Em 2020, quando a pandemia do novo coronavírus começava a paralisar o mundo, o UOL vendeu a UOL Diveo, sua divisão de data centers, para o fundo americano Digital Colony, hoje rebatizado de DigitalBridge, em um negócio estimado entre US$ 300 milhões e US$ 400 milhões, dando origem a Scala.

Mais de dois anos depois desse negócio, a Scala está tocando um bilionário investimento de construção de data centers no Brasil e na América Latina. Até 2023, serão investidos US$ 2 bilhões. No total, os aportes vão chegar a quase US$ 3,5 bilhões em 2027.

“Cheguei atrasado, mas no momento certo. A demanda do mercado explodiu”, afirma Marcos Peigo, CEO da Scala, ao NeoFeed, referindo-se aos seus principais concorrentes, como Odata e Ascenty, que estão há mais tempo no mercado brasileiro.

A Scala já conta com quatro data centers em operação, localizados em São Paulo e Campinas. No começo deste mês, inaugurou o seu quinto data center e o primeiro centro de dados vertical da América Latina, com 56 metros de altura, e mais de 12 mil metros quadrados de área construída.

Nesta semana, a companhia está anunciando sua expansão para outras cidades. O plano é construir data centers no Rio de Janeiro, Porto Alegre e Fortaleza. O avanço para a América Latina já está também em curso. Um centro de dados está sendo construído no Chile.

Mas os planos são muito ambiciosos. A companhia planeja construir mais 17 data centers no Brasil, além de aumentar a sua presença na região latino-americana. No Chile, há intenção de levantar mais dois data centers. E no roteiro está a entrada na Colômbia e no México.

Quando tudo estiver pronto, serão 33 data centers com uma capacidade estimada de mais de 900 megawatts – atualmente, é de 50 megawatts. “O plano de negócio previa um crescimento de 12% a 20%, mas estou crescendo mais de 100% ano a ano e devo superar os 200% em 2022”, diz Peigo.

A expansão está sendo alavancada por uma estratégia arrojada. Em vez de construir data centers e compartilhar com diversos clientes, o modelo comum do setor, a Scala está levantando prédios inteiros e negociando com exclusividade para um único cliente. São corporações que precisam de estruturas hyperscaling, dimensionadas para atender a demanda crescente.

Embora guarde os nomes em segredo, por força de contratos de sigilo, não há tantas empresas no mercado capazes de absorver essa infraestrutura tecnológica. São companhias como AWS, Google, Oracle e Microsoft. Em uma escala menor, estão IBM e as chinesas Tencent e Alibaba, que já operam no Brasil.

Na prática, a Scala está se tornando o “data center dos data centers”. “Eu digo que o prédio inteiro é deles e que podem colocar inclusive o logo”, diz Peigo. “O único preço é continuar crescendo comigo.”

Quando desenhou o plano de negócio da Scala, Peigo acreditava que 50% de seus data centers seriam usados por clientes hyperscaling. Mas hoje é a proporção é de 90%. Os outros 10% são os mais de 200 clientes corporativos, herdados da compra da UOL Diveo.

Os recursos bilionários para essa expansão vêm de diversas fontes. Uma delas é a própria DigitalBridge, que tem US$ 45 bilhões em ativos sob gestão e conta com 45 empresas de infraestrutura digital espalhadas pelo mundo – a maioria delas de data centers.

No Brasil, a DigitalBridge é dona ainda da Highline, uma empresa que compra torres de celulares de empresas de telefonia e tentou, no ano passado, adquirir a operação móvel da Oi por mais de R$ 16 bilhões – a concorrência foi vencida pelo consórcio TIM, Claro e Vivo.

Em março deste ano, a Scala emitiu também R$ 1 bilhão em debêntures, com cinco anos de vencimento, e pagamento de DI mais 3,25%. Peigo diz que uma nova emissão, essa de R$ 2 bilhões, deve ser feita em breve. O International Finance Corporation (IFC), braço de investimentos do Banco Mundial, é também sócio minoritário da Scala.

