O segundo semestre chega ao calendário com o Congresso impondo ruidosa derrota ao governo ao sustar a alta do IOF; a equipe econômica procurando conter os danos no caixa; o presidente Lula afiando o discurso para a Cúpula do Mercosul na Argentina, em 2 e 3 de julho, quando assumirá o comando temporário do bloco; e o Judiciário fazendo as malas para, de 2 a 4, marcar presença no 13º Fórum de Lisboa, promovido pelo Instituto Brasil de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa fundado pelo ministro do STF Gilmar Mendes.
O evento, apelidado de “Gilmarpalooza” pela grandeza e diversidade, reúne políticos, juristas, banqueiros e empresários brasileiros e europeus de elevado prestígio para discutir política nacional e global a um oceano de distância do Brasil. Desta vez, sob o tema “O Mundo em Transformação – Direito, Democracia e Sustentabilidade na Era Inteligente”.
Mais cedo, entre 30 de junho e 2 de julho, também em Portugal, em Sintra, acontece o Fórum do Banco Central Europeu sobre Bancos Centrais. A anfitriã Christine Lagarde e Jerome Powell serão destaque no encontro que discutirá “Adaptação à mudança: transformações macroeconômicas e respostas políticas”. Representará o Brasil, Diogo Guillen, diretor do Banco Central.
De olho nessa variada agenda, o mercado faz o balanço de um primeiro semestre de dólar, juros futuros e risco-país em queda e bolsa valorizada e se apruma para encarar o segundo semestre que promete emoção. No mínimo, porque o corte de juro a ser promovido pelo Federal Reserve, o BC americano, poderá sacudir os mercados e promover uma reviravolta – inclusive por aqui.
Para uma reflexão sobre o cenário, o NeoFeed entrevistou o economista Alexandre Mathias, estrategista-chefe da Monte Bravo Corretora para quem o desempenho positivo dos ativos brasileiros no primeiro semestre nada tem a ver com fatores domésticos. E o que vai “fazer preço” nos próximos meses continuará sendo o exterior.
Para o estrategista, o mercado doméstico tem sido totalmente impulsionado pelo ciclo global. Ele explica que após Donald Trump com seu choque tarifário caótico ter se convertido num fator de elevada incerteza – com repercussão em prêmios de risco, fluxo de capitais, investimentos e decisões de consumo – o dólar enfraqueceu no exterior, o real apreciou, puxou a queda dos juros longos e a valorização do Ibovespa também favorecida pelo capital externo.
A despeito do comportamento dos mercados, avalia Mathias, aqui nada mudou. O Brasil continua tendo um governo complacente com desafios fiscais e resiste a reformas. “Vivemos do impulso fiscal e temos um BC que trabalha para trazer a inflação às metas com juro real extremamente elevado, sinal do quanto a política fiscal está desajustada. E a economia só não desacelera tanto porque a política fiscal turbina o curto prazo num cenário de trajetória explosiva da dívida pública”.
Eleição 2026 no radar do mercado – ainda sem apostas
O ciclo global favorece o Brasil, mas no segundo semestre o cenário pode ser outro, alerta Mathias. “Trump e as incertezas geradas por sua política comercial errada provocará um enfraquecimento notável da economia americana no terceiro trimestre. Condição que favorece o corte de juro pelo Fed. Jerome Powell, em pronunciamentos à Câmara e ao Senado, indicou claramente que, não fosse a incerteza, hoje o corte de juro estaria sendo discutido.”
A Monte Bravo Corretora prevê três cortes de juro pelo BC americano a começar em setembro, o que implica em dólar mais fraco. Entretanto, pontua o economista, a moeda deverá encontrar um ponto de equilíbrio mais para o fim do ano, quando uma reversão de cenário deverá se confirmar.
Mathias observa que investidores olharão para 2026 e a perspectiva será favorável. Os EUA terão um problema fiscal, mas a maioria dos países também tem, inclusive, como saldo da pandemia. Porém, a economia continuará sendo produtiva. E, loucuras presidenciais à parte, o governo é pró-business.”
O fato de o S&P500 ter sustentado 6 mil pontos com todos os percalços observados é sinal de que o mercado vem comprando esse cenário de desaceleração momentânea, diz Mathias. “Os cortes de juros virão e a retomada do crescimento vai conter saída de investidores e ‘chamar’ capital.”
O mercado local também estará discutindo corte de juro, mas em meio ao ciclo eleitoral que traz volatilidade. “O vento a favor dura ao longo do terceiro trimestre, mas tende a perder impulso mais para o final do ano. O dólar poderá voltar para cerca de R$ 6,00, refletindo a combinação de risco fiscal e risco eleitoral”, diz o estrategista para quem a eleição está, de fato, no radar do mercado.
A eleição terá placar apertado como as últimas no País, afirma Mathias, com o próximo presidente eleito por estreita margem de votos. “De novidade é o fato de Lula não ser favorito, o que não quer dizer que a oposição é favorita. A eleição estará em aberto até abril ou maio e, até o início da campanha, o mercado não apostará em um ou outro candidato.”
Nesse ambiente, o estrategista avalia que o mercado deverá operar em intervalos de preços, o que, aliás, já está acontecendo. “O câmbio de Lula vitorioso é R$ 7,00, o câmbio da oposição vitoriosa é R$ 5,00. O Ibovespa de Lula é 100 mil pontos e, da oposição, entre 220 mil e 250 mil pontos.”
O grande tema econômico da eleição será a questão fiscal, acrescenta Mathias, que alerta e lamenta o fato de o Brasil ser retardatário na adoção de necessárias e aplicadas em outras nações.
“Em 1994, o Brasil foi o último país da América Latina a zerar a inflação. A Reforma da Previdência já era proposta em 2002, quando Lula chegou ao Planalto. E veio acontecer 20 anos depois.”
O estrategista não tem dúvida de que o debate fiscal está interditado no Brasil. “O problema que se coloca (e não pode ser ignorado) é que não teremos 20 anos para resolver essa questão. Teremos dois ou três. O próximo presidente terá que tomar decisões.”