Os bancos digitais voltados às pequenas e médias empresas começam a entrar no radar dos investidores. Apenas em dezembro, Linker e Conta Simples, dois dos nomes desse novo espaço, levantaram rodadas de R$ 12 milhões e US$ 2,5 milhões, respectivamente.
Exatamente um ano antes, quem inaugurou essa corrida foi a Cora, fintech que captou um aporte de US$ 10 milhões na época, liderado pela Kaszek e Ribbit. Apesar de sair na frente de seus pares, a startup levou mais tempo para chegar oficialmente ao mercado, o que aconteceu apenas em outubro.
“Foi uma decisão não tão trivial, mas optamos por ter nossas próprias licenças e tecnologia”, diz Igor Senra, cofundador e CEO da Cora, ao NeoFeed. “E, por mais que tenhamos demorado um pouco, daqui para frente, temos tudo na mão para andar na velocidade que queremos.”
Um dos principais avanços veio em junho, com a aprovação do Banco Central para operar como Sociedade de Crédito Direto (SCD). Com essa estrutura, a Cora prepara as próximas novidades do portfólio, composto hoje por conta, cartão de débito, PIX e ferramentas de gestão para PMEs.
Compor uma base com diferentes modalidades de crédito é a prioridade. Uma das soluções em teste é um cartão de crédito. A função já está incluída no cartão de débito lançado com a Visa, em outubro, mas está sendo ativada, pouco a pouco, com uma alguns usuários.
Entre janeiro e fevereiro, a Cora também coloca no ar um projeto piloto de antecipação de recebíveis de boletos emitidos na plataforma. O plano é ter ao menos um dos dois produtos disponíveis oficialmente já neste trimestre. Os recursos para financiar a entrada nesse segmento já estão garantidos.
“Ainda temos metade da primeira rodada disponível e parte do funding virá desse montante”, diz o empreendedor. Caso seja preciso, a empresa já costurou acordos para a estruturação de outras fontes de recursos, como FIDCs.
A Cora não partirá do zero quando chegar o momento de escalar a oferta de crédito. A fintech já tem 30 mil clientes, boa parte deles conquistada antes mesmo do lançamento oficial da plataforma, a partir de versões do aplicativo que foram testadas e evoluídas com feedbacks desses usuários.
Entre os recursos desenvolvidos estão a versão de internet banking do aplicativo, lançada em dezembro. Outra solução foram os painéis que dão visibilidade de todo o fluxo de contas a receber, além de uma ferramenta que automatiza e agiliza os processos de cobrança.
A fintech já tem 30 mil clientes, boa parte deles conquistada antes mesmo do lançamento oficial da plataforma
Para facilitar a vida das empresas, a Cora também começou a buscar integrações com startups de contabilidade digital e de softwares de gestão, que têm acesso, sob consentimento, às movimentações das PMEs. A lista já envolve companhias como Agilize, AccountBank, Qipu, MarketUp, AppelSoft e Uno.
“Temos uma avenida para desenvolver uma oferta em que as informações fluam de maneira muito mais simples para essas empresas”, diz Senra, que destaca as atualizações semanais na plataforma e o plano extremamente ambicioso de encerrar 2021 com uma carteira de 300 mil contas.
“Esse é um mercado que mescla perfis diferentes e ainda é tratado de forma parecida pelos bancos tradicionais”, afirma Fabricio Winter, sócio da consultoria Boanerges & Cia. “E que é muito carente, especialmente em crédito e em produtos financeiros aliados a soluções de gestão.”
Ele destaca a aprovação da Cora para operar como SCD. “Ter essa autorização dá mais transparência, credibilidade e melhora a experiência do cliente, por não envolver passos adicionais”, diz. “E não ter um parceiro por trás também permite eliminar parte do custo da oferta na ponta.”
"PayPal do Brasil"
A Cora não é a primeira iniciativa de Senra com foco nas PMEs. Em 2007, ele fundou com Leonardo Mendes a Moip, que tinha o plano de ser o “PayPal do Brasil”. A startup de pagamentos chegou a atender 3 milhões de clientes até ser comprada, em 2016, pela alemã Wirecard, por US$ 165 milhões.
O acordo marcou a entrada da Wirecard no Brasil. Em junho do ano passado, um escândalo de fraude contábil no valor de US$ 2 bilhões, envolvendo o CEO global da empresa, veio à tona. Dois meses depois, a operação brasileira foi comprada pela PagSeguro.
Antes desses problemas, Senra e Mendes seguiram no negócio depois da aquisição da Moip até que, em 2018, decidiram buscar outro caminho.
“Queríamos focar os pequenos negócios, mas a Wirecard tinha outras prioridades”, diz. “Na nossa cabeça, o problema não estava mais nos pagamentos, mas sim, no fato de que as PMEs seguiam entregando suas contas para os mesmos 4 ou 5 bancos.”
Em 2019, a Cora começou a ser gestada, com mais um sócio, Daniel Fonseca. O histórico com a Moip contou pontos para atrair o aporte de US$ 10 milhões antes de chegar ao mercado.
Mas se, na época, os bancos digitais estavam centrados nas pessoas físicas, agora, a nova batalha é pelos pequenos CNPJs. Além de “pure players” como Conta Simples e Linker, a lista inclui nomes com ofertas mistas, como Original, Nubank, Neon, Banco Inter e BTG Pactual.
Em relação ao último grupo, Senra diz que a vantagem da Cora é não dividir a atenção entre demandas distintas. Já quanto aos puros-sangues, o diferencial é o fato de a empresa já ter suas próprias licenças. Para ele, a startup também está alguns passos à frente dos grandes bancos nessa área.
“Eles estão enfrentando a pressão das fintechs em várias frentes e essa é uma que eles nunca foram, de fato, bons”, afirma. “É óbvio que vão tentar fazer um catch up. Mas temos velocidade para entregar o que precisa ser feito.”
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