Como parte da sua ofensiva de mostrar uma guinada na política econômica do país para atrair o capital externo, o primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, exortou na sexta-feira, 6 de outubro, um grupo de gestores de fundos estrangeiros a investir pesadamente “no futuro do Japão”.

O recado foi endereçado a Larry Fink, fundador e CEO da BlackRock, e a gestores da KKR e da Blackstone, e de fundos soberanos como o GIC, Temasek e o Norges Bank, reunidos em jantar na residência oficial do primeiro-ministro, em Tóquio, como parte de uma série de encontros de Kishida com investidores estrangeiros nas últimas duas semanas.

“Estou convencido de que as pessoas dentro e fora do país sentiram a determinação do Japão de se tornar um centro financeiro internacional”, disse Kishida ao grupo de gestores que, somados, gerem US$ 18 trilhões em ativos. “Pedimos que você invista novamente no futuro do Japão”, afirmou o premiê japonês, olhando para Fink.

Kishida salientou que a economia e os salários estão mais elevados depois de 25 anos convivendo com a deflação e o crescimento estagnado, enquanto os preços das ações na bolsa de Tóquio estão perto do máximo dos últimos 33 anos.

Há dois anos no cargo, completados esta semana, Kishida tem se empenhado em aproveitar os ganhos recentes do Japão, que se beneficiou de fatores externos como a inflação global - que finalmente ajudou a tirar o país da deflação – e da grande disparidade entre as taxas de juros no Japão e nos EUA, além da incerteza geopolítica em relação à China.

Kishida tem atuado em duas frentes. Numa, busca emular a “Abenomics”, a estratégia marqueteira para tentar recuperar a economia do Japão executada no segundo mandato do ex-primeiro-ministro Shinzo Abe (2012-2020). Num evento com investidores em Londres, em junho, o primeiro-ministro japonês pediu à plateia sisuda para "investir em Kishida", numa referência ao bordão “Compre meus Abenomics”, do ex-premiê Abe.

Em outra frente, Kishida tenta adaptar a estratégia chamativa de Abe - que, por sinal, fracassou, pois ficou marcada pela política econômica de juro negativo - com reformas visando a desregulamentação de empresas financeiras.

Sob o slogan da campanha “da poupança ao investimento”, Kishida tem mirado uma reformulação de sua indústria de gestão de ativos e uma expansão de veículos de investimento isentos de impostos para desbloquear US$ 14 trilhões em poupança das famílias, que evitaram expor suas economias aos efeitos da política de juros negativos dos últimos governos.

A realocação da poupança para os investimentos no mercado financeiro virou prioridade da gestão Kishida depois que, em março, o Japão caiu para o 21º lugar no The Global Financial Centres Index, ranking da competitividade dos centros financeiros elaborado pela Z/Yen Partners.

Chacoalhão

A nova ofensiva do incansável Kishida se soma a anteriores para dar um chacoalhão na economia japonesa, a terceira do mundo, ainda impactada por duas décadas de crescimento baixo.

Após 25 anos de deflação, o Japão passou a conviver com a inflação, cujo núcleo chegou a atingir 4,2% no mês de janeiro, o maior nível em quatro décadas, recuando para 3,2% em agosto.

O governo começou a abandonar a prioridade na queda de preços, o que durante anos levou a grandes gastos fiscais para sustentar a economia, mantendo a pressão sobre o banco central para que mantivesse uma política monetária ultrafrouxa.

Em 2022, o premiê japonês anunciou que iria usar o Fundo de Investimento de Pensões do governo, no valor de US$ 1,6 trilhão, para financiar um boom de startups. Desde então, vem estimulando investimento na descarbonização da indústria e, mais recentemente, reforçou seu compromisso para dar mais flexibilidade e mobilidade a uma força de trabalho em rápida redução.

Num sinal de que a estratégia ainda caminha a passos lentos, o governo do Japão teve de intervir com mensagens e dinheiro para apoiar os seus mercados monetários, de ações e de obrigações, enquanto Kishida realizava as suas atividades promocionais.

Na quarta-feira, 4, o Banco do Japão comprou quase US$ 13 bilhões em dívida pública, à medida que os rendimentos dos títulos de dez anos atingiram a marca mais elevada em uma década. No mesmo dia, o banco central também comprou o equivalente a US$ 472 milhões em fundos negociados em bolsa, depois de o índice Topix ter caído 2,5%.

Analistas estrangeiros citados pela imprensa ocidental afirmam, privadamente, que altos funcionários do governo admitem que esta pode ser a “última oportunidade” do Japão para conduzir uma realocação significativa do dinheiro global para o mercado japonês.

Os bancos centrais dos Estados Unidos e da Europa estão se aproximando do fim do seu ciclo de subida das taxas de juros, o que significa que o iene poderá começar a fortalecer-se a partir do próximo ano. Se a diferença nas taxas de juro entre o Japão e os EUA diminuir, o país asiático passaria a perder atratividade para investidores estrangeiros.

Na prática, a janela de oportunidade para o Japão começa a se fechar – o que explica o apelo em público de Kishida a Larry Klink, da BlackRock, algo pouco usual de se ver no cenário político japonês.