Belém – Um dos campos mais promissores na busca por um futuro mais sustentável e resiliente às mudanças climáticas é o das soluções baseadas na natureza (SbN). Lançado em 2009, em um relatório da International Union for Conservation of Nature (IUCN), o conceito designa as iniciativas inspiradas em sistemas naturais para resolver os desafios impostos por um planeta sob crescente pressão ecológica, social e econômica. Pela nova lógica, o dinheiro segue a natureza — e não o contrário, como sempre aconteceu.

A urgência desta virada de chave foi um dos temas, na manhã de quinta-feira, 13 de novembro, na abertura do World Climate Summit & The Investment COP 2025, em Belém. Realizado em paralelo à 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, o evento reúne investidores, empresários, líderes governamentais e representantes da sociedade civil para discussões sobre como transformar compromisso em ação.

“No ano passado, foram investidos pouco mais de US$ 2 trilhões na transição climática”, disse Marina Cançado, fundadora da Converge Capital, co-organizadora do encontro. “E, se analisarmos mais a fundo, 60% dos investimentos vão para energia e transporte, quando precisamos que o dinheiro flua para soluções baseadas na natureza.”

Do total de aportes globais, apenas US$ 100 bilhões vieram para a América Latina, lembrou a empreendedora. A maior parte do dinheiro vem para o Brasil, O.K., mas é muito, muito pouco para um país considerado o “Vale do Silício das soluções baseadas na natureza”, como definiu o britânico Tony Land, cofundador da Capital for Climate.

“Nenhum outro país tem tanta capacidade física de restaurar florestas e absorver carbono quanto o Brasil”, afirmou. “Pesquisas indicam que o Brasil pode capturar entre 1,2 e 1,7 gigatoneladas de CO² ao ampliar as soluções baseadas na natureza.” E isso é muita, muita coisa — o equivalente às emissões anuais de Estados Unidos e União Europeia juntas.

Nas contas do PNUMA, o programa da ONU para o Meio Ambiente, para que as SbN atinjam toda a sua potencialidade seriam necessários US$ 11 trilhões em investimentos entre 2022 e 2050 — dito de outra forma, são US$ 500 bilhões anuais até 2050 contra os atuais US$ 200 bilhões. “Isso significa que o investimento em SbN precisa ser ampliado rápida e drasticamente”, lê-se no relatório da entidade.

No painel sobre SbN, Jack Howard, chefe da Agenda de Sistemas Mundiais do Fórum Econômico Mundial, explicou os elementos imprescindíveis para a adoção em escala das inovações inspiradas na natureza. “Tudo começa com um ambiente político previsível, transparente e eficaz. Precisamos de práticas empresariais sólidas, especialmente no setor de carbono, com créditos de alta integridade. E a filantropia tem um papel essencial como capital catalisador, preparando o terreno para o investimento privado.”

E, no Brasil, conforme estudos realizados nos últimos anos, se não falta potencial, falta alinhar governança, financiamento e métricas de impacto para transformar as SbN, de fato, em eixo estratégico de desenvolvimento sustentável.

Como Leonardo Fleck, diretor de Sustentabilidade do Santander, lembrou que “o perfeito é inimigo do bom”. “Não temos o luxo do tempo. Precisamos agir, aprender e ajustar enquanto avançamos.”

O executivo trabalhou com Gordon Moore (1929-2023), cofundador da Intel, e não esquece os aprendizados sobre inovação rápida, segundo o qual “se você não está falhando, você não está inovando o suficiente”.

Fleck foi taxativo na importância da união das grandes companhias rumo à economia de baixo carbono. Em novembro de 2022, Santander, Itaú Unibanco, Marfrig, Rabobank, Suzano e Vale se juntaram e fundaram a Biomas, empresa de restauração ecológica.  “Ela é um sinal poderoso de que o setor privado está pronto para agir”, disse.

O alemão Lawrence Leuschner, fundador e CEO da Capacity Foundation, incluiu um personagem chave na equação: os povos originários.

A organização liderada por Leuschner é responsável pelo projeto Classic 60, responsável pela proteção de mais de 8 milhões de hectares na Amazônia, em parceria com seis comunidades indígenas. Sem apoio às comunidades locais, ele disse, “nunca ampliaremos as soluções baseadas na natureza”.

“Sou investidor em tecnologia climática há 25 anos, mas conhecer o cacique Laoni mudou minha vida”, contou. “Percebi que a Amazônia só pode ser salva se protegermos as terras indígenas. Sem as pessoas que vivem no terreno, não há como evitar o ponto de inflexão que transformará a floresta em savana.”

A fundação utiliza inteligência artificial e monitoramento por satélite em tempo real para detectar invasões ilegais e emitir alertas às comunidades. “Estamos reunindo os melhores empreendedores e tecnólogos para enfrentar um problema planetário. Nosso objetivo é proteger todos os 280 milhões de hectares da Amazônia Legal.”

Na opinião de Kirsten Dunlop, CEO da organização holandesa Climate KIC, para atrair capital em escala, o mercado precisa redefinir suas métricas de valor. É a velha história: recuperar natureza degradada demanda tempo.

“As práticas regenerativas ainda não são compreendidas em termos de custo e benefício de longo prazo”, observou. “O custo imediato é visível, mas os ganhos sistêmicos — como estabilidade climática, segurança hídrica e prosperidade local — ainda não entram nas contas.”

E ela sugeriu aos investidores que incorporem uma “visão holística e integrada” do risco e do retorno. “Investir na Amazônia não é apenas proteger uma floresta, mas garantir a estabilidade econômica de todo o planeta. Precisamos tratar a gestão da paisagem como uma nova classe de ativos, que inclui a restauração e os meios de subsistência das comunidades locais.” No fim, todos nós ganhamos.

A jornalista viajou a convite da Motiva, idealizadora da Coalizão pela Descarbonização dos Transportes