O advento das plataformas de equity crowdfunding tornou mais simples o processo de investir dinheiro numa jovem empresa de tecnologia. As chamadas bolsas de valores de startups ganharam o mercado e já movimentaram mais de R$ 200 milhões em investimentos. O número é alto, mas pode parecer uma pechincha daqui a pouco tempo.
O maior exemplo é a CapTable. Com sede em Porto Alegre, a empresa quer captar R$ 250 milhões em 70 rodadas neste ano. O montante é cinco vezes maior do que os R$ 49,5 milhões levantados para 29 startups no ano passado e maior também do que os R$ 65 milhões captados desde o início das operações da plataforma, em 2019.
“Queremos trazer o investidor pessoa física que ainda está fora deste mercado e que investe em renda fixa e na bolsa, mas não conseguia investir em startups”, afirma Guilherme Enck, cofundador da CapTable, em entrevista exclusiva ao NeoFeed.
O valor previsto para 2022 deverá vir das três linhas de negócio com as quais a CapTable opera. “Estamos preparando uma nova estrutura para isso e vamos atacar novos mercados. O segmento de venture capital está num momento histórico”, diz Enck.
O carro-chefe é a plataforma que funciona como uma bolsa de valores para startups e permite que um investidor pessoa física possa adquirir participação em empresas desse perfil sem precisar ser um investidor-anjo ou operar por meio de um fundo.
Todas as startups listadas passam por um processo da CapTable que observa o estágio em que essas companhias se encontram, os planos futuros e o histórico do empreendedor. São aceitas apenas empresas que busquem captação em aportes de seed money ou Série A e que tenham negócios de tecnologia escaláveis.
Entre as startups que já utilizaram a plataforma estão a Zletric, que opera com uma rede de recarga para veículos elétricos e levantou R$ 5 milhões; a foodtech Beeva Brazil, que captou R$ 4,5 milhões para a fabricação de produtos com base em mel e pólen; e a Juros Baixos, fintech que opera com empréstimo pessoal, refinanciamento de veículos e outros produtos financeiros, que levantou R$ 3 milhões.
As outras duas linhas de negócio ainda estão em amadurecimento. Uma delas envolve uma operação de corporate venture capital, na qual a CapTable intermedeia a venda de participação minoritária de startups para grandes empresas. “As grandes empresas já entenderam que as inovações nem sempre vão surgir dentro de casa. Então, elas compram startups que têm sinergia com seus negócios”, diz Enck.
A terceira linha envolve a criação de grupos de investidores-anjo, em que os valores são somados em um único cheque. Nesse caso, a CapTable atua no fornecimento da estrutura de capacitação dos negócios e faz a recomendação ao mercado sobre as startups que estão mais maduras para captarem investimentos.
Em seu modelo de geração de receita, a empresa cobra uma taxa do volume total captado pelas startups. A companhia também lucra com serviços de consultoria, através do pagamento de uma taxa mensal para bancar os custos da operação, em sua linha de corporate venture capital. O valor varia de acordo com o contrato.
Para consolidar esses dois novos modelos, a CapTable, que tem a Startse como sócia, com 40% da operação, está em negociação para buscar mais capital no exterior, o que pode acontecer ainda neste ano.
Regulamentação é obstáculo
Com 6 mil investidores e a previsão de chegar a 50 mil neste ano, a CapTable é a maior empresa desse mercado. Em termos de recursos levantados, a companhia é responsável por quase um terço do volume total de quase R$ 214 milhões arrecadado pelas dez maiores plataformas do mercado.
Levando-se em conta os dados coletados dos relatórios anuais das empresas enviados à CVM, desde 2017, quando a regulamentação atual entrou em vigor, e disponibilizados na plataforma online do órgão, a rival mais próxima da CapTable é a carioca EqSeed, que levantou R$ 61,4 milhões nesse intervalo.
Já a paulista SMU Investimentos ficou na terceira posição com R$ 56,7 milhões captados. Na sequência estão as plataformas Beegin.invest, com quase R$ 12,2 milhões levantados, e Kria, com R$ 10,3 milhões em operações, além de outros R$ 29,2 milhões sob o CNPJ da empresa Basement, que opera dentro de uma holding criada pela Kria.
Ambiciosa, a meta da CapTable para 2022 leva em conta a perspectiva de mudanças regulatórias que vão permitir com que essas plataformas alcancem um número maior de startups, captem valores mais elevados e operem com o mercado secundário – o que permite auxiliar na revenda das ações.
De acordo com a Instrução 588/17, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), hoje as plataformas de equity crowdfunding podem captar apenas R$ 5 milhões por ano para cada startup e estão limitadas a trabalhar com empresas com faturamento de até R$ 10 milhões.
Uma edição da regra baseada em propostas feitas em audiências públicas pode ampliar esses valores. O teto do faturamento das empresas que buscam dinheiro nessas bolsas alternativas pode passar para até R$ 30 milhões, enquanto o valor máximo a ser captado por ano pode dobrar para R$ 10 milhões.
Enck espera que essas mudanças passem a valer a partir de março. Sem as alterações, ele afirma que não seria possível bater as metas previstas de captação e de aumento no número de investidores. “Temos uma certa segurança porque a CVM já até circulou uma minuta em relação a isso. A única coisa que está pendente é o timing”, afirma.
Procurada pelo NeoFeed, a CVM informou por meio de sua assessoria que “a Autarquia recebeu as manifestações do mercado e está em fase de análise e procedimentos para conclusão da norma”. O órgão informou que a regulamentação “está prevista para edição ainda neste ano”.