O banco americano J.P. Morgan gera um caminhão de dinheiro para seus acionistas – só neste ano, os analistas estimam o lucro em US$ 40 bilhões. Mas Jamie Dimon, CEO global do banco, sabe que não pode apenas distribuir dividendos ou sentar-se em cima dessa montanha de capital. É preciso diversificar investindo em fintechs e bancos digitais.

Recentemente, a instituição financeira anunciou a compra da plataforma de robot-advisor britânica Nutmeg, num negócio de quase US$ 1 bilhão. Trata-se de um embrião para um banco digital na Inglaterra. Agora, adota a mesma estratégia no Brasil, ao entrar no varejo com uma operação digital, comprando  40% do C6.

“O J.P. Morgan tem uma visão muito clara de crescimento no mundo digital. Estamos buscando oportunidades de crescimento em varejo, pagamentos, inteligência artificial e outros negócios análogos aos nossos. Estamos em dezenas de companhias como investidores estratégicos”, disse Daniel Darahem, Senior Country Officer para o Brasil no J.P. Morgan Chase, ao NeoFeed.

Entrar no mercado de varejo brasileiro sempre foi um desafio para todos os bancos americanos. Nunca, nenhuma instituição financeira, por maior que fosse, conseguiu triunfar por aqui. São vários os exemplos de bancos que fracassaram diante dos bancões brasileiros. Os casos de Citi e BankBoston são os mais clássicos, que tiveram suas operações locais vendidas para o Itaú