A pressão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que o Banco Central reduza a taxa básica de juros, hoje em 13,75% ano, com revisão da meta de inflação, deve prosseguir nos próximos dias sem a certeza de obter sucesso – por enquanto, o efeito tem sido inverso.

Nesta segunda-feira, 13 de fevereiro, o Boletim Focus, do Banco Central – relatório com um levantamento de expectativa de agentes do mercado financeiro, renovado semanalmente – manteve a tendência de alta nas projeções para a inflação e de juros tanto de 2023 quanto de 2024.

Para este ano, a previsão de inflação pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu pela nona vez seguida, de 5,78% (estimados na semana passada) para 5,79%. A projeção para 2024 também avançou, de 3,93% para 4,0% (quarta semana seguida de elevação).

A taxa de juros - que o governo pressiona por uma baixa imediata -, de acordo com o Focus, deve subir de 12,50% para 12,75% em 2023. As previsões para 2024 também não foram boas: os juros devem avançar dos 9,75% anteriormente previstos para 10,0%.

De acordo com Alberto Ramos, diretor do grupo de pesquisa macroeconômica para América Latina do banco Goldman Sachs, o aumento dos indicadores de inflação e juros reflete a expectativa do mercado – se é ruim, é porque não há confiança que a economia terá estabilidade para melhorar. Ele afirma não entender a estratégia do governo de pressionar o BC.

“Não tem lógica política nem econômica, a taxa de juros está elevada porque a inflação ainda está longe do centro da meta”, diz Ramos. “Se esse ruído todo não tivesse acontecido, o BC poderia estar numa situação de começar a cortar os juros já no meio do ano.”

O governo Lula, pelo menos por enquanto, não deu sinais de que vai mudar de estratégia. Na quinta-feira, dia 16, deve retomar a agenda de revisão da meta de inflação, hoje em 3%, na reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão no qual teria mais possibilidade de obter êxito.

O CMN é formado pelo presidente do BC (Roberto Campos Neto) e pelos ministros da Fazenda (Fernando Haddad) e do Planejamento (Simone Tebet). Há expectativa de que a meta seria revisada para 3,5%, ainda abaixo da meta de 4% defendida por deputados do PT no Congresso.

Fator externo

O argumento do governo, tanto quanto à taxa de juros quanto à meta de inflação, é de que os juros altos impedem a recuperação econômica.

Além disso, conforme já reclamaram tanto o presidente Lula quanto o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a taxa de juros brasileira é incompatível com a inflação, comparando os dois índices aos de outros países do Primeiro Mundo que também enfrentam ciclo de inflação alta e juros elevados.

Nos EUA, por exemplo, a inflação de dezembro foi de 8,5%, enquanto a taxa de juros está entre 4,5% e 4,75%. Na zona do euro, a inflação de dezembro foi ainda mais elevada, 9,2%, com juros entre 2,5% e 3,0%. No Brasil, a inflação de dezembro foi de 5,8%, com a taxa Selic em 13,75% desde o ano passado.

Um grupo de economistas divulgou no fim de semana um manifesto apoiando a estratégia do governo Lula e defendendo a redução da taxa Selic, citando justamente o cenário internacional como parâmetro.

“O discurso oficial (do BC) em sua defesa (taxa Selic) não encontra nenhuma justificativa, seja no cenário internacional ou na teoria econômica, e o debate precisa ser arejado pela experiência internacional”, diz um trecho do manifesto, assinado por mais de 2.400 economistas, entre eles Luiz Carlos Bresser-Pereira, Monica de Bolle, Luciano Coutinho, Luiz Gonzaga Belluzzo e Antonio Corrêa de Lacerda.

Para Alberto Ramos, a defasagem da relação inflação/juros entre o Brasil e o Primeiro Mundo se deve a vários fatores estruturais, entre eles a falta de solidez da economia. “O Brasil tem um nível de poupança interna muito baixa, um endividamento alto, além de tributação elevada em relação à intermediação financeira se comparada aos países ricos”, enumera.

O economista Renan Pieri, professor da FGV-SP, diz que o histórico de inflação mais alta e volátil no Brasil do que nos EUA e na zona do euro ajuda a aumentar o impacto inflacionário por aqui.

“Mas a principal razão desses juros mais altos no Brasil é o chamado prêmio de risco, a taxa de juros que remunera o investidor que coloca dinheiro aqui”, diz. Segundo ele, é o preço que se paga por ser um país com mais instabilidade institucional.

Ramos, do Goldman Sachs, adverte para um efeito ainda pior se essa estratégia do governo de pressionar o BC continuar: minar a expectativa do arcabouço fiscal.

“Essa pressão do governo aumenta o temor de que o desenho do arcabouço não saia fiscalmente responsável ou que desaponte o mercado, com muitas exceções, sem incluir investimento público, gasto com previdência e etc.”, diz. “Se não sinalizar que será custoso, não tem como acreditar que dará certo, e a inflação e os juros continuarão a subir.”