Quando deixou o Bank of America, onde fez uma longa carreira como analista do sell side, Sara Delfim acreditava que o Brasil iria passar por uma grande transformação, que criaria uma oportunidade para quem fosse investir na bolsa.

Em maio de 2018, o primeiro fundo da Dahlia Capital, gestora que ela fundou com Felipe Hirai, José Rocha, Felipe Leal e Alessandro Arlant, foi lançado – o multimercado Dahlia Total Return.

Desde então, o Brasil e o mundo passaram por várias crises – Sara elenca a greve dos caminhoneiros, a eleição conturbada de 2018, a Covid-19, a guerra na Ucrânia e a seca no Brasil, que provocaram quedas na bolsa brasileira. Hoje, com juros em 14,75%, o investidor de renda variável está em baixa.

Mas Sara acredita que a bolsa brasileira está perto de um ponto de inflexão. “Os principais desafios passaram, e hoje temos uma inflação controlada e um ciclo de juros que já atingiu seu pico”, diz Sara, em entrevista ao Café com Investidor, programa do NeoFeed que tem o apoio do Santander Select.

De acordo com Sara, há cinco pontos que a levam a estar otimista com a bolsa brasileira. O primeiro deles é que o ciclo de alta dos juros, em sua visão, chegou ao fim. “Ele pode ficar nesse patamar (14,75%) por mais algum tempo, mas o próximo passo naturalmente será um corte”, diz a sócia-fundadora da Dahlia Capital. “O mercado antecipa essas mudanças, e isso tende a impulsionar a bolsa.”

O segundo ponto é justamente a inflação, apesar de ela estar em um patamar ainda alto – o IPCA acumulado nos últimos 12 meses está em 5,4%. “Temos hoje uma inflação que ainda não está ideal, mas está controlada”, afirma Sara.

Outro ponto que reforça a visão positiva de Sara sobre a bolsa brasileira é o fluxo de capital estrangeiro. Com a guerra tarifária que Donald Trump está comandando, muitos investidores começaram a tirar dinheiro dos Estados Unidos.

“O investidor global percebeu que não dá para ficar todo alocado nos Estados Unidos. O Brasil, com 220 milhões de consumidores, exportador de petróleo e alimentos, aparece como uma alternativa viável”, diz Sara, que acredita que a recente alta da bolsa brasileira, cujo Ibovespa avança mais de 15% em 2025, tem a ver com esse cenário.

Além desses fatores, Sara destaca também o resultado das empresas no primeiro trimestre de 2025, que foram surpreendentes. “Mesmo com juros a 14,75%, as empresas brasileiras estão crescendo o lucro 30%, 40%, 50%”, afirma a fundadora da Dahlia Capital.

Por fim, o “trade” eleitoral – que coloca na conta da valorização da bolsa uma mudança de governo em 2026 – pode ser outro fator a favor da alta das ações no Brasil.

Neste caso, Sara acredita que, por conta da queda da popularidade da gestão do presidente Lula (a última pesquisa Genial/Quaest indica uma desaprovação de 57%, a maior do mandato do presidente), deve haver uma mudança na agenda econômica, independentemente de quem vença a eleição.

"Se houver uma agenda mais voltada para reformas estruturantes, isso pode ser positivo para a bolsa”, afirma Sara. “O Brasil já passou por ciclos em que a expectativa de mudança política impulsionou a bolsa, como aconteceu em 2016.”

Diante desse cenário, o portfólio da Dahlia Capital hoje está bastante concentrado no Brasil, em setores como utilities (empresas de energia e saneamento) e bancos. No começo deste ano, passaram a fazer parte da carteira companhias voltadas ao consumo doméstico, como C&A, Renner e Localiza. “O pior já passou para essas empresas, que investiram ao longo do tempo em logística e e-commerce”, diz Sara.

Nesta entrevista, que você assiste no vídeo acima, Sara aborda ainda os investimentos nos Estados Unidos – a gestora mantém posições em algumas empresas, como Uber e Nvidia, e fala se a "Pax Americana", tema de recente carta aos investidores, estaria terminando.

“A Pax Americana pode estar vivendo um momento de incerteza, mas estruturalmente, a geografia, a demografia e a tecnologia ainda fazem dos EUA um país diferenciado", afirma Sara.