Os Estados Unidos bateram recorde de investimentos verdes em 2023, apesar das elevadas taxas de juros e da crescente pressão de acionistas de grandes empresas e da oposição republicana no Congresso contra a pauta ESG na maior economia do planeta. Mas a pauta anti-ESG também avançou e fundos de investimentos focados em projetos verdes tiveram uma queda de 75%.

Os dados divulgados esta semana pela BloombergNEF, consultoria internacional em mercados globais de commodities e de energia, indicam a liberação de um total de US$ 303 bilhões em financiamentos ao longo do ano passado para o desenvolvimento de energia limpa, incluindo energia renovável, veículos elétricos e incremento de redes elétricas, entre outras áreas.

Dois segmentos, energia solar e veículos elétricos, puxaram as maiores altas de investimentos, atribuídas às isenções e subsídios previstos pela Lei de Redução de Inflação (IRA, na sigla em inglês) – o pacote de infraestrutura de US$ 1,7 trilhão do governo Joe Biden, aprovado pelo Congresso em agosto de 2022 para estimular a transição energética no país.

Como 2023 foi o primeiro ano cheio após a implementação do IRA é possível avaliar o impacto dos subsídios nos investimentos verdes. As empresas responderam com 104 projetos de novas fábricas ao longo do ano, totalizando US$ 123 bilhões.

A energia solar, por exemplo, com 34 projetos, foi a maior responsável pela adição de 42 gigawatts (GW) na capacidade de geração de energia renovável à rede dos EUA, um recorde.

De acordo com a BloombergNEF, uma enxurrada de painéis solares importados do Sudeste Asiático ajudou a satisfazer a procura, em parte porque o governo Biden renunciou às tarifas sobre essas importações.

Outro dado relevante foi o crescimento de 50% na venda de carros elétricos em 2023 em relação ao ano anterior, aumentando essa frota em 1,5 milhão de veículos.

Na compilação dos dados da consultoria, as energias solar, eólica e nuclear – que não produzem emissões – aumentaram sua fatia do bolo energético, gerando 41% da energia dos EUA no ano passado.

O gás natural (com 43% de participação), porém, ainda é a maior fonte. Beneficiada pela queda dos preços, o gás tornou-se a forma mais barata de energia no país em 2023.

O forte avanço de fontes limpas na matriz energética americana no ano passado provocou uma mudança no ranking de emissões. Em 2023, pela primeira vez, o setor industrial dos EUA que refina o petróleo e fabrica materiais como cimento, ferro, aço, produtos químicos e papel tornou-se o maior poluidor do país.

Pauta ESG perde apelo

O avanço de aportes em energia limpa em 2023 não impediu nova queda na procura de fundos de investimentos focados em projetos verdes e na pauta ESG – tendência que teve início em 2021 e ganhou corpo com o ciclo de aumento de juros nos anos seguintes.

De acordo com a Morningstar, os recursos desses fundos caíram de US$ 151 bilhões em 2021 para US$ 37,8 bilhões em 2023, queda de 75%.

O entusiasmo inicial do mercado financeiro americano com a pauta ESG começou a esfriar com a escalada das taxas de juros, que impactaram em especial os projetos de energia eólica offshore, que exigem investimentos na casa dos bilhões de dólares.

Com os juros mais altos, os preços de pás, equipamentos e até de mão-de-obra especializada subiram acima da inflação, suspendendo projetos e derrubando a cotação de empresas que atuam no setor.

Paralelamente, a pauta ESG sofreu desgaste nos últimos anos por conta da pressão de investidores para que gigantes de petróleo e gás, como a Exxon, acelerassem projetos visando a transição energética.

Como reação, deputados republicanos no Congresso e de várias legislaturas estaduais que abrigam indústrias do óleo e gás propuseram leis anti-ESG em 2023, num descompasso com o avanço das fontes limpas no país.

Apesar da marca recorde, os investimentos verdes nos EUA representaram menos da metade dos US$ 676 bilhões registrados em 2023 na China. Juntos, os dois países responderam por mais de 50% dos investimentos globais em transição energética do ano, que somaram US$ 1,8 trilhão.

Esse valor, porém, ainda está muito abaixo dos US$ 4,8 trilhões de investimentos anuais necessários para reduzir as emissões de gases de efeito estufa para quase zero até 2050, numa mostra de que a agenda verde ainda está longe de ser consenso não só nos EUA como no planeta.