Depois de uma pausa forçada em virtude da Covid-19, as ofertas públicas iniciais (IPO) começam novamente a movimentar as bolsas de valores, especialmente nos Estados Unidos. O principal impulso para esse reaquecimento, no entanto, pode vir de um mercado bem distante do americano.

Nesta segunda-feira, o Ant Group, grupo chinês de pagamentos móveis dono do aplicativo Alipay, anunciou que tem planos para uma listagem simultânea de suas operações na Bolsa de Hong Kong e no segmento STAR, voltado a empresas chinesas de tecnologia, da Bolsa de Xangai.

“As listagens ajudarão a empresa a acelerar seu objetivo de digitalizar o setor de serviços na China e impulsionar a demanda doméstica”, disse, em comunicado, Eric Jing, presidente executivo do Ant Group. “Além de posicionar a empresa para desenvolver mercados globais com parceiros e expandir o investimento em tecnologia e inovação.”

No anúncio, o Ant Group não estabeleceu um prazo para as duas ofertas. A expectativa, no entanto, é de que os IPOs configurem uma das maiores listagens não apenas em 2020, mas dos últimos anos. Segundo fontes ouvidas pela agência Bloomberg, o grupo espera uma avaliação de US$ 200 bilhões com os dois processos.

Constituído oficialmente em 2014 e controlado pelo Alibaba, que detém 33% da operação, o Ant Group é, na prática, a maior fintech do mundo. O negócio foi avaliado em US$ 150 bilhões em sua última rodada de investimentos, em meados de 2018, liderada pela Temasek e pelo Fundo Soberano de Cingapura. No total, a empresa já atraiu US$ 22 bilhões em quatro aportes.

O Ant Group tem origem no Alipay, aplicativo lançado pelo bilionário Jack Ma e que é o carro-chefe da companhia, com mais de 1,2 bilhão de usuários. Lançado em 2004, o serviço é uma plataforma que dá acesso a mais de 100 serviços, o que inclui desde chamar e pagar um táxi até comprar ingressos de cinema, reservar hotéis e marcar consultas médicas.

Reforço doméstico e além da Grande Muralha

Para analistas, os IPOs simultâneos teriam dois objetivos. O primeiro, ganhar ainda mais musculatura para defender o domínio do Ant Group no mercado chinês de pagamentos móveis, diante do avanço da não menos poderosa rival Tencent e sua plataforma WeChat.

Hoje, segundo a consultoria iResearch, o Ant Group tem uma participação de 55,1% no segmento no mercado da China, enquanto a Tencent alcançou uma fatia de 38,9%.

Além de defender sua liderança no país, as duas listagens também dariam força para que o Ant Group expandisse suas fronteiras, uma estratégia que a companhia vem reforçando, especialmente, desde o início de 2020.

O Ant Group foi avaliado em US$ 150 bilhões em sua última rodada de investimentos, em meados de 2018, liderada pela Temasek e pelo Fundo Soberano de Cingapura

Esses esforços além da Grande Muralha começaram a ganhar mais fôlego em dezembro, quando Simon Hu, um ex-executivo do Alibaba, assumiu como CEO da operação. Ele substituiu Jing, que seguiu como presidente-executivo, cargo que acumulava, até então, com o comando do grupo.

Com a mudança nas cadeiras, enquanto Hu ficou mais concentrado no mercado doméstico, Jing passou a se dedicar ao desenvolvimento de tecnologias e a abertura de novos mercados no exterior, por meio de parcerias com empresas do setor, como a francesa Worldline, e acordos com plataformas e carteiras digitais em países como Coreia do Sul, Tailândia, Malásia e Índia.

Segundo dados divulgados pelo Ant Group, no início de 2020, a companhia mantinha acordos com mais de 250 instituições financeiras em todo o mundo, sendo mais de 120 na Europa.

Nessa escalada, o maior desafio é conquistar o mercado americano, diante das tensões entre os dois países. Uma das maiores provas dessa difícil missão veio em 2018, quando o grupo teve a proposta de compra da MoneyGram, empresa americana de pagamentos de Dallas, barrada pelo Comitê de Investimentos Exteriores dos Estados Unidos.

O anúncio das duas listagens simultâneas do Ant Group também reforça a disputa entre os dois países no plano do mercado de capitais. Nos últimos meses, parte das empresas chinesas tem escolhido abrir capital em seus próprios domínios, em detrimento das bolsas de valores americanas.

O caso mais emblemático foi a da JD.com, gigante chinesa de e-commerce, que, listada na Nasdaq, decidiu realizar um follow on, em junho, na Bolsa de Hong Kong, no qual captou US$ 3,9 bilhões.

Parte dessa debandada coincide com a definição de regras mais rígidas das bolsas americanas para a listagem de empresas estrangeiras, em um movimento visto por muitos como feito com foco nas companhias chinesas.

Em maio, por exemplo, a Nasdaq estabeleceu, entre outras regras, que as ofertas públicas iniciais devem ser de no mínimo um quarto do valor de mercado da listagem ou de US$ 25 milhões. Em contrapartida, as bolsas chinesas têm feito um movimento para flexibilizar as condições para as empresas locais acessarem o mercado de capitais.

“As medidas inovadoras implementadas pelo mercado STAR e pela bolsa de Hong Kong abriram as portas para os investidores globais acessarem empresas de tecnologia de ponta das economias mais dinâmicas do mundo e para que essas companhias tenham maior acesso ao mercado de capitais”, afirmou Jing, no comunicado sobre as listagens do Ant Group. “Estamos entusiasmados por ter a oportunidade de participar desse desenvolvimento.”

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