Ed Catmull, cofundador da Pixar, aprendeu muito ao longo de mais de quatro décadas dedicadas à animação. “Se você der uma boa ideia a uma equipe medíocre, eles vão estragar tudo”, disse Catmull, de 75 anos, aposentado no ano passado. “Se você der uma ideia medíocre a uma equipe brilhante, eles vão aprimorá-la ou jogá-la fora, inventando algo melhor”, completou.
Esse foi um dos pontos abordados por Catmull na palestra sobre criatividade que ele ministrou esta semana. O ex-presidente da Pixar e da Walt Disney Animation foi um dos convidados da View Conference, conferência de computação gráfica realizada em Turim, na Itália, que teve cobertura online do NeoFeed.
Ph.D em Ciência da Computação pela Universidade de Utah, Catmull é autor de um dos livros apontados como Bíblia para quem busca inspiração. E as dicas encontradas em “Criatividade S.A.: Superando as forças invisíveis que ficam no caminho da verdadeira inspiração” não se restringem apenas ao universo da animação.
“Uma boa liderança é conseguir ajudar pessoas criativas a permanecerem no caminho da excelência, não importando o negócio em que estejam”, afirmou ele. Desde que a obra foi publicada, em 2014, em parceria com a jornalista Amy Wallace, os autores colecionam elogios.
Segundo a revista “Forbes”, o título lançado no Brasil pela Editora Rocco é um dos melhores livros de negócios já publicados. Nele, Catmull conta como a Pixar conseguiu instaurar uma cultura baseada na inovação e na criatividade, o que até então não era comum na visão empresarial.
E foi justamente isso que, em pouco tempo, causou inveja nos funcionários de outras empresas. A Pixar logo ficou conhecida pelo ambiente descontraído, distante da sobriedade dos escritórios convencionais, que proporcionava aos profissionais do estúdio localizado em Emeryville, na Califórnia.
Até o prédio principal foi concebido como um espaço humano e aconchegante para favorecer a interação entre profissionais, o que seria fundamental para a “troca de ideias”, na visão de Catmull.
Inspirado nos armazéns dos anos 1920 e 1930, o espaço conta com dois andares e um átrio no centro, para servir de praça. A área comunitária é cercada por restaurante, cafeteria, sala de jogos e uma sala de cinema.
“Minha meta na Pixar sempre foi criar uma cultura criativa que durasse mais do que nós, seus fundadores”, contou Catmull, referindo aos parceiros Steve Jobs (1955-2011) e John Lasseter. Por lá, ninguém usa terno e gravata, e ainda é normal ver funcionário circulando de patinete ou decorando o seu escritório como quiser – até como casa do Tarzã.
Além de um ambiente capaz de instigar a imaginação dos profissionais, qual o segredo para extrair as melhores ideias? “Escolher a melhor equipe”, disse o ex-presidente. O sucesso da Pixar foi resultado, segundo ele, da combinação entre o que havia de mais avançado em termos de tecnologia e os maiores talentos criativos.
“A tecnologia, no entanto, jamais esteve acima de uma boa história”, contou Catmull, que acompanhou todos os passos na criação de clássicos como “Toy Story” (1995), “Monstros S.A.” (2001), “Procurando Nemo” (2003) e “Carros” (2006).
“Queremos no time um número razoável de pessoas que ultrapassam os limites, sempre fazendo e sugerindo coisas não convencionais. A única regra é a de nunca machucar ninguém”, afirmou Catmull.
Toda equipe precisa de pessoas fazendo “coisas estranhas” na empresa, segundo o ex-presidente. “Claro que, se todos do time fossem assim, não daria para produzir muita coisa até o final do dia”, disse, rindo.
Ter um pequeno grupo dessa categoria já é o suficiente para sinalizar a mensagem correta, de que é bom pensar diferente. “Quando encorajamos membros da equipe a se comportarem fora dos padrões, os outros percebem que isso é ok, que ninguém espera rigidez na conduta. Ter a equipe certa e a química certa é mais importante do que ter a ideia certa.”
Inspirado por gênios
E como Catmull inspirou a si mesmo, ao longo da carreira? “Não tenho uma boa resposta para isso. Mas posso dizer que, enquanto crescia, eu já me inspirava simultaneamente em Walt Disney (1901-1966) e em Albert Einstein (1879-1955).”
Para o ex-presidente, seus ídolos representaram os dois polos da criatividade. “Disney queria inventar, trazendo o que o que ainda não existia, tanto em termos artísticos quanto tecnológicos.”
Já Einstein era um mestre em explicar o que já existia. “Ele ousou dobrar as implicações do que pensávamos saber. Resolveu os maiores quebra-cabeças de todos e, ao fazer isso, mudou nossa compreensão da realidade”, disse Catmull, vencedor de um Oscar técnico, o prêmio Gordon E. Sawyer, em 2009, pela contribuição no campo da computação gráfica.
“O que sentia na infância era que eu queria ser, em algum momento da minha vida, o melhor do mundo em alguma coisa”, contou Catmull, que iniciou a carreira desenvolvendo software para animações. Logo ele chamou a atenção de George Lucas, que o levou para trabalhar na Lucasfilm, onde Catmull conheceu o animador John Lasseter.
Em 1986, depois que Steve Jobs comprou a divisão digital da Lucasfilm, é que o trio fundou a Pixar. Foi o estúdio que revolucionou a história da animação, com o uso da computação gráfica – inicialmente em “Toy Story”.
“Mais tarde, percebi que tudo o que eu fazia, fosse do ponto de vista técnico ou artístico, eu sempre buscava me cercar de pessoas que eram melhores do que eu. O que quero dizer com isso é que precisamos contratar pessoas diferente de nós, o que exige muita confiança”, contou o ex-presidente.
Ao longo da trajetória, Catmull percebeu que não era tão importante assim ser o melhor. “Mas sim fazer parte de algo realmente significativo”, disse ele, encerrando a palestra e certamente se referindo à Pixar. Atualmente, o estúdio é responsável por 15 das 50 animações de maior bilheteria de todos os tempos.
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