alho, entre outros.
Na primeira mudança com a Lever VC como majoritária no negócio, o fundador Fonseca deixou o cargo de CEO da The New. O posto agora é ocupado por André de Carvalho, executivo com passagens por Minerva, onde era diretor de negócios. Ele atuou também na AB Brasil, empresa dona de marcas como Fleischmann, Ovomaltine e Twinings e Bunge, fabricante americana de alimentos e avaliada em US$ 13,2 bilhões.
“Carvalho tem ampla experiência no setor e será fundamental para impulsionar o próximo estágio de crescimento da empresa, construindo uma base sólida para o futuro”, afirmou Caffyn, da Lever VC. “Estruturalmente, não haverá mudanças significativas, além da formação de uma equipe maior para dar suporte às operações principais.”
Além da mudança no comando, a decisão agora é priorizar a expansão da operação no Brasil. “O investimento da Lever VC, em conjunto com uma próxima rodada de financiamento adicional, está sendo usado para abrir novos canais e ampliar o orçamento de marketing para aumentar a velocidade das vendas”, diz Caffyn.
Os produtos da The New são vendidos em mais de 3,4 mil pontos em todo Brasil, mas a startup tem mais força nas regiões Sudeste e Sul. Algumas das redes que comercializam os alimentos são Pão de Açúcar, Angeloni, Oba, Hortifruti, Natural da Terra, Mercadinho São Luís, entre outros varejistas.
Com o investimento, a The New ganha musculatura para competir em um mercado cheio de competidores tradicionais, como BRF, JBS e Marfrig, bem como financiados por fundos de venture capital. Um exemplo é a operação da chilena NotCo, primeiro unicórnio plant-based da América Latina e que fabrica substitutos veganos para leite, sorvete, maionese e tem uma linha de hambúrgueres vegetais.
“A nossa estratégia vai na direção contrária da maioria das startups. Não queremos jogar o jogo de queimar caixa e que leva em conta apenas o faturamento”, diz André de Carvalho, CEO da The New. “A ideia é ter um parceiro que possa garantir tranquilidade para que a companhia construa sua marca no longo prazo.”
Com operações somente no mercado brasileiro e sem intenção, ao menos no curto prazo, de internacionalização da operação, a The New espera ter receita de R$ 100 milhões até 2025. “Nos próximos três anos, vamos triplicar a base de clientes e aumentar o faturamento de forma exponencial”, diz Carvalho.
Para alcançar essa meta, um dos planos é explorar o mercado B2B. A empresa já fornece sua linha de produtos para lanchonetes e restaurantes de pequeno e médio porte. Segundo Carvalho, a The New já tem conversas para levar os produtos a redes maiores. “É uma aposta que já mostrou crescimento de 500% no acumulado desse ano contra o mesmo período do ano passado”, diz o executivo.
O movimento já é explorado por outras companhias. No Brasil, o hambúrguer de proteína vegetal usado pela rede de fast food Burger King, por exemplo, é produzido pela Marfrig. Já a Fazenda Futuro, que anunciou recentemente a cantora Anitta como sócio, é a fornecedora do hambúrguer utilizado no lanche vegetariano do Bob’s.
Em um olhar mais amplo, é possível dizer que o setor de plant-based vive dois momentos. De um lado, as companhias enfrentam maior dificuldade para manter avaliações elevadas – um reflexo do mercado de tecnologia como um todo. A Beyond Meat, por exemplo, abriu capital na Nasdaq em 2019 e viu seu valor de mercado despencar quase 60% neste ano.
Em outra ponta, estimativas apontam que o consumo de produtos nessa categoria deve aumentar consideravelmente nos próximos anos. Com receita global próxima de US$ 40,2 bilhões no ano passado, o segmento deve crescer em média 11,9% ao ano, na previsão da consultoria americana Vantage Market Research. A expectativa é de que este mercado movimente US$ 78,9 bilhões em 2028.
Essa perspectiva está sendo acompanhada pelo olhar mais atento dos investidores, inclusive no Brasil. Esse é o caso da Lifely. Criada em 2021 por por Daniel Chor, ex-Multiplan, Alexandre Icaza, ex-Sack's, e Felipe Krelling, ex-IBM, a gestora brasileira pretende investir em até 25 startups do setor de proteína alternativa até o fim de 2023. E sua tese vai além do mercado local. Até março, o fundo fez aportes em 12 empresas dos Estados Unidos, China e Estônia.
“O mercado brasileiro vem atraindo a atenção de investidores externos”, diz Lorena Coimbra, engenheira de alimentos e fundadora da Foodtech Consultoria. “Algumas companhias têm ótimos produtos, mas só conseguem escalar quando aliam tecnologia com investimento.”
Plant-based gourmet?
Para se diferenciar de outras empresas do ramo que atuam no Brasil, como Fazenda Futuro e linhas plant-based de gigantes como Marfrig, BRF e JBS, a aposta da The New é competir além do preço. “A gente não vai brigar por preço no mercado. Vai ser a marca mais cara, mas que será a escolhida pelo consumidor que vai buscar um produto de qualidade”, diz Carvalho.
A ideia é ir além do consumidor vegano ou vegetariano e alcançar também os “flexitárianos”, que são consumidores que eventualmente podem comprar um ou outro produto com proteína vegetal.
“O mercado de proteína vegetal vem sendo empurrado por esses consumidores ocasionais”, diz Coimbra, da Foodtech Consultoria. “Eles esperam um produto que realmente se assemelhe com a carne em termos de aroma, textura e gosto.”
Neste sentido, a companhia está investindo na ampliação do seu portfólio. No segundo semestre, a ideia é avançar no desenvolvimento de produtos mais práticos. Segundo Carvalho, os planos envolvem uma linha de pratos prontos e de produtos que possam ser preparados no microondas.
A The New conta com uma fábrica que foi inaugurada em julho do ano passado. A instalação, que fica na zona norte de São Paulo, também deverá ser utilizada para produzir itens de outras marcas da indústria plant-based, mas Carvalho não revelou quais acordos estão sendo firmados.