Não é segredo para ninguém que Rubens Menin, controlador da construtora MRV, do Banco Inter, da empresa de galpões Log e da rede de televisão CNN, além de ter uma vinícola em Portugal, é um apaixonado pelo Atlético, o seu time de coração.

Mas também não é nenhum mistério que Menin, como empresário, não entra em um negócio se o objetivo não for valorizar aquele ativo. É o caso da SAF (Sociedade Anônima do Futebol), modalidade que transforma os times de futebol em empresas.

Em entrevista exclusiva ao NeoFeed, Rubens Menin fala pela primeira vez dos detalhes da SAF do Galo e quais os planos daqui para frente. E avisa que entrou nesse negócio não só pela paixão que tem pelo Atlético.

“Paixão tem mesmo. Não tenho como negar. Mas na hora que estamos no negócio, temos a obrigação de valorizar. Inclusive para o próprio Atlético, que é sócio da franquia”, diz Menin.

Menin é um dos empresários por trás da Galo Holding, que tem como principais investidores o grupo chamado de 4Rs (Rubens e Rafael Menin, Ricardo Guimarães e Renato Salvador), e que ficou com 75% do Galo. Os outros 25% da SAF seguem com a associação.

Na Galo Holding, os 4Rs deterão 78% da empresa. O restante é dividido em 11% para um fundo de investimento privado e 11% para a FIGA, um fundo de investimento que irá alocar a participação de torcedores do Galo. A aprovação foi feita pelo Conselho do Atlético, na semana passada, que conseguiu o quórum necessário em apenas três minutos.

O empresário mineiro resolveu entrar nesse negócio ao avaliar que o futebol faz parte da indústria de entretenimento, que tem uma das maiores audiências do mundo. Portanto, é capaz de gerar muito dinheiro.

Além disso, Menin observou transações que aconteceram em outras áreas. Em especial na NFL, a liga profissional de futebol americano, e NBA, a liga profissional de basquete dos Estados Unidos. Só um exemplo: o ex-jogador Michael Jordan viu seu investimento no Charlotte Hornets se multiplicar por 10 – apesar do fracasso nas quadras do time de basquete.

Para Menin, no entanto, se não houver sucesso dentro de campo, não há como valorizar a franquia do Galo. Mas uma coisa ele não abre mão: uma gestão profissional, seguindo o exemplo do que viu no Manchester City, time que visitou recentemente e o deixou impressionado com a organização.

Sobre as dívidas de R$ 1,8 bilhão, que serão todas repassadas para a SAF do Galo, a ideia é quitar os empréstimos bancários, algo que será feito com o aporte de R$ 913 milhões – deste total, R$ 600 milhões vão entrar no caixa do Atlético e R$ 313 milhões serão para pagar Rubens e Rafael Menin, bem como Ricardo Guimarães.

A dívida restante, de acordo com Menin, está praticamente toda renegociada e envolve a Arena MRV (via certificados de depósitos imobiliários), Profut (Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro) e jogadores e agentes de futebol.

“O nosso plano de negócio é zerar a dívida ruim rapidamente [dívida bancária] e a outra vamos amortizando até 2026 e 2027, quando ela deve acabar”, afirma Menin.

Nesta entrevista, que você lê a seguir, Menin fala de como pretende gerar receitas para o Atlético e do que pensa da formação de uma liga de futebol, além de explicar por que o Atlético está fechado com a Libra, um dos blocos comerciais que estão sendo formados no Brasil. Confira:

Todo mundo sabe que você é um torcedor ferrenho do Atlético Mineiro. Você está fazendo isso pela paixão ou pelo negócio, que vai valorizar e gerar dinheiro?
São os dois casos. Sempre gostei de futebol. Posso falar isso porque estamos (as empresas de Menin) no marketing esportivo como uma ferramenta de negócios há muitos anos. Então, sabemos a força do futebol. Paixão tem mesmo. Não tenho como negar. Mas na hora que estamos no negócio, temos a obrigação de valorizar. Inclusive para o próprio Atlético, que é sócio da franquia. E o Atlético só vai ficar muito forte se a franquia valorizar. Então, o objetivo maior é, primeiro, ganhar títulos. E depois valorizar a franquia. Sou sócio da MRV, tenho de valorizar a MRV. Sou sócio do Banco Inter, tenho de valorizar o Banco Inter. Sou sócio do Atlético, tenho de valorizar o Atlético.

Qual vai ser a fórmula, então, para valorizar o Atlético?
Toda empresa precisa ter uma gestão de altíssima qualidade. Para uma gestão de alta qualidade, é preciso de profissionais de alta qualidade. Enxergo que o futebol antigo é aquele futebol, vou chamar assim, de cartolas das despesas. Hoje, não. Sabe o que me impressionou? Passei dois dias em Manchester (na Inglaterra), olhando o Manchester City, que é o atual campeão da Champions League, que é, pra mim, a franquia de maior sucesso do mundo hoje. Olhei todos os detalhes da gestão do Manchetes City. É uma coisa impressionante. Nós não vamos conseguir chegar lá agora, mas um dia vamos chegar lá.

Com o que você ficou impressionado?
Com tudo. Desde a aprovação dos jogadores, da técnica para a preparação física, da tecnologia de gestão até os detalhes da parte financeira. É uma coisa perfeita. O futebol está longe disso no Brasil. As empresas (times) no Brasil são amadoras. Então, se a gente conseguir juntar a alta qualidade tanto no futebol, quanto na gestão, vamos conseguir ter mais chances. Os clubes que estão se sobressaindo no Brasil são aqueles que melhoraram a gestão. Existe hoje um espaço enorme para melhorar a gestão. E, com isso, atingir os nossos objetivos. Precisa ter fluxo de gasto organizado e um negócio organizado. Qual o nosso negócio? O nosso negócio é futebol.  Sabemos onde queremos chegar. As palavras são pessoas e gestão.

O que vai mudar na gestão do Galo agora com a SAF?
Na hora que você vira empresa tem uma palavra que eu gosto muito: accountability. É a responsabilidade das pessoas. Cada profissional tem uma meta. E aquela meta tem de ser entregue. O preparador físico terá uma meta. O comercial terá uma meta. O financeiro terá uma meta. E o técnico terá uma meta. É uma gestão por resultados. É exatamente o que o Manchester City faz. No futebol, você precisa ter resultados dentro do campo e resultados fora do campo. As duas coisas se combinam. Os resultados dentro do campo são as vitórias. Os resultados fora do campo são a operação com a torcida, a venda de direitos e parcerias para oferecer investimentos.

"Cada profissional tem uma meta. E aquela meta tem de ser entregue. O financeiro terá uma meta. E o técnico terá uma meta. É uma gestão por resultados"

O plano da SAF é manter o atual CEO do Galo?
Nós temos um modelo de dois co-CEOs. O CEO do futebol vai ser o atual presidente do Atlético, o Sergio Coelho, e o CEO da infraestrutura vai ser o Bruno Muzzi. Na MRV tem também dois CEOs, em que um complementa o outro.

A SAF está assumindo a dívida de R$ 1,8 bilhão do Atlético, que é uma das maiores dos clubes brasileiros. Como vocês vão resolver essa questão?
O orçamento do Atlético hoje é de R$ 500 milhões. E ele consome mais de R$ 100 milhões por ano para pagamento de juros. Se não fosse os juros, o Atlético seria superavitário. Mas quando você olha a dívida, tem de dividir em alguns tipos de dívida. Tem a dívida muito ruim que são as bancárias. Essa, de aproximadamente, R$ 900 milhões, estão totalmente equacionadas, que é exatamente o aporte que nós vamos fazer.

E as outras?
Você tem a dívida de jogadores e agentes, que é um pouco menos R$ 300 milhões. Essa dívida vai ser escalonada ao longo do tempo e ela cabe no orçamento com muita tranquilidade. Depois você tem o Profut, que é uma dívida fiscal. Essa é a que eu chamo de uma dívida boa. É de longo prazo, que vários clubes têm. E você paga com muita tranquilidade. Ela é de mais ou menos R$ 300 milhões. O restante da dívida vem da arena (a Arena MRV, que vai ser inaugurada em agosto), que é de R$ 400 milhões. E essa você paga de duas formas. Uma é venda de propriedade, pois ainda tem propriedade para gerar renda. E a outra é a própria receita da Arena, que será superavitária. O mais importante: R$ 900 milhões, que é dívida ruim, nós vamos tirar do Atlético.

O aporte que vocês estão fazendo é para pagar dívidas?
Esse aporte de R$ 900 milhões tira toda a dívida ruim do Atlético, que tem alto custo financeiro.

Qual é, então, a dívida boa?
A dívida da Arena MRV, a do Profut e a dívida com jogadores e agentes. Essa já está praticamente toda renegociada.

E, com isso, o Atlético vai ficar com uma dívida de quanto?
O nosso plano de negócio é zerar a dívida ruim rapidamente e a outra vamos amortizando até 2026 e 2027, quando ela deve acabar.

E no ano que vem vai ter Ebitda positivo?
No ano que vem, o plano é ter um Ebitda mais próximo do resultado operacional.

A torcida de qualquer clube, em geral, pressiona por investimentos no futebol e por contratação de jogadores. Como serão os investimentos nessa área?
Sabemos que temos de ter um orçamento para o futebol. Porque para valorizar uma franquia, você tem de ter resultado. A primeira coisa que fizemos foi preservar no business plan um orçamento do futebol que deixe o Atlético competitivo nas disputas. E dentro desse orçamento, você tem a parte operacional e os investimentos. E esse orçamento é crescente nos próximos cinco anos. Ele vai aumentando todos os anos daqui para frente. À medida que você vai pagando a dívida, vai sobrando mais dinheiro para o futebol.

E qual é o orçamento do futebol?
Isso ainda não posso falar. Tem muita coisa que não foi passada para o conselho ainda. E vamos passar tudo isso. Mas posso garantir que ele vai ser do padrão atual para cima nos próximos anos.

A SAF fica também dona da Arena MRV?
A SAF é dona do centro de treinamento, da arena e do time de futebol.

"Acreditamos que a arena vai ter uma receita de R$ 120 milhões por ano a partir do ano que vem"

Como vocês vão fazer para rentabilizar a Arena MRV: além do futebol, vai ter shows e eventos?
A arena é um empreendimento. Ela é para o futebol, vai aumentar a receita do futebol e é fundamental para a competitividade do time. Ela vai ser um caldeirão, do bem, é claro, e vai ter uma acústica sensacional. E vai ter também conforto, diversos restaurantes e shows, como nos Estados Unidos. E vamos ter parcerias com empresas. Mas a arena também foi pensada para shows e já temos shows contratados. Então, acreditamos que a receita da arena vai ser complementar e vai ser muito relevante ao nosso business.

De que ordem?
Acreditamos que a arena vai ter uma receita de R$ 120 milhões por ano a partir do ano que vem.

Uma fonte importante de receita para o futebol brasileiro são os acordos comerciais com a Libra ou a LFF. Qual a sua opinião sobre a formação de uma liga no futebol brasileiro?
Estamos com a Libra. Acreditamos que a liga é um dos componentes que vai mudar o futebol brasileiro. O ideal é que fosse uma liga única. Tomará que essas duas ligas se acertem no futuro.

Por que o Atlético optou pela Libra?
Por várias razões. Dentre elas, a mais importante, é que dentro da Libra você tem mais de 75% da torcida brasileira, como Flamengo, São Paulo, Corinthians, Palmeiras, Atlético e Grêmio. Isso é importante porque vai ter mais dinheiro rodando. E esse é mais um componente que vai ajudar a colocar o futebol brasileiro em outro patamar.

Mas a Libra não é uma liga. Neste momento é mais um acordo comercial para negociar direitos de transmissão, não?
A liga é o final de tudo. Hoje, o campeonato é feito pela CBF. Mas a CBF concordou que, no futuro, vai ser feito pelas ligas. Hoje, são duas. Elas precisam sentar e conversar. Nós sabemos que, a partir de 2025, nós vamos ter de fazer um campeonato. Ainda são blocos comerciais, mas acredito muito que no fim da linha eles vão se unir.

"O Galo tem 10 milhões de torcedores. Não existe unanimidade em 10 milhões. O Conselho (do Atlético) fez a votação (da SAF) e foi o maior índice de aprovação de todos os tempos"

Uma parte da torcida do Galo está criticando a SAF, dizendo que não houve transparência nesse processo. O que você tem a dizer para esses torcedores?
O Galo tem 10 milhões de torcedores. Não existe unanimidade em 10 milhões. O Conselho (do Atlético) fez a votação (da SAF) e foi o maior índice de aprovação de todos os tempos. Tivemos apenas quatro votos contra (a SAF). Se não tivesse transparência, não teria isso. O Conselho validou a transparência. É um grupo pequeno que está falando que não tem transparência.

E o que você tem a dizer para a torcida do Galo a partir de agora com a SAF?
O que eu posso dizer é que o bem do Atlético é o bem da SAF. E o bem da SAF é o bem do Atlético. Queremos transformar o Atlético em uma potência do futebol.