Maior rede de joalherias do Brasil, a Vivara deve ser a próxima empresa a testar o apetite dos investidores no País. E a expectativa é que o mercado de capitais dê uma boa resposta à abertura de capital da companhia.
A reserva de ações para o IPO teve início na quinta-feira 26 e se estende até 7 de outubro. E, segundo o colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo, a procura pelos papéis já supera em cinco vezes o volume de ações ofertadas.
A previsão é de que a Vivara arrecade cerca de R$ 2 bilhões na oferta. Além dos recursos injetados na operação, o montante vai reforçar outra estatística que vai além dos cofres da empresa.
Depois de um longo período de baixa movimentação, o mercado brasileiro de capitais dá sinais de reaquecimento nos valores captados por meio de ofertas públicas iniciais de ações e também de follow on.
De janeiro a setembro, essas modalidades movimentaram R$ 57,3 bilhões no País, contra R$ 11,2 bilhões em todo o ano de 2018, segundo dados compilados pela B3. Com a cifra, esse já é o melhor ano desde 2010, quando o mercado movimentou R$ 149,2 bilhões.
Em 2019, foram duas aberturas de capital até o momento: Centauro e Neoenergia, que captaram R$ 705 milhões e R$ 3,74 bilhões, respectivamente. Para o ano, além da Vivara, estão previstos ainda os IPOs de empresas como C&A e BMG.
Já entre as 22 ofertas de follow on lançadas em 2019, figuram nomes como Localiza, CPFL Energia, Totvs, Banco Inter, Movida e Hapvida. Essa última é um dos exemplos citados pelos analistas como uma boa referência do momento do mercado.
Depois de abrir capital em 2018 e levantar R$ 3,4 bilhões, a operadora de saúde voltou ao balcão com um follow on em que captou R$ 2,6 bilhões. A empresa tem destinado esses recursos para a expansão orgânica e também para uma estratégia de consolidação, que incluiu, entre outros acordos, a aquisição do grupo São Francisco, em maio, por R$ 5 bilhões.
“A Hapvida é um exemplo do que o mercado considera mais nobre nesses movimentos”, diz Gleidson Leite, gestor de renda variável da Western Asset. “A empresa está captando recursos tanto para se preparar para o crescimento como para investir em consolidação.”
Retomada?
Ainda é cedo para dizer que essa não é apenas mais uma onda passageira. Mas as fontes consultadas pelo NeoFeed destacam alguns fatores que estabelecem a base para um cenário consistente de retomada.
O principal deles é o menor nível das taxas de juros e, mais importante, a perspectiva de manutenção desse contexto no médio e longo prazos.
“Até pouco tempo, os ciclos de redução dos juros eram muito curtos, o que não estimulava essa movimentação”, afirma Rodrigo Franchini, sócio e head de produtos da assessoria de investimentos Monte Bravo.
“Agora, não se tem perspectiva de aumento. Esse cenário veio para ficar e é reforçado pelo otimismo quanto à expectativa de aceleração do crescimento no médio e longo prazos.”
De um lado, esse contexto faz com que as aplicações em renda fixa se tornem menos atrativas, o que estimula os investidores a tomarem mais risco. Ao mesmo tempo, a queda nas taxas favorece, em especial, as perspectivas para alguns setores da economia, o que já vem se refletindo na precificação de ativos desses segmentos na bolsa.
De janeiro a setembro, IPOs e folllow on movimentaram R$ 57,3 bilhões no País, o melhor ano desde 2010
No curto prazo, o primeiro impacto positivo se dá em áreas diretamente ligadas ao consumo, algo que também foi reforçado por medidas recentes, como a liberação do FGTS. Esse panorama ajuda a explicar as boas expectativas sobre os IPOs no radar de empresas como a própria Vivara e também a varejista C&A.
“Essas empresas não estariam dando esse passo simplesmente pela janela atual de oportunidades do mercado”, afirma Cesar Mikail, gestor de renda variável da Western Asset. “Elas estão seguindo esse caminho porque estão enxergando a retomada da economia.”
Em seu prospecto, a Vivara deixa claro suas intenções com a abertura de capital. Entre os planos da empresa com a injeção dos recursos estão a abertura de lojas físicas, a expansão da capacidade de produção e o lançamento de uma nova marca.
Em outra ponta, o segmento de incorporadoras também começa a dar sinais de reaquecimento, o que se reflete no lançamento de follow ons por parte de uma série de empresas do setor, que estão acessando o mercado para se capitalizarem e se prepararem para quando a retomada vier de fato.
A relação inclui nomes como Tecnisa, Eztec e Trisul. A mais recente a recorrer a esse expediente foi a Helbor, que aprovou nesta segunda-feira 30 uma oferta para captar até R$ 557,9 milhões.
“Além dos juros mais baixos, as condições de financiamento imobiliário mais atrativas já estão reacendendo a demanda, os lançamentos e as vendas, especialmente em mercados que já digeriram o estoque, como São Paulo”, diz Leite, da Western Asset.
Segundo os especialistas, saúde, mineração e serviços são outros setores com boas perspectivas nesse contexto.
Apesar das boas projeções para o mercado, Leite ressalta que a consolidação desse cenário depende de alguns componentes. “Os dois fatores cruciais são a manutenção do caminho das reformas e sinais mais concretos de aceleração da economia no médio e longo prazos.”
Franchini, da Monte Bravo, acrescenta. “Algumas questões precisam ser resolvidas ou, ao menos, ter um vislumbre de solução, entre elas, a reforma da previdência e o ajuste fiscal”, afirma. “Com isso, esses processos vão ganhar ainda mais força e ser mais frequentes.”
Contraste
O cenário brasileiro contrasta com o panorama observado nos Estados Unidos, mercado que alimentava boas expectativas nesse ano no que diz respeito às aberturas de capital. Mas que agora se mostra muito mais exigente.
Um dos processos mais aguardados para o período, a Uber é um bom exemplo. Realizado em maio, o IPO avaliou a empresa em US$ 82 bilhões, ante um valor estimado de US$ 120 bilhões. Passados pouco mais de cinco meses, a empresa oscila entre US$ 51 bilhões e US$ 54 bilhões nas últimas semanas.
Outra abertura de capital recente reforça esse contexto. Startup americana de equipamentos de fitness, a Peloton viu suas ações chegarem a cair 11% em sua estreia na bolsa, na quinta-feira 26. No mesmo dia, a Endeavor anunciou o cancelamento de sua oferta, diante do humor pouco favorável do mercado.
O caso mais emblemático no último mês, no entanto, é o da We Co., responsável pela WeWork, startup de escritórios compartilhados. De uma avaliação privada de US$ 47 bilhões, a empresa chegou a vislumbrar um IPO bem abaixo dessa cifra, com um valor estimado em menos de US$ 20 bilhões, e acabou por adiar sua abertura de capital.
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