O cenário econômico desafiador, provocado pela taxa de juros a 15% ao ano imposta pelo Comitê de Política Monetária (Copom), está entre as principais preocupações no horizonte da Lojas Renner, que na manhã de terça-feira, 1º de julho, celebrou 20 anos de entrada no Novo Mercado da antiga Bovespa (atual B3).
“Com a Selic nesse patamar, temos um desafio enorme. Precisamos cuidar do caixa, e administrar focando o binômio ousadia e conservadorismo. Obviamente que esse desafio da Selic não nos agrada, torna nossa atividade mais complexa, mas não adianta reclamar”, diz Carlos Souto, presidente do Conselho da Renner, ao responder pergunta do NeoFeed, em entrevista concedida após o evento.
O CEO da companhia, Fabio Faccio, também reclamou da taxa Selic, mas lembrou que o fato de empresa hoje trabalhar sem dívidas ameniza os impactos da elevação dos juros.
“Temos investido muito para navegar bem em qualquer tipo de cenário. Conseguimos ajustar nossos estoques e nossas coleções, mas conseguimos eliminar a pressão do custo por não ter dívida. O fato é que precisamos ser ágeis para qualquer outro cenário.”
Na avaliação dele, a decisão do Banco Central é uma espécie de um “remédio difícil” para o País. “Não ajuda nenhuma empresa, principalmente o varejo. Uma taxa muito alta traz custos financeiros maiores. Ainda que para gente seja menos impactante, não é bom esse cenário.”
Segundo o presidente-executivo, em um cenário em que os juros tenham atingido seu platô e agora comecem a trilhar o caminho de queda, como já foi apontado pelo Banco Central, a perspectiva é de, inclusive, ampliação dos investimentos previstos para este ano.
“Vejo projeções e espero que a gente possa ver essa redução nos próximos meses. Para isso, preparamos a empresa para navegar com esse patamar. Se as taxas melhoram, talvez os planos possam ser até melhores do que temos hoje”, diz Faccio.
Ainda assim, o executivo entende que, na ponta final, essa elevação da Selic ainda não tem afetado as vendas do setor do vestuário. “Precisamos lembrar que o nosso segmento tem um ticket médio baixo, e um prazo de financiamento curto. Isso impacta mais os segmentos como prazos maiores.”
No plano da companhia, os aportes devem chegar a R$ 850 milhões em 2025, divididos nas áreas de tecnologia e inovação, expansão orgânica e ganho de eficiência nas mesmas lojas.
Taxa das blusinhas
O chairman da Renner afirma que a varejista também tem atuado para entender a presença no mercado brasileiro de sites como Shein e Temu, que têm aumentado participação entre os consumidores, principalmente no e-commerce, mesmo com a implementação da ‘taxa das blusinhas’ por parte do governo federal.
“Estamos atentos aos movimentos dessas plataformas gigantes, que têm grande capacidade de investimento e de mudança de mercado. O que temos de fazer é sofisticar nossos processos para que nossos clientes tenham interesse pelas nossas coleções, e ainda oferecer preços competitivos”, diz ele.
“Embora esse cenário seja indesejável e desagradável, isso não faz com que a gente perca nossa capacidade de entrega”, complementa o chairman.
Para Souto, a comparação entre os momentos econômicos de 2005 e 2025 - nos dois períodos sob a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva - mostra a resiliência da companhia em tentar transitar, sem muitos solavancos, pelas turbulências provocadas pelo cenário macroeconômico atual.
“O que nós vivemos é uma continuidade desses desafios, e temos que estar preparados, principalmente pelo nosso setor ser tão competitivo. Mesmo com as diferenças históricas nesses 20 anos, aprendemos a lidar com essas situações”, afirma Souto.
Oportunidades de expansão
O CEO explicou que o próximo passo está em ampliar as oportunidades de presença física da Youcom, rede de varejo de moda voltada ao público jovem, e criada há 12 anos.
“Como ela tem menos presença do que a Renner no Brasil, vamos avançar com a Youcom em grandes centros e cidades médias, principalmente em shoppings onde ainda não estamos. Há mais oportunidades de aberturas de lojas.”
Atualmente, a companhia tem 687 unidades no Brasil, Argentina e Uruguai. São 431 da Renner, 135 da Youcom, 102 da Camicado e 19 da Ashua. A perspectiva é de, ainda em 2025, abrir entre 15 e 20 lojas da Renner, entre 10 e 15 da Youcom e uma ou duas da Camicado.
No primeiro trimestre de 2025, a Renner registrou receita líquida de R$ 2,75 bilhões, alta de 12% sobre o mesmo período do ano anterior. O lucro líquido foi de R$ 221 milhões, 58,7% acima do reportado nos três primeiros meses de 2024.
Com posição de caixa de R$ 1,7 bilhão, a companhia registrou queda no endividamento bruto, reduzindo de R$ 945,5 milhões, em dezembro de 2024, para R$ 424,4 milhões em março.
20 anos de bolsa de valores
Criada em 1965, a Renner abriu o capital em 1967 na Bolsa de Valores do Extremo Sul, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul (extinta em 2002 e transformada em escritório regional da antiga Bovespa). Em 1998, a rede americana JC Penney assume a companhia.
Em 2005, a então dona da Renner deixa o controle acionário e coloca à venda todas as ações da empresa, transformando a companhia na 1ª corporação brasileira (sem um controlador definido ou um acionista de referência) no Novo Mercado da Bolsa.
Os principais acionistas são a BlackRock, com 14,75% de participação, seguida pela americana Arga Investment Management, com 5,18%, e Schroder Investment Management Brasil, com 5,02%. Hoje, 94,87% das ações estão em circulação no mercado.
No acumulado de 2025, as ações da Lojas Renner na B3 registram valorização de 62,4%. A companhia está avaliada em R$ 20,7 bilhões.