No final de novembro de 2023, a Eneva apresentou uma proposta de “fusão de iguais” para a Vibra, sob o argumento de que a operação resultaria na criação da maior companhia de combustíveis do Brasil e da terceira maior companhia de energia listada no País, com valor de mercado de R$ 45 bilhões e receita na casa dos R$ 170 bilhões.
A iniciativa, porém, não foi adiante após a recusa da Vibra e depois de uma saraivada de críticas de analistas e investidores. Algumas delas foram centradas na Eneva, com dúvidas que vão desde a sustentabilidade do modelo de negócios até a elevada alavancagem financeira dela, de 4,2 vezes.
Quem se mostrou incomodada com essas críticas foi a Velt Partners, que decidiu sair em defesa da companhia. Em carta divulgada nesta quinta-feira, 11 de janeiro, a gestora, acionista da Eneva há sete anos, com uma posição de cerca de 4,6% no capital da empresa, dedicou 20 páginas para apresentar os méritos da companhia, sem entrar no racional por trás de uma fusão com a Vibra.
Reconhecendo que a companhia foi ganhando complexidade ao longo dos anos, com ampla variedade de ativos e operações, incluindo usinas integradas, usinas com fornecimento de terceiros, parques solares e atividades de comercialização, a Velt aponta que a Eneva possui um modelo de negócios “único e altamente rentável”.
“Ela possui ativos de alto valor estratégico no contexto da transição energética, com vantagens competitivas claras em termos de custo de produção e complementaridade de portfólio, sendo administrados por uma equipe com comprovada capacidade de alocação de capital, gestão regulatória, engenhosidade e excelência operacional”, diz trecho da carta.
Segundo a Velt, as reservas atuais da Eneva possuem mais valor do que os investidores precificam no cenário de despacho térmico baixo, provocado pela alta nos reservatórios. A gestora argumenta que a companhia vem trabalhando em várias frentes para monetizar suas reservas desde 2022.
A carta cita a exportação de energia para a Argentina e a venda de gás para clientes industriais como alternativas. “Ainda que essas novas fontes de monetização não sejam capazes de compensar toda a redução do despacho no curto prazo, elas cobrem aproximadamente dois terços em termos de receita já em 2024”, diz trecho.
A Velt aponta ainda que a Eneva já provou sua capacidade de encontrar e desenvolver novas reservas de gás natural. A gestora aponta que, desde o seu re-IPO, em 2017, com a captação de R$ 835 milhões, a empresa demonstrou capacidade de encontrar novas reservas, saltando de 26% das reservas provadas de gás onshore do Brasil para 38% em 2022.
Ainda na parte operacional, a Velt foi bem direta para dirimir dúvidas sobre a capacidade da Eneva renovar os contratos das térmicas. Para a gestora, essa questão só deveria existir caso se acreditasse “que o Brasil não precisa mais de energia termelétrica para suprir as necessidades de flexibilidade do sistema elétrico”.
“Como sabemos, as termelétricas exercem papel fundamental na segurança e manutenção do sistema, especialmente diante do aumento da intermitência causada pelas fontes de energia renováveis (eólica e solar) e da dinâmica climática substancialmente mais volátil do que o histórico”, diz ela na carta.
A carta da Velt traz ainda uma seção dedicada somente à parte da alavancagem financeira. Ao final do terceiro trimestre, a dívida líquida consolidada era de R$ 16 bilhões, com a relação com Ebitda atingindo 4,2 vezes. No mesmo período de 2022, a dívida somava R$ 5,7 bilhões e alavancagem era de 2,4 vezes.
Apesar da alavancagem alta, a gestora diz que ela não confere risco relevante devido aos termos, prazos e indexadores da sua dívida, além da forte e altamente previsível geração de caixa projetada para os próximos anos.
Segundo ela, a Eneva se beneficia do acesso a linhas de crédito de bancos de fomento como o Banco da Amazônia, Banco do Nordeste e fundos constitucionais. Além disso, boa parte das receitas é de natureza fixa, corrigidas pelo IPCA, e praticamente sem risco de inadimplência.
Ela destaca ainda que a Eneva tem oportunidades adicionais de geração de valor de curto e longo prazos, com expansão dos complexos de Parnaíba (MA) e Azulão (AM) e na Celse (SE). Outra oportunidade é a conexão do complexo Parnaíba via gasoduto a um terminal de gás natural liquefeito (GNL) em São Luís, que dá uma flexibilidade muito maior do uso das suas reservas de gás.
Agora, se todos estes argumentos servirão para ressuscitar a fusão com a Vibra é a grande questão. Desde que a operação foi rejeitada, nenhum outro anúncio oficial foi feito. No final de dezembro, a agência de notícias Bloomberg informou que a Vibra contratou o J.P. Morgan para assessorar a companhia “em potenciais negócios futuros”.
As ações da Eneva fecharam o pregão de hoje com queda de 1,93%, a R$ 12,73. No ano, elas recuam 6,4%, levando o valor de mercado a R$ 20,2 bilhões.
Os papéis da Vibra recuaram 0,93%, a R$ 22,47. Com valor de mercado de R$ 24,9 bilhões, os ativos da companhia acumulam baixa de 1,3% no ano.