Em meados de 2019, Pedro Waengertner e Mike Ajnsztajn, a dupla que cofundou a ACE, decidiram que era hora de diversificar a operação da aceleradora e gestora de venture capital criada sete anos antes.
Nos primeiros movimentos neste sentido, a ACE passou a explorar os mercados de educação e de consultoria corporativa. Num segundo momento, ela prestou serviços para Vale, Ipiranga, Natura, Renner, Vivo, Porto Seguro, Gerdau, Vibra e Ambev. Agora, a meta é unir as startups com essas gigantes.
Nos últimos meses, a ACE desenvolveu uma nova vertical para o negócio. Agora, a gestora atua também como uma boutique de M&As para conectar empreendedores que desejam vender seus negócios para corporações interessadas em soluções de tecnologia e crescimento inorgânico.
De acordo com Otávio Pimentel, sócio da gestora e que vai comandar essa nova frente, e Waengertner, as empresas que serão vendidas não foram aceleradas e nem investidas pela ACE anteriormente. Em troca de fazer esse meio de campo, a gestora fica com um percentual da venda realizada.
“É uma metodologia que foi criada para ajudar empreendedores que nunca tiveram uma relação conosco no passado”, diz Waengertner. O executivo projeta que a boutique deverá realizar 30 deals até o fim de 2025. A previsão é de que essa frente represente uma fatia de 25% do faturamento de R$ 200 milhões projetado para daqui a dois anos.
Por ora, a ACE realizou apenas um negócio. Em janeiro, a holding assessorou a venda da Qexpert, de serviços voltados para análise de dados, para a Cadastra. Os valores envolvidos na transação não foram divulgados.
O NeoFeed apurou que a gestora pretende trabalhar com negociações que ficam entre R$ 80 milhões e R$ 150 milhões. A meta é realizar entre sete e oito negócios ao longo do ano, sendo quatro ou cinco já neste primeiro semestre. “Já tem dois ou três acordos engatilhados para os próximos meses e que estão em fases de discussão de contrato e auditoria”, diz Waengertner.
Modus operandi
Fundada em 2012 e já tendo realizado mais de 300 programas de aceleração que envolveram mais de mil startups, a ACE quer aproveitar a experiência que adquiriu ao longo de mais de uma década trabalhando com startups – e realizando também M&As de suas investidas como gestora.
Dos mais de 140 investimentos realizados em startups, a companhia montou uma carteira na qual investia em média R$ 2 milhões em startups em estágio inicial. O portfólio já contou com nomes como Decorati e Love Mondays, vendidas em 2019 para Loft e Glassdoor respectivamente, além da Melhor Envio que foi comprada pela Locaweb no fim de 2020.
No processo de intermediação dos M&As, a ACE primeiro vai mapear o mercado em busca de startups que possam ter suas operações absorvidas por empresas maiores. Para estar elegível à operação, a startup precisa atender alguns critérios como ter faturamento anual de, pelo menos, R$ 6 milhões e soluções que envolvam o uso de tecnologia. Outro ponto analisado é se os executivos realmente estão decididos a vender a empresa.
Se passar nesse filtro, a startup entra no programa de aceleração da ACE voltado para melhorar pontos que podem ser importantes ajudar antes de achar compradores interessados no negócio. Para custear o processo, a ACE cobra uma mensalidade das startups – o valor não é revelado, mas segundo a gestora a cifra serve apenas para custear o processo e não há equity envolvido.
A partir de então é iniciada uma busca por possíveis compradores para o negócio. Se a negociação avançar, a ACE fica com uma parte do deal – mas a companhia não revela quanto, apenas que o percentual é variável.
O que se sabe é que as cifras envolvidas nas vendas devem girar entre R$ 80 milhões e R$ 150 milhões. "As grandes boutiques querem deals com cheques maiores”, diz Waengertner. “Não é aquele M&A de centenas de milhões de reais, mas um que a gente consegue dar liquidez além do venture capital.
Concorrência
A ACE não é a única gestora que vem olhando com mais atenção para as fusões e aquisições. No mês passado, a Galapagos Capital, empresa fundada por Carlos Fonseca, ex-BTG Pactual, trouxe para dentro de seu negócio a Cypress, uma boutique especializada neste tipo de negócio.
Nos últimos 18 anos, a Cypress movimentou mais de R$ 15 bilhões intermediando um número superior a 150 transações. Alguns dos principais acordos realizados envolveram a venda de 60% da Feedz para a Totvs por R$ 66 milhões no ano passado e a compra da Smart Telecomunicações e Serviços para a Algar Telecom por R$ 49,8 milhões em 2020.
Outras rivais neste setor são IGC, RGS Partners, Questum, Pipeline Capital, além de bancos e corretoras como XP, Itaú BBA, BTG Pactual, JP Morgan, Goldman Sachs, entre outros, mas mais focados em transações maiores.
Para Waengertner, a tendência é de que cada vez mais este movimento se torne comum. “O mercado de venture capital vem se corrigindo e os empreendedores quem analisar outras oportunidades antes de levantar uma nova rodada”, diz. “As vezes não faz sentido captar mais dinheiro, mas sim unir sua operação a um player maior para ganhar mercado.”
De acordo com dados da consultoria Sling Hub, as startups latino-americanas realizaram apenas 71 rodadas de captação de investimentos no primeiro mês deste ano e levantaram US$ 674 milhões. O valor é 48% menor do que o registrado no mesmo mês de 2022.