Imagem renderizada do data center vertical da Scala, que acaba de ser inaugurado

Peigo acredita também que ao construir prédios exclusivos para clientes que ele chama de “triple A” garante contratos de longo prazo e uma receita previsível. “Meu trabalho deixa de ser de tecnologia, para ser de real estate”, afirma o CEO da Scala. “São construções de alto valor agregado e com consumo garantido.”

Infraestrutura digital

A Scala está se beneficiando, assim como Odata a Ascenty, de uma explosão do uso de infraestrutura de computação em nuvem, uma tendência acelerada pela pandemia do novo coronavírus, mas que encontrou um terreno fértil no Brasil em razão de uma série de peculiaridades.

Uma das razões é que o uso intensivo de infraestruturas digitais levou a uma explosão da demanda nos Estados Unidos. E isso fez com que os grandes fornecedores de cloud, como AWS, Google e Microsoft, migrassem para outros países. E o Brasil foi um dos escolhidos para essa expansão. “As grandes empresas não estavam no país e essa assimetria ia ser atualizada”, afirma Peigo, referindo-se à necessidade de mais infraestrutura digital local.

Ao mesmo tempo, quanto mais perto das empresas, menor a latência (o tempo de resposta). E isso é cada vez mais importante para determinadas aplicações. Soma-se a isso uma legislação que exige o armazenamento de dados no País e a entrada em vigor da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais).

Esse cenário provocou uma explosão de investimentos. No ano passado, os gastos com infraestrutura digital atingiram US$ 6 bilhões na América Latina, segundo a consultoria Arizton. A previsão é que os gastos cheguem a US$ 9,1 bilhões, em 2027.

Os gastos com infraestrutura digital atingiram US$ 6 bilhões na América Latina em 2021

No Brasil, a estimativa é que, nos próximos cinco anos, os gastos alcancem US$ 3,7 bilhões. No mundo, os investimentos globais com data centers subirão 4,7%, chegando a US$ 226 bilhões, em 2022, segundo a Gartner, uma das principais empresas em pesquisa e consultoria na área de tecnologia.

É um campo fértil para investir em busca de clientes. E a competição que a Scala enfrenta é de empresas que estão há mais tempo no mercado. Uma delas é a Odata, companhia de data center criada pelo Pátria, em 2015. No Brasil, conta com três centros de dados no estado de São Paulo.

A expansão da Odata passa ainda pela construção de um data center no Rio de Janeiro, com sua primeira etapa 100% contratada e prevista para começar a operar em 2023. Na América Latina, entre os projetos em operação e em construção ou expansão, a empresa tem oito data centers.

Na Colômbia, país que marcou a primeira incursão internacional da Odata, a companhia tem um centro em Bogotá e prevê mais três unidades no curto prazo. No Chile, por sua vez, há um data center em operação em Santiago e outro em construção. Neste ano, começou a operar no México.

Na disputa está também a Ascenty, que tem 28 data centers em operação e em construção no Brasil, no Chile e no México. Das unidades em funcionamento, a Ascenty já opera dois data centers no Chile, dois no México e 18 no Brasil, sendo 15 no estado de São Paulo, dois no Rio de Janeiro e um em Fortaleza.

A estratégia da Scala para tirar o atraso no número de data centers em relação aos seus concorrentes é uma metodologia batizada de “fast deploy”, que foi patenteada pela empresa. Ela promete reduzir o tempo de construção de um centro de dados de 18 meses a 24 meses para uma média entre seis meses e nove meses.

A técnica consiste em um modelo pré-fabricado, modular e padronizado que acelera a construção. Enquanto o terreno onde vai ser construído é adquirido e as licenças ambientais são obtidas, a obra de engenharia é realizada simultaneamente.

Para fazer isso, a Scala tem um acordo estratégico com a Modular Data Centers, que trabalha com exclusividade à empresa. O próprio Peigo é conselheiro da empresa, assim com Carlos Piani, ex-CEO da Equatorial e CEO da HPX, SPAC que está se unindo com a subsidiária Response, da Ambipar, para abrir o capital nos EUA.

Ganhar escala, com o perdão do trocadilho, é o nome do jogo da Scala para conquistar um lugar ao sol, ou melhor, no escurinho das salas refrigeradas dos data centers do Brasil e da América Latina.