As notícias que estão sendo veiculadas no mercado sobre a possível fusão de Eneva e Vibra fazem acreditar que é incontestável que esse é um grande negócio e que “precisa” ser fechado. Há, entretanto, quem veja tudo com um pouco mais de cautela – principalmente os analistas que não estão tão umbilicalmente conectados ao deal.
Diversos deles já se manifestaram, sem o calor e a euforia que está sendo vista, recomendando cautela – principalmente à Vibra. Numa fusão que está sendo classificada como “entre iguais”, o mercado já está precificando uma certa desigualdade, na qual os acionistas da Vibra podem sair perdendo.
As ações da Eneva fecharam o pregão desta segunda-feira, 27 de novembro, com queda de 2,37%, a R$ 12,76. Os papéis da Vibra recuaram 2,74%, a R$ 21,62.
Sob o ponto de vista empresarial e operacional, a avaliação inicial é de que a operação de fusão faz sentido. A proposta resultaria na criação da terceira maior companhia energética do País em valor de mercado, somando quase R$ 45 bilhões.
A percepção é de que a operação, se for em frente, vai criar uma empresa equilibrada, combinando um nome que apresenta receita alta, mas com baixos retornos, que é o caso da Vibra, com outra que tem margens altas e receitas previsíveis, mas muito intensiva em capital e caixa mais baixo, que é a Eneva.
A companhia resultante desta operação teria ainda uma liquidez estimada em R$ 300 milhões ao dia e receita de mais de R$ 170 bilhões em 2024.
Porém, a operação traz “riscos consideráveis para minoritários”, segundo Daniel Cobucci, analista do BB Investimentos. Apesar da fusão proposta ser uma troca de iguais, Cobucci argumenta que a Vibra tem um valor de mercado 23% superior ao da Eneva, considerando o fechamento de sexta-feira, 24 de novembro.
“Em nossos cálculos, isso significa que para manter a proporção atual dos minoritários da Vibra na nova empresa, que tem market cap R$ 4,7 bilhões superior ao da Eneva, deveria haver diferença positiva de R$ 2,01 por cada ação da Vibra, para que fosse mantido um valor de mercado proporcional”, diz trecho do relatório assinado por Cobucci.
A diferença entre os valores de mercado de Eneva e Vibra também foi levantada pelo Goldman Sachs como um fator a ser observado pelos acionistas.
“Sem fazer qualquer consideração das potenciais sinergias da transação, ela implicaria uma diluição de cerca de 10% para os acionistas da Vibra, dada a menor capitalização de mercado da Eneva”, diz trecho do relatório assinado pelos analistas Bruno Amorim, João Frizo e Guilherme Costa Martins.
Vai demorar
Do jeito que foi apresentada, a proposta deve provocar bastante discussão entre os acionistas da Vibra, forçando o prolongamento do prazo de 15 dias da proposta da Eneva.
“A operação tem que fazer sentido em termos econômicos, inclusive para a Dynamo, porque ela também é acionista”, disse uma fonte ouvida pelo NeoFeed. “O mérito operacional é forte, acho que ninguém vai jogar fora, mas tem que fazer caber. Não é algo para 15 dias.”
A equipe de research do Citi apontou ainda para a questão dos proventos na Vibra, que podem deixar de serem pagos após a fusão com a Eneva. Em setembro, o conselho de administração aprovou a distribuição de remuneração antecipada aos acionistas, sob a forma de juros sobre o capital próprio (JCP), no montante bruto de R$ 478,4 milhões.
“Muitos acionistas da Vibra parecem satisfeitos em aguardar para que os dividendos da empresa cresçam”, diz trecho do relatório assinado pelos analistas Antonio Junqueira, Gabriel Barra, Guilherme Bosso e Andrés Cardona. “Uma eventual fusão com a Eneva significaria trocar o conforto dos dividendos de curto prazo pelas oportunidades (e riscos) de alocação de capital.”
Além da relação de troca, os analistas destacaram como ponto de atenção a Eneva ter uma alavancagem financeira elevada, de 4,2 vezes, enquanto a relação entre dívida líquida e Ebitda da Vibra ser de 1,9 vez.
Outro ponto levantado pelo analista do BB Investimentos é a perspectiva de adição de novas capacidades no mercado de gás natural nos próximos anos, dados os projetos em implantação pela Petrobras.
Segundo Cobucci, a oferta adicional pode reduzir os custos do mercado de gás e afetar a competitividade dos projetos da Eneva.