O mercado de criptomoedas, até outro dia visto como um ambiente restrito a um punhado de investidores curiosos e dispostos a tomar risco em uma espécie de "universo paralelo" dos investimentos, tem conseguido, aos poucos, quebrar algumas barreiras.

Um investidor mais leigo, que está começando a abrir a cabeça para as criptomoedas, talvez desista de seguir adiante após encarar o ambiente de uma plataforma tradicional de negociação de ativos digitais, que pode parecer um terreno minado para quem está dando os seus primeiros passos.

É essa a premissa da Finchain, uma holding especializada em investir em negócios com tecnologia blockchain que tem o Banco Genial como sócio minoritário, para tentar um caminho diferente para chegar aos milhões de brasileiros que nunca investiram em bitcoin ou em qualquer outra criptmoeda.

O grupo está agora relançando sua carteira digital focada em criptomoedas PandaPay com o nome de Coins e tem um objetivo ousado: atingir o coração das massas, a exemplo do que fez a americana Robinhood, uma plataforma de investimentos que popularizou o mercado de ações para os mais jovens.

A partir de 25 de outubro, a Coins vai também deixar de ser apenas uma carteira digital de criptomoedas para ampliar seu escopo e permitir a compra e venda dos ativos digitais, a exemplos do que fazem corretoras, conhecidas também como exchanges, como a brasileira Mercado Bitcoin e a mexicana Bitso.

"Para um investidor que não é do meio e nunca operou criptomoeda, o ambiente de uma exchange pode assustar um pouco", afirma, ao NeoFeed, Marcelo Miranda, CEO da Coins e um dos sócios da Finchain. "Achamos, então, uma forma de simplificar, juntando os dois mundos, da carteira digital e das plataformas."

Não será uma missão fácil, pois as próprias exchanges também já estão de olho nos novatos. No mês passado, em mais um sinal de amadurecimento do mercado, o BTG Pactual se tornou o primeiro banco brasileiro a anunciar uma plataforma de negociação de criptomoedas, a Mynt, prevista para ser lançada no fim do ano. A estratégia é se valer da credibilidade de uma instituição tradicional para chegar aos investidores que ainda estão receosos em investir em criptoativos.

O Mercado Bitcoin, a maior plataforma do País, também tem a sua carteira digital, a Meubank, lançada em 2020 pela 2TM, holding dona das duas empresas. O Zro Bank, criado no ano passado por donos da rede de corretoras de câmbio B&T, também une os serviços de carteira digital e exchange, tendo o Banco Topázio como parceiro para ser a retaguarda das operações que precisam de estrutura bancária.

Marcelo Miranda, CEO da Coins

A própria Finchain tem também a sua plataforma, a FlowBTC, fundada em 2015. A carteira digital, porém, é a nova queridinha da holding e já há planos de incorporar a irmã mais velha. “A Coins é a nossa maior aposta e estamos estudando juntá-la com a FlowBTC, mas ainda não definimos como será a estratégia”, afirma Miranda.

A ideia de fazer a Coins (ex-PandaPay) virar algo maior nasceu da demanda dos antigos clientes.  “Percebemos que o público que usava a carteira queria também investir em criptoativos. Foi aí que veio a Coins”, diz o CEO.

A Coins, por enquanto, tem sete criptomoedas à disposição, como bitcoin e ethereum, e conta com as principais funções de uma carteira digital, como realizar transferências, pagar boletos e usar vouchers em aplicativos como Uber e Spotify. Agora, ao ser também uma plataforma, adicionará mais 13 criptomoedas, chegando a um total de 20.

Com a reformulação de sua carteira digital, a Finchain está de olho em um universo gigantesco de investidores. “Há, no mercado, cerca de 4 milhões de CPFs que já negociaram algum criptoativo, mas estamos vendo o bolo aumentar e achamos que pode ser um número muito maior”, afirma Miranda.

A Coins nasce com 25 mil clientes. Desde que foi criada, no ano passado, como PandaPay, já transacionou cerca de R$ 10 milhões. A meta de Miranda é multiplicar por quatro o número de usuários, chegando a 100 mil em até um ano, e por 10 vezes as transações, movimentando R$ 100 milhões. O aplicativo cobra uma taxa de 1% em cima de cada transação, seja em uma simples transferência ou em uma compra de criptomoedas.

A FlowBTC, que pode se unir à Coins, tem um porte maior. São 100 mil clientes e a corretora já movimentou R$ 100 milhões em 2021. Com a junção das duas plataformas, portanto, o número de clientes pode chegar a 200 mil.

Iniciativas como a da Coins nascem em meio a um mercado que se mostra aquecido. Segundo dados passados pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban) à Associação Brasileira de Criptoeconomia (Abcripto), só em 2021, pelo menos R$ 25 bilhões saíram das instituições bancárias para as plataformas de criptomoedas.

No mundo, estima-se que o mercado de criptomoedas já tenha ultrapassado a marca de US$ 2,1 trilhões, segundo um levantamento da CoinMarketCap.com, citado em um relatório do Bank of America, publicado neste mês.

Por outro lado, os reguladores do mercado financeiro estão cada vez mais atentos e se preparando para apertar o cerco, em uma tentativa de evitar uma bolha. Na quarta-feira, dia 13 de outubro, Jon Cunliffe, diretor do banco central da Inglaterra para a área de estabilidade financeira, alertou para o risco de as criptomoedas desencadearem uma crise financeira global, a exemplo de 2008, caso não sejam devidamente reguladas.

“Quando algo no sistema financeiro está crescendo muito rápido, e crescendo em um espaço amplamente não regulamentado, as autoridades de estabilidade financeira precisam sentar e prestar atenção”, afirmou Cunliffe.

A Coins, contudo, não quer se limitar aos criptoativos. Segundo Miranda, há conversas com corretoras do mercado para incluir ativos tradicionais na plataforma, como fundos de investimentos e ações listadas na Bolsa. Além disso, a carteira digital terá um cartão pré-pago, com bandeira Mastercard, e vai incorporar envios de dinheiro com Pix, o Pix Copia e Cola e o Pix com QR Code. Hoje, a carteira permite apenas o recebimento com Pix.

Todas as operações que exigirem uma estrutura bancária por trás, como transferências e pagamentos, terão o apoio do Banco Genial, por meio de APIs, no chamado “banking as a service”. O Genial, vale ressaltar, não é só um parceiro. A instituição é dona de 18% de participação na Finchain, após um aporte de R$ 2,4 milhões realizado em 2018, o único até então recebido pelo grupo.

A Finchain é também parceira do Grupo Solum no projeto da BEE4, aprovado em setembro deste ano pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que se propõe a ser uma bolsa de negociação de empresas emergentes, numa espécie de “divisão de acesso” para a B3. A plataforma será lançada em março de 2022. A Finchain será provedora de tecnologia blockchain para a plataforma.

Para desenvolver a Coins, a Finchain se inspirou em alguns casos no exterior. Entre eles, está a Revolut, fintech europeia que também trabalha com criptomoedas. Nos Estados Unidos, uma das referências foi a Robinhood, que em setembro anunciou que estava testando uma carteira de criptomoedas.