O setor de Tecnologia da Informação (TI) contratou mais de 69 mil pessoas somente nos primeiros quatro meses deste ano. O dado é da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) e mostra um crescimento relevante, já que somente o primeiro terço de 2021 já superou todo o ano passado, que teve 59 mil postos criados no total. E a previsão é de que a área precise de mais 420 mil profissionais até 2024.

O cenário parece bastante animador, e é. Mas também é desafiador considerando o chamado "apagão de profissionais" que o setor já vive. Falar em apagão significa dizer, na prática, que já existem mais vagas do que profissionais disponíveis, especialmente nos níveis mais avançados.

Um dos grandes responsáveis pelo mercado aquecido é a digitalização, que transformou a sociedade nas últimas décadas e tem imposto uma nova forma de pensar para profissionais de todos os ramos.

Quando olhamos mais de perto, vemos que habilidades como programação, ciência da computação e engenharia de dados são cada vez mais valorizadas. Se antigamente o inglês era a skill fundamental, hoje esse papel está sendo ocupado pela tecnologia.

Nesse sentido, estimular e promover a computação como uma habilidade essencial para o mercado de trabalho é algo que se torna ainda mais urgente quando pensamos 10 ou 15 anos à frente.

Como afirma o Institute For The Future, 85% das profissões que vão existir em 2030 ainda nem foram criadas. E, considerando apenas os países mais ricos, não assumir as demandas vindas com a transformação digital pode levar a uma perda econômica de US$ 11,5 trilhões do PIB, de acordo com o Fórum Econômico Mundial.

De forma geral, a sociedade brasileira ainda enxerga a formação em tecnologia como algo muito específico, uma carreira apenas para as pessoas que tem mais afinidade com as ciências exatas. Mas a verdade é que o conhecimento em tecnologia não deveria ser interesse somente de quem quer desenvolver softwares ou programar. Ao contrário, já que as aplicações dessas habilidades vão muito além.

“A verdade é que o conhecimento em tecnologia não deveria ser interesse somente de quem quer desenvolver softwares ou programar”

Prova dessa popularização da tecnologia são as plataformas low code e no code. Diferente da programação normal, que envolve linhas de códigos complexos e que o profissional domine uma linguagem, o low code usa ferramentas de arrastar e soltar blocos visuais de códigos, enquanto nas plataformas no code nem existem códigos, mas sugestões prontas de interface, como as ferramentas para criação de e-commerces e blogs, por exemplo.

Sistemas no e low code são o que estão por trás inclusive da digitalização de crianças, como nos jogos Minecraft e Roblox, em que crianças e jovens podem criar seus próprios games e mundos virtuais sem uma linha de código.

Ou seja, essa nova mentalidade já é realidade e está no dia a dia das crianças, que crescem aprendendo a pensar dessa forma. E, se hoje, os jovens estão tendo contato com a tecnologia cada vez mais cedo, o que esperar do futuro?

Entre várias hipóteses possíveis, o que é praticamente certo é que o pensamento computacional que elas cultivam desde cedo certamente vai modificar muito o mercado de trabalho e as empresas em geral.

Outra expressão disso é o uso de dados, que tem crescido por companhias de todos os tamanhos e segmentos e pode trazer muitas vantagens.

Com cada vez mais sistemas que conectam digitalmente as pessoas e as empresas, lançar mão dessa informação para personalizar a experiência do cliente e até conhecer o seu comportamento de forma mais profunda é uma considerável vantagem competitiva.

Claro que há muitos desafios para superar e um dos maiores é cultural. Ainda assim, há iniciativas para espalhar o conhecimento sobre tecnologia, e o setor privado pode ser um dos grandes protagonistas para mudar essa realidade. Projetos de formação, como o code.org e o HypeFlame Start, que capacitam jovens e profissionais iniciantes na área, respectivamente, são alguns exemplos.

“Descentralizar a tecnologia na estrutura das empresas, permitindo que o conhecimento seja dividido com pessoas de toda a organização, também deveria ser padrão”

Descentralizar a tecnologia na estrutura das empresas, permitindo que o conhecimento seja dividido com pessoas de toda a organização, também deveria ser padrão. E, para isso, a atuação dos departamentos de TI é fundamental para desenhar uma arquitetura que permita o acesso e o uso por todos.

Se as pessoas puderem viver na prática essa experiência de construir soluções de tecnologia mesmo sem ter experiência em programação, extrair e combinar dados para resolver problemas reais no seu dia a dia, certamente vamos ver uma rápida e gigantesca evolução no pensamento computacional.

A proposta deveria ser a formação de cidadãos de dados que tenham a habilidade de combinar metodologias e ferramentas para gerar mais valor aos negócios e à sociedade como um todo. Esse aprendizado pode revolucionar nosso futuro, fazendo com que a tecnologia em breve seja tão popular quando aprender inglês ou praticar um esporte.

*Fernando Castro é CEO da HypeFlame, empresa de tecnologia nascida do Agibank.