No mercado de fintechs e bancos digitais, é comum medir o sucesso de uma operação pelo número de clientes. Escala, dizem os analistas, é o nome do jogo. Nubank, com 35 milhões de clientes, e Inter, com 10 milhões de correntistas, se destacam nessa disputa.
Mas os números apresentados pelo Banco Original, que conta com 4,3 milhões de correntistas e vem ganhando uma média de 160 mil novos clientes por mês, mostram que os “não correntistas” podem ser uma poderosa arma nessa disputa.
Dos atuais 8 milhões de cartões de crédito e débito emitidos pelo banco, 5 milhões foram destinados para não correntistas, um segmento que foi criado dentro da instituição financeira no segundo semestre do ano passado, mas que passou a ganhar tração em dezembro de 2020.
Todos esses cartões foram destinados para clientes do PicPay, fintech que tem o Original como acionista e conta com 48 milhões de usuários. E não vai parar por aí: outros 4 milhões de cartões estão pré-aprovados e 5 milhões de não correntistas tiveram crédito pré-aprovado.
Em fevereiro, 25% do faturamento dos cartões do Original, o equivalente a R$ 151 milhões, vieram de não correntistas. Por enquanto, o motor disso é o PicPay. “É uma base fantástica”, diz ao NeoFeed, Alexandre Abreu, presidente do Banco Original. “O PicPay tem sua estratégia própria, cresceu barbaridade, e é muito bom como parceiro.”
No crédito pessoal, a parceria também está rendendo para o banco. Cerca de 20% das liberações de crédito para pessoas físicas já são destinadas para os não correntistas. “Em fevereiro, a base de empréstimos para não correntistas chegou a R$ 28 milhões e deve bater R$ 50 milhões em março”, diz Abreu.
Os números mostram o potencial que o negócio pode ter para o Original, controlado pelo grupo J&F, da família Batista. “Estamos conversando com outras fintechs.” Na área de cartões, diz Abreu, o Original está negociando com outras dez empresas, algumas delas varejistas, e na área de crédito outras duas negociações estão em andamento com marketplaces.
A busca pelos não correntistas não é uma exclusividade do Original. Outros bancos digitais também estão atrás desse “pote de ouro”. O Inter, por exemplo, deve abrir seu marketplace para pessoas que não têm conta no banco e, em recente entrevista ao NeoFeed, João Vitor Menin, presidente do banco, confidenciou que pretende lançar um app para não correntistas no Brasil e no exterior.
“Em termos de base de clientes, o Original não ‘rampou’ como os concorrentes, mas está se tornando um orquestrador de ecossistema”, diz Bruno Diniz, autor do livro “O Fenômeno Fintech” e sócio-fundador da consultoria Spiralem. O consultor se refere ao trabalho que o banco vem fazendo na área de Banking as a Service, oferecendo serviços bancários para diversas fintechs.
Na opinião de Diniz, Original e BV, que oferece serviços para sua investida Neon, entre outras fintechs, são os que têm se destacado nessa área. “Como na guerra do varejo outros estão na frente, esses bancos digitais estão apostando alto na venda de serviços.”
É, de certa forma, um grande aquecimento para o open banking que começa a valer a partir de julho. “O Original tem uma forte base para APIs e para microserviços. Essa é uma operação quase madura”, diz Abreu.
No ano passado, foram 31 milhões de transações e a previsão é de 42 milhões de transações em 2021. São liquidações de boletos, arrecadação de guias, saques na rede 24 horas feitas por outras fintechs, mas com a infraestrutura e serviço do Original.
De acordo com Luiz Giacomini, head de RI e tesouraria do banco, o Original tem 30 parcerias rodando e deve chegar a 60 clientes de Banking as a Service até o fim do ano. Os clientes mais conhecidos são GuiaBolso e o PicPay.
Recentemente, o banco anunciou uma parceria com a Shipay, integradora de carteiras digitais do varejo. O Original vai desenvolver a ferramenta de pagamento via QR Code e soluções para o Pix.
Isso é fruto de um grande investimento em tecnologia. “Em 2020, foram R$ 223 milhões, 42% a mais do que em 2019”, diz Giacomini. Mas nem sempre foi assim. Essa vocação só foi reforçada depois da chegada de Abreu, em janeiro de 2019.
Antes, toda a tecnologia era feita por terceiros. Sob liderança do executivo Raul Moreira, hoje conselheiro do banco, o Original criou uma empresa de tecnologia independente apenas com desenvolvedores e hoje conta com 300 funcionários só nesta área.
A atual infraestrutura permite que a operação cresça sem solavancos. “Até o fim do ano, devemos chegar a 6 milhões de clientes. E, com o que temos hoje, suportamos 10 milhões de correntistas”, diz Abreu.
Diversificação
Em setembro de 2020, o Original passou a operar contas PJ. A instituição conta com 3 mil correntistas – uma posição ainda tímida. Mas tem mapeado 170 mil potenciais clientes. No atacado, o banco deve manter o atual patamar, de R$ 6,1 bilhões em carteira de crédito.
“Temos alavancas de crescimento diversificadas”, diz Abreu. “Isso nos deixa mais preparados para enfrentar as intempéries do Brasil.” Os números de 2020 são prova disso. No segundo semestre, a margem financeira bruta do Original foi de R$ 414 milhões, crescimento de 27% em relação ao ano passado.
Desse total, R$ 179 milhões vieram do atacado, R$ 194 milhões do varejo, R$ 33 milhões de Banking as a Service, R$ 8,3 milhões de não correntistas e R$ 600 mil de empresas. O que chama mais atenção é o crescimento mais vertiginoso das operações de Banking as a Service, que saltaram 15 vezes, e a de não correntistas, multiplicada por oito em comparação com o primeiro semestre de 2020.
O banco fechou com R$ 3,7 bilhões em caixa, um patrimônio líquido de R$ 2 bilhões, viu sua carteira de crédito do varejo crescer 72% e as perdas no segundo semestre do ano passado foram bem menores do que as do primeiro semestre.
De um prejuízo de R$ 220 milhões, o Original anotou uma perda de R$ 29 milhões no segundo período. Ainda assim, um prejuízo total de R$ 249 milhões. O resultado operacional negativo de R$ 33 milhões no primeiro semestre passou um positivo de R$ 61 milhões. “Em 2021, teremos lucro”, avisa Abreu. É tudo o que os controladores querem ouvir.