Em três décadas de atuação no setor automotivo, o empresário Sergio Habib coleciona alguns feitos. Entre eles, trazer a Citröen ao Brasil e abrir a primeira concessionária local da Jaguar. À frente do grupo SHC, comandou ainda concessionarias da Volkswagen, Land Rover e Aston Martin.

Sua tacada mais ambiciosa, porém, veio em 2011, quando trouxe a chinesa JAC Motors ao País. A marca desembarcou por aqui fazendo barulho, abrindo 50 concessionários no mesmo dia. Oito anos depois, no entanto, a empresa não figura nem entre os 20 principais fabricantes no mercado nacional.

Agora, Habib traça um novo roteiro para que a JAC encontre o seu espaço no setor. A montadora anunciou hoje oficialmente cinco veículos elétricos da marca no País. Os modelos incluem três SUVs (iEV 20, 40 e 60), uma picape (iEV 330P) e um caminhão (iEV 1200T).

Com preços que vão de R$ 119.900 até R$ 259.900, os lançamentos chegam ao país até junho de 2020. “Somos a primeira marca a lançar uma linha completa de elétricos no Brasil”, diz Habib.

Ele entende que o segmento ainda tem uma boa estrada pela frente para decolar no País. “Mas nossa estratégia é largar na frente. O primeiro sempre tem a vantagem.”

O mercado chinês possui a maior frota global de carros elétricos

Ao mesmo tempo, Habib destaca o fato de a China ser o mercado no qual os carros elétricos estão mais consolidados. Segundo a International Energy Agency, com 2,3 milhões de veículos, o mercado chinês possui a maior frota global nessa categoria, dentro de um volume total de 5,1 milhões de unidades.

Em seu mercado doméstico, a JAC estruturou uma joint venture com a Volkswagen para o desenvolvimento de veículos no segmento.

“A China é o país que mais vende carros elétricos no mundo, mas a tecnologia usada não é necessariamente de ponta”, diz um executivo do setor. “De qualquer forma, se compararmos o que estão fazendo por lá, eles estão anos luz à frente de mercados como o Brasil”.

Histórico conturbado

A nova linha chega em um momento pouco animador para a JAC no Brasil. Especialmente se comparado ao alvoroço criado no desembarque da marca, cujo investimento inicial estimado foi de R$ 100 milhões.

No dia do lançamento local, Habib inaugurou 50 concessionárias no País. Na sequência, contratou o apresentador Fausto Silva como garoto-propaganda da marca.

A estratégia parece ter surtido efeito. Ao menos no início. Com uma proposta de carros com uma série de acessórios e com preços mais acessíveis, em 2011, seu primeiro ano de atuação no mercado brasileiro, a montadora contabilizou 23,7 mil carros vendidos.

Na esteira dos planos grandiosos, Habib anunciou, no mesmo ano, um aporte de R$ 1 bilhão para a construção de uma fábrica em Camaçari (BA), com capacidade de produção anual de 100 mil veículos. Um carro chegou a ser enterrado no terreno no lançamento da pedra fundamental do projeto.

Desde então, a iniciativa passou por uma série de mudanças. Entre elas, a redução do investimento para R$ 200 milhões e da capacidade para 20 mil carros. Além da transferência da futura fábrica para Goiás.

Até hoje, no entanto, o projeto não saiu do papel. Muito desse contexto é atribuído por Habib ao que ele classifica como uma política protecionista do governo da ex-presidente Dilma Rousseff.

Em 2016, a empresa foi excluída do Inovar-Auto, programa do governo federal de incentivos federais em vigor na época. E foi acionada na Justiça por ter recebido benefícios por conta da produção em Camaçari.

Atualmente, Habib negocia com Caoa e Mitsubishi uma possível parceria de produção

Atualmente, Habib negocia com Caoa e Mitsubishi uma possível parceria de produção nas unidades dessas montadoras em Goiás, respectivamente, nas cidades de Anápolis e Catalão.

Todo esse contexto também se refletiu na queda substancial das vendas. A JAC fechou 2018 com 3,8 mil carros comercializados no mercado brasileiro.

Diante do cenário nada animador, o empresário recebeu, no entanto, uma boa notícia. Na sexta-feira 13, a Justiça homologou o plano de recuperação judicial do Grupo SHC, responsável pela operação da JAC no País, entre outros negócios de Habib. A empresa possui dívidas na ordem de R$ 500 milhões.

Estratégia

O lançamento conjunto de cinco carros elétricos pode remeter, a princípio, aos planos arrojados dos primeiros tempos da JAC. Entretanto, questionado pelo NeoFeed sobre o histórico local recente da montadora, Habib sinaliza uma certa cautela.

“É por isso que estou indo um pouco mais devagar”, afirma. “Eu poderia trazer duzentos carros por mês, mas não estou fazendo isso.”

Com 58 pedidos já “faturados”, o primeiro modelo a chegar é o SUV iEV 40, com preço de R$ 153.900

Com 58 pedidos já “faturados”, o primeiro modelo a chegar é o SUV iEV 40, com preço de R$ 153.900. Em novembro, é a vez do caminhão elétrico. Na sequência, o iEV 20, em janeiro; a picape, em abril; e, em junho de 2020, o iEV 60.

A linha mais ampla é uma das apostas para que a JAC ganhe um novo fôlego no País. “As outras montadoras têm um modelo ou ainda não tem nada na categoria no Brasil”, afirma o empresário.

No País, até o momento, a relação de modelos concorrentes na categoria inclui Renault Zoe, Chevrolet Bolt, Nissan Leaf, BMW i3 e Jaguar I-Pace. Com preço sugerido de R$ 149.900, o Zoe, da Renault, é o carro mais barato da categoria disponível no mercado local. Mas ainda está em fase de pré-vendas.

“A JAC não vai vender milhares de carros. É um nicho ainda pequeno, mas, com essa oferta mais ampla, eles estão à frente das outras marcas”, diz Milad Kalume, analista da consultoria Jato Dinamics. “Eles podem ocupar um espaço que ainda não foi preenchido no País, de carros elétricos e comerciais leves mais acessíveis.”

As parcerias integram os esforços da JAC para ganhar corpo na categoria. Um dos destaques é o Santander, que oferecerá uma linha de crédito especial para a compra de carros elétricos da marca, com uma taxa de 0,77% ao mês. Segundo o banco, o índice é 15% menor do que aquele ofertado no financiamento tradicional.

A fabricação local, no entanto, está fora dos planos. Além da alíquota zero para a importação de carros elétricos e do volume que ainda não justificaria um projeto, o fato de o Brasil não contar com a produção de baterias é um grande impeditivo. A importação desse componente é cara, complexa e tornaria inviável qualquer iniciativa.

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