Francisco abriu a página do LinkedIn. Procurou por Jojo, sobre quem tinha grandes referências. Achou. Conectou. Sugeriu encontro para propor um deal. A conversa evoluiu, seguiu para o e-mail. Marcaram reunião. E outra. E mais uma.
Na tarde do último 24 de dezembro, véspera de Natal, menos de um mês depois da conexão no LinkedIn, os dois assinaram os documentos, apertaram as mãos e fecharam o acordo: Jojo comprou a ideia e o passe de Francisco e sua equipe.
Foi assim que Francisco José Levy, ex-UBS, fundador da gestora Allea, e seus sócios, Ricardo Albiero e Renato Pádua, além de três analistas, entraram para o time da Vitreo Wealth Management, pertencente ao BTG, liderada por George “Jojo” Wachsmann - um acordo que está sendo anunciado agora, com exclusividade ao NeoFeed.
O acordo natalino começou a tomar forma, na prática, em meados de janeiro. Até se poderia chamar a transação de um acqui-hiring (neologismo para definir um processo de aquisição com o objetivo de recrutar pessoas, “comprar” inteligência), não fosse um polpudo detalhe: ela também colocou na prateleira da Vitreo os R$ 500 milhões sob custódia da área de familly office da Allea.
Em resumo, uma compra de ativos da Allea sem a Allea – que, aliás, parou de prestar serviço. Os sócios já a descredenciaram da CVM. “O curioso é que a primeira conversa, logo após a nossa troca de mensagens no LinkedIn e no e-mail, não foi sobre os clientes de wealth, da familly office, mas sim sobre os clientes menores de nossa área de private”, conta Francisco Levy.
“Apesar de todos os esforços e recursos alocados em treinamento de pessoas e na criação de processos para dar escala, não estávamos conseguindo fazer o segmento crescer”. O plano era entregar a tarefa para alguém, “monetizar” o que não se monetizava e tentar recolocar as pessoas do Private no mercado. Só que a conversa tomou outro rumo, o das possíveis sinergias entre os dois negócios.
De um lado estava uma butique conhecida por sua capacidade de organização e desenvolvimento de processos, com clientes muito grandes, mas travada em crescimento. Do outro, uma casa fundada há pouco mais de um ano, com uma evolução rápida – a Vitreo Wealth fechou sua primeira temporada com R$ 1,1 bilhão sob gestão -, mas preocupada justamente com a organização desse crescimento.
A meta para este ano, por exemplo, é atingir os R$ 2,6 bilhões em carteira, sem perder o espírito de butique. Mais que isso: havia, naquele momento, uma vaga de estrategista-chefe na Vitreo, função que Francisco Levy conhece como poucos - desde os tempos em que foi líder estratégico do Itaú Private Bank ou head de investimentos, produtos e serviços de wealth management do UBS.
Tudo bem medido e bem pesado, o escopo da conversa aumentou: já não era mais sobre uma solução isolada para o private alheio, virou o discurso do “venham todos para cá e tragam a carteira”.
Os clientes do familly office da Allea, com seu tíquete médio de R$ 100 milhões, já aceitaram a migração – o que vai acabar elevando o tíquete médio da Vitreo, hoje em R$ 17 milhões. Para os antigos clientes do private, com patrimônio de R$ 1 milhão a R$ 5 milhões, a ideia é encaixá-los na DTVM da Vitreo.
“Levando-se em conta a média de crescimento no ano passado, nós atingiríamos, sozinhos, esse meio bilhão de reais até junho”, diz Felipe Monteiro, head de Wealth Management da Vitreo. “A questão principal do acordo, portanto, não era a captação, mas sim a chegada de Levy e dos sócios, para nos ajudar a preservar os diferenciais da Vitreo num cenário de rápida evolução.”
Monteiro conta que a entrada do BTG no negócio – o banco comprou no ano passado a Universa, holding que reúne a casa de análise Empiricus e a Vitreo – não mudou em nada a forma de atuação da gestora.
As únicas alterações foram a saída dos sócios Paulo Lemann, Patrick O´Grady, Alexandre Aoude, Ilana Bobrow, Guilherme Cooke e o endereço. Monteiro e companhia migram neste mês para o prédio da Faria Lima, sede do BTG. Hoje, a área de wealth management representa 12% da Vitreo.
Rouba monte
Os serviços de consultoria a clientes de alto patrimônio, incluindo os segmentos private banking e wealth management, giram cerca de R$ 1,7 trilhão no Brasil. É um segmento que vinha crescendo, em média, dois dígitos ao ano até o biênio 2020/21.
No ano passado, desacelerou: um avanço de 7,2%, mesmo com um primeiro semestre com eventos de liquidez importantes, como boom de IPOs, fusões e aquisições, que costumam ser geradores de potenciais clientes.
“Quando o crescimento do setor de wealth diminui, com menos dinheiro rodando no mercado, você começa a entrar no jogo de ‘rouba monte’, de pegar clientes de outras instituições”, diz Monteiro. “Não sei se será o caso de 2022, mas foi o que aconteceu em boa parte do ano passado. Não nos assusta. Ao contrário, é oportunidade para a gente.”
Para um monte de gente, diga-se. Trata-se de um mercado que viu, na última década, grandes grupos estrangeiros focados na gestão de fortunas invadirem o país – casos de Julius Baer em sociedade com GPS e Reliance ou de UBS e Consenso.
Também viu, mais recentemente, a XP usar sua força para gerir grandes fortunas. A empresa lançou, em 2020, seu Wealth Management e alcançou, desde então, um volume próximo de R$ 40 bilhões sob custódia.
Há ainda um movimento de grandes ex-executivos de Private Banking abrindo suas próprias butiques, operando quase como agentes autônomos. Ou seja, tem mercado, tecnologia e “diferencial” para todos os bolsos. Monteiro e Francisco Levy terão de se organizar muito bem para enfrentar a competição. Com rouba monte ou não.