Em maio de 2022, os acionistas do Twitter votaram contra a recondução de Egon Durban, executivo-chefe do Silver Lake Partners, a uma das cadeiras no Conselho de Administração da companhia. Além de seu trabalho diário no fundo de private equity, ele tinha assento garantido no conselho de outras dez empresas.
Durban se dispôs a renunciar, mas a rede social do passarinho azul decidiu mantê-lo no board – mesmo contrariando o pedido dos acionistas. Cinco meses depois, Elon Musk compraria o Twitter e dissolveria o conselho.
O questionamento sobre a dedicação de Durban não é única no universo dos investimentos. Como orientar os negócios, determinar o direcionamento estratégico, atravessar os momentos de turbulência e garantir a prosperidade de quatro, cinco, seis empresas diferentes? É difícil responder.
Num ano em que, ao que tudo indica, será mais difícil para empresas de growth, ganha força o movimento do overboarding. O acúmulo de participação em vários conselhos de administração é um risco para negócios que precisam do olhar atento e do direcionamento desses profissionais que deveriam agregar tempo e conhecimento.
“Conselheiros que servem a muitas empresas, em especial aqueles que também exercem carreira executiva, podem não ter condições de realizar suas funções de forma eficaz”, lê-se no relatório "Annual Corporate Directors Survey 2022", da multinacional de consultoria e auditoria PwC.
O trabalho foi elaborado a partir de entrevistas com 704 executivos americanos, cuja maioria (72%) está à frente de companhias com receita anual acima de US$ 1 bilhão.
A preocupação com o excesso de trabalho dos “conselheiros em série” é global. O Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa, do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), de 2015, por exemplo, já menciona a importância da avaliação da disponibilidade do tempo de dedicação dos executivos em posição de conselho.
Mas, como diz Cristiana Pereira, coordenadora do grupo revisor do documento, a pressão das empresas sobre seus conselheiros é cada vez maior.
No universo do capital de risco, por exemplo, 15% dos investidores de venture capital integram quatro ou mais conselhos, conforme levantamento realizado pelo PitchBook.
Nos Estados Unidos, o número de executivos em dois ou mais colegiados saltou de 26,8%, em 1998, para 40%, dezoito anos depois, mostra estudo da Universidade de Buffalo. Não há pesquisas semelhantes no Brasil.
Ainda em elaboração, a nova versão do código do IBGC propõe às companhias a reflexão, de forma aprofundada e estruturada, sobre a quantidade de boards nos quais seus conselheiros podem atuar.
Não existe um número mágico. As variáveis a serem consideradas são muitas – da complexidade da companhia à capacidade individual de cada executivo em administrar o tempo dedicado às suas tarefas.
A pesquisa da PwC indica o que parece ser razoável. Para quase metade dos 704 entrevistados, os conselheiros independentes devem ocupar assento em, no máximo, três organizações diferentes. Se eles forem, no entanto, CEOs, dois conselhos é o limite, defende a maioria.
Desde a crise de 2008 e, sobretudo, com a pandemia do novo coronavírus, a função de conselheiro está mais complexa. Questões como diversidade, equidade e inclusão, ESG, engajamento dos stakeholders, propósito e cultura corporativa, transformação digital, segurança cibernética... impõem novos desafios e dilemas aos conselhos de administração.
A edição de 2021 do estudo A Governança Corporativa e o Mercado de Capitais, do IBGC, com 241 empresas, é reveladora da nova abordagem. Se no passado, o foco das reuniões de conselhos de administração deixou de ser as questões operacionais, hoje o tema predominante é o futuro. E, geralmente, visão prospectiva exige educação continuada.
“Essa mudança radical de mentalidade é fundamental para garantir não só a longevidade da empresa, mas do planeta, para as gerações atuais e as que virão”, atestam os analistas da Egon Zehnder, no relatório "Boards: Stepping Up as Stewards of Sustentability", elaborado a partir de dados de 100 empresas globais, listadas em bolsa.
“A coragem de sair do conforto do passado para a vida instável do presente requer ousadia e é isso que definirá um conselho realmente comprometido”, completam. Ousadia e tempo.
No Brasil, segundo levantamento do IBGC, as empresas de grande porte, com faturamento anual acima de R$ 10 bilhões, exigiram, ao longo de 2021, 250 horas de dedicação de seus conselheiros. Em relação às reuniões anuais (ordinárias e extraordinárias), conforme dados da consultoria KPMG, o número foi de seis, em 2010, para 19, uma década depois. Isso, como frisa Cristiana, sem contar o tempo de WhatsApp.