O novo presidente argentino, Javier Milei, que nesta segunda-feira, 11 de dezembro, deu início ao seu mandato de quatro anos, deve ter como prioridade máxima adotar uma reforma fiscal que limite os gastos públicos para que o país possa recuperar a credibilidade e voltar a atrair investimentos.

O conselho é do ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019), para quem Milei herdou do antecessor, Alberto Fernandéz (2019-2023), “o pior governo da história” do país, que transformou a Argentina no “paraíso do populismo”

“Cortar gastos na Argentina não é questão de ser ou não possível, é uma necessidade”, afirmou Macri, que participou no período da manhã do Fórum Político da XP, em São Paulo, enquanto Milei – em sua primeira reunião de gabinete, com seus nove ministros – anunciava em Buenos Aires uma varredura em todas as contas e contratações  do Estado, advertindo que “o equilíbrio fiscal não se negocia”.

"Milei não pode gastar mais do que arrecada e é isso que ele vai fazer nos próximos 90 dias”, afirmou Macri, lembrando que o novo presidente argentino enfatizou esse compromisso em seu discurso de posse.

Além da questão do ajuste fiscal, Macri chamou a atenção para outros dois temas que devem ser tratados como prioridade pelo novo governo.

Um deles é a questão cambial – o governo anterior instituiu mais de 15 câmbios diferentes do peso em relação ao dólar, sendo que a diferença entre o dólar oficial e o dólar blue (o mais usado no mercado paralelo) chega a 150%.

“Se Milei ele não resolver o problema das restrições cambiais, que limitam o acesso a dólares, a Argentina não voltará a atrair investimentos”, disse, referindo-se ao imposto cobrado para exportações, entre outros entraves adotados pelo antigo governo.

Outro tema destacado por Macri é falta de maioria governista no Congresso argentino. “Estamos frente a um novo presidente que tem uma margem política menor do que eu tive, Milei conta com apoio de apenas 20% da Câmara e um total de zero governadores”, advertiu.

Mesmo assim, Macri acredita que as reformas econômicas têm chance de serem aprovadas em breve, “não só pela urgência como pelo fato de o eleitorado ter se unido para tirar o peronismo do poder”.

Dolarização

Após a vitória no segundo turno, Milei buscou apoio do grupo político de Macri, o mais influente da centro-direita argentina.

Boa parte da equipe econômica nomeada pelo novo presidente argentino participou da gestão Macri – incluindo o novo ministro da Economia, Luis Caputo (ministro das Finanças e, depois, presidente do Banco Central do seu governo).

Segundo Macri, Caputo trabalha “como quem está desarmando uma bomba”. Apesar da proximidade, o ex-presidente argentino não apoia a principal proposta de Milei: a dolarização da economia. Segundo ele, a dolarização não vai ajudar a resolver a crise econômica, porque a Argentina é um exportador de commodities.

"Até entendo as vantagens simbólicas da dolarização, mas temos o exemplo do Equadro, que voltou a ter déficit fiscal após fazer esse movimento de dolarizar a economia”, disse, defendendo uma proposta alternativa polêmica: a unificação monetária comercial do Mercosul.

Essa possibilidade, de acordo com Macri, seria interessante porque Brasil e Argentina são países exportadores de produtos agropecuários. “Se Mercosul é sério, precisamos ter as mesmas regras e a mesma moeda, como a zona do euro”, afirmou, acrescentando que a medida fortaleceria os dois países a longo prazo.

Pente-fino

Na primeira reunião ministerial, Milei reforçou a prioridade em acertar o déficit fiscal, exigindo de cada pasta um relatório minucioso de gastos. O esperado pacotaço econômico, conhecido como Lei Ônibus, ficou para os próximos dias.

Além de uma revisão de cada uma das contratações feitas pela gestão Fernandez, Milei exigiu dos ministros 100 por cento de presença de todos os funcionários em locais de trabalho da administração pública nacional, para identificar os funcionários "fantasmas".

De acordo com o jornal El Clarín, Fernández ordenou a transferência de cerca de 9.000 funcionários para o quadro permanente durante sua gestão.

No mercado financeiro, por sua vez, o primeiro dia do governo Milei foi marcado pela incerteza. Além da decisão do governo de adiar o anúncio do pacote econômico, o mercado de câmbio ficou paralisado em virtude uma norma do Banco Central que na prática significou um feriado cambial.

A decisão do BC argentino estabeleceu que “todas as operações que envolvam a demanda por moeda estrangeira no mercado de câmbio, inclusive as de entidades financeiras e cambiais, necessitam de anuência prévia do BC”.

Com isso, as entidades congelaram a compra e venda de dólares da poupança. A dúvida, porém, era que dada a expectativa de uma desvalorização atual, qual a taxa de câmbio a adotar para pagamentos em moeda estrangeira com cartões de crédito.

Muitos bancos primeiro impediram que seus clientes pagassem os saldos de seus extratos em pesos e no final decidiram tomar uma cotação do dólar como referência.

O Banco Central elevou o dólar no atacado para 366 pesos desde o início da rodada. Nas telas do Banco Nación, entidade tida como referência para todo o sistema financeiro, o preço de venda no varejo chegava a 400,5 pesos.