A região de Campos Elíseos, no centro de São Paulo, viu nesta semana um dos vários prédios abandonados da região ganhar sobrevida. O edifício RBS 700, erguido na década de 1950 e que chegou a ser a sede da SulAmérica, passou por uma ampla reforma ao longo de 18 meses para abrigar 60 apartamentos, que serão colocados para alugar.
A revitalização do prédio de 70 anos representa um dos primeiros resultados da Jive Investments em retrofit, processo de engenharia que visa a recuperar prédios antigos ou fora da norma. Adotada há quase dois anos, a iniciativa está em linha com o que a gestora, que tem mais R$ 8,5 bilhões em ativos sob gestão, é mais conhecida no mercado: pegar ativos ilíquidos e com diversos problemas, recuperá-los para depois recolocar no mercado.
“A nossa tese de retrofit prioriza a compra de um prédio comercial, para transformá-lo em residencial e depois colocar para locação de longa e curta duração”, diz João Oliveira, sócio da Jive responsável pela área de real estate ao NeoFeed.
Os primeiros moradores do novo RBS 700 começaram a chegar nesta semana e dificilmente diriam que lá era um prédio comercial. Eles vão encontrar um edifício recém-acabado e totalmente equipado, contando desde eletrodomésticos e talheres até jogo de cama.
O edifício conta também com uma lavanderia comunitária, bicicletário e um espaço para dar banho em cachorros no subsolo. Na cobertura, um solarium e um salão de festas com churrasqueira que pode ser alugado.
O retrofit é uma grande aposta da área de real estate da Jive, montada em 2019. A tese começou a ser colocada em prática entre o final de 2020 e início de 2021, utilizando uma parcela dos R$ 4 bilhões que a Jive captou em recursos para o fundo 3, em outubro de 2020. Quase R$ 1,5 bilhão foram destinados para todos os projetos de real estate.
Além de prédios para serem restaurados, a divisão imobiliária investe em terrenos e galpões que apresentam dificuldades jurídicas, estoques de incorporadoras, obras paralisadas por falta de recursos e os chamados BNDU, imóveis de empresas que foram tomados pelos bancos de empresas que não pagaram dívidas.
No total, a divisão de real estate da Jive possui 1,2 mil imóveis no portfólio, localizados em 65 cidades de 17 estados, além de cinco imóveis nos Estados Unidos.
No caso do retrofit, a Jive dá preferência por empreendimentos que possam ser transformados em edifícios de cunho residencial, por serem mais rápidos de locar. Ela designou a anyLife, startup de gestão de apartamentos para aluguel de temporadas em quem investiu no começo de julho, para cuidar da locação e administração da maior parte desses prédios.
O processo de encontrar e selecionar os edifícios que passarão pela revitalização é praticamente o mesmo que a maioria das pessoas adota na hora de encontrar imóveis, o bom e velho gasto de sola de sapato. “Vamos andando nas ruas, entendendo quais imóveis têm potencial de transformação, além de ter conversas com corretores, intermediários e as comunidades das regiões”, diz Oliveira.
Depois de levantados os empreendimentos potenciais, chega a hora de fazer contas: desde quanto custará a reforma até o prazo que vai demorar para ele trazer o retorno esperado.
“O primeiro critério para a escolha é a localização da região que o prédio está inserido, se ela tem potencial de valorização. Depois vem o estado de imóvel, se é possível fazer um retrofit, o impacto que ele vai gerar no bairro e se é possível ter retorno para os nossos investidores cobrindo tudo isso”, afirma Oliveira.
O RBS 700 foi um dos primeiros imóveis comprados para passar por retrofit e o primeiro entregue na capital paulista. A Jive entregou neste ano um projeto em Salvador, que permaneceu sendo comercial, e outro no bairro do Queens, em Nova York.
Considerado os empreendimentos prontos, ela tem um total de 11 projetos em que está implementando a tese de transformação de uso e revitalização, a maioria deles localizados em São Paulo.
A ideia é que os edifícios sejam vendidos por inteiro para fundos de investimentos ou investidores que buscam renda com imóveis. A expectativa é de que esses projetos entreguem retornos líquidos na casa dos 20% ao ano, em linha com o que os fundos da Jive buscam entregar aos cotistas, considerando todos os investimentos da casa.
O investimento da Jive em retrofit ocorre num momento em que esse tipo de obras começa a avançar pelo Brasil, ainda que a passos lentos.
No Rio de Janeiro, o centenário Hotel Glória, que chegou a ser detido por Eike Batista com a promessa de ser reformado até a Copa do Mundo de 2014, está passando por retrofit. O projeto, tocado pela SIG Engenharia e o fundo imobiliário Opportunity, prevê 266 apartamentos residenciais no edifício, com a obra prevista para terminar em 2026.
Um fator que deve impulsionar o retrofit pelo País é a sanção da Lei Federal 14.405, em julho deste ano, que permite alterar a destinação de um edifício pelo voto de dois terços dos condôminos. Antes, o Código Civil exigia aprovação unânime para esse tipo de modificação.
Além disso, muitas prefeituras têm aprovado projetos para requalificar porções deterioradas da cidade. Em 14 de setembro, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, sancionou Projeto de Lei PIU Setor Central, com incentivos fiscais para investimentos na região central do município.
Em Vitória, no Espírito Santo, a administração local estuda conceder isenção de impostos para quem realizar retrofits no centro da cidade.
Essas mudanças são fatores que devem incentivar a Jive a continuar investindo em retrofit. Oliveira conta que a burocracia foi um fator que teve que superar, além das questões técnicas envolvidas numa obra como essa. Mas que, agora, passado o período de experiência, a perspectiva é de o retrofit ganhar tração na Jive.