A manutenção das taxas de juros em patamares elevados nos Estados Unidos tem sido motivo de cautela para parte dos investidores, mas para a gestora Pearl Diver Capital, com US$ 2,3 bilhões sob gestão, o cenário continua oferecendo oportunidades consistentes no mercado de crédito estruturado – especialmente para quem opera com ativos de taxa flutuante.

“A perspectiva continua sendo de juros mais altos por mais tempo”, afirma Chandrajit Chakraborty, CIO e sócio da Pearl Diver Capital, em entrevista ao NeoFeed em passagem pelo Brasil para a Expert XP.

Segundo Chakraborty, os produtos da casa têm se beneficiado justamente desse cenário de juros elevados. “Nosso fundo global está entregando um retorno de 11,5% ao ano em dólares, o que significa cerca de 20% ao ano em reais, ou 5 pontos percentuais acima do CDI”, diz.

Com sede em Londres e escritórios em Nova Iorque, Cingapura, Dubai, Dublin e Sidney, a Pearl Diver é especializada em investimentos nos mercados globais de crédito, com foco em CLOs - obrigações de empréstimo colateralizadas.

A gestora desenvolveu uma tecnologia proprietária baseada em Big Data para analisar mais de 2,5 mil empréstimos corporativos semanalmente, mapeando riscos e construindo perfis de geração de alfa para gestores de crédito estruturado.

Chakraborty explica que, mesmo em um cenário de queda de juros, os instrumentos de crédito não perdem atratividade. Isso porque a redução das taxas tende a melhorar a capacidade das empresas de pagar suas dívidas, reduzindo o risco de inadimplência. Além disso, a maior parte dos produtos de crédito negocia com spread sobre a taxa básica, mantendo o retorno competitivo.

A estratégia da Pearl Diver está concentrada em dois polos: Estados Unidos e Europa. Já os mercados emergentes ficam fora do foco da gestora no momento. “Há muita incerteza nos emergentes, com instabilidade política e volatilidade macroeconômica. Preferimos construir portfólios globais com ênfase em EUA e Europa”, explica.

Chakraborty também comentou os possíveis impactos de uma escalada na guerra comercial, especialmente em um eventual segundo mandato de Donald Trump.

“A guerra comercial afeta os dois lados. Acreditamos que haverá negociações e acordos. Mas, se tarifas adicionais provocarem inflação, os bancos centrais devem reagir com juros ainda mais altos”, conclui.

Chandrajit Chakraborty, CIO da Pearl Diver Capital, gestora com US$ 2,3 bilhões sob gestão
Chandrajit Chakraborty, CIO da Pearl Diver Capital, gestora com US$ 2,3 bilhões sob gestão

Confira os principais trechos da entrevista:

Quais são suas expectativas para a renda fixa neste momento, considerando o movimento das taxas de juros nos Estados Unidos?
As taxas nos EUA até caíram um pouco, mas não tanto quanto muitos esperavam. O presidente Trump já disse várias vezes que gostaria que os juros caíssem mais. No entanto, diante dos dados macroeconômicos recentes, o presidente do Fed e o comitê como um todo têm relutado em reduzir os juros significativamente neste momento.

Qual o cenário mais provável?
Acreditamos que os juros devem permanecer onde estão, com a perspectiva de “mais altos por mais tempo”. Só devem cair mais adiante, caso haja mudanças no comando do Fed ou uma nova dinâmica no mercado. Por ora, os juros devem seguir elevados.

Como esse cenário afeta os mercados de títulos e o dólar?
Vimos o dólar se enfraquecer um pouco em relação a várias moedas globais. E a dinâmica entre inflação, crescimento do PIB e performance das economias é o que determina as taxas. Onde a inflação continua alta, faz sentido manter juros altos. Mas se a economia desacelera e a geração de empregos perde força, há espaço para cortes.

Isso torna o ambiente favorável para crédito?
Sim. Para instrumentos de crédito, principalmente os de taxa flutuante, como os CLOs – nossa especialidade –, esse cenário é positivo. Eles se beneficiam de juros elevados, pois o rendimento é composto pela taxa básica somada a um spread. Nosso fundo, por exemplo, entrega hoje retorno de cerca de 11,5% ao ano em dólar. Convertido para real, isso significa algo próximo de 20%, ou 6 pontos percentuais acima do CDI.

Mas e se os juros começarem a cair? Isso não prejudica esse tipo de produto?
Nem tanto. Com a queda dos juros, as empresas conseguem pagar melhor suas dívidas. Isso reduz o risco de inadimplência e melhora os fundamentos. Além disso, como a maior parte dos produtos de crédito negocia com spread sobre a taxa base, o retorno absoluto ainda continua interessante.

"Somos muito cautelosos com emergentes. A instabilidade política e os choques geopolíticos tornam esses mercados imprevisíveis"

Essas oportunidades estão concentradas nos EUA ou também em outros mercados?
Vemos oportunidades no mercado global como um todo, mas é preciso ser seletivo. Os EUA continuam sendo uma das maiores economias do mundo, com empresas crescendo – mesmo que algumas a um ritmo mais lento. A Europa também é promissora. O desempenho econômico recente e a valorização do euro em relação ao dólar geram um retorno adicional de 2 a 2,5 pontos percentuais em papéis de menor risco.

E mercados emergentes? Há espaço para alocação nesse momento?
Somos muito cautelosos com emergentes. A instabilidade política e os choques geopolíticos tornam esses mercados imprevisíveis. Quando medidas protecionistas são adotadas, os emergentes tendem a ser os mais impactados. Por isso, priorizamos um portfólio global focado em EUA e Europa, que oferecem mais estabilidade.

Trump tem falado em mudar a liderança do Fed. Isso preocupa vocês?
Trump já disse isso algumas vezes, mas acreditamos que o mandato atual será cumprido. Depois disso, talvez venha alguém mais alinhado com ele. De qualquer forma, o Fed é uma instituição independente. Seu papel é equilibrar crescimento econômico e inflação. Cortar juros em excesso geraria inflação, o que não seria positivo nem para os EUA nem para o mundo.

E os efeitos da guerra comercial? Pode haver pressão inflacionária?
É possível, sim. Tarifas podem ter um efeito inflacionário. Mas estamos vendo avanços em negociações, como o recente acordo entre EUA e Japão. Mesmo que tarifas persistam, o impacto será limitado – nossos fundos têm exposição muito pequena aos países mais afetados. No fim, é sempre uma questão de equilíbrio entre crescimento, inflação e política monetária.

Em resumo, tarifas podem forçar cortes de juros ou o efeito será o contrário?
Depende. Se as tarifas provocarem inflação, os bancos centrais tendem a subir juros – não cortá-los. Mas se o crescimento econômico cair demais, o Fed pode sim intervir com cortes. No geral, acreditamos que o cenário aponta para juros elevados por um bom tempo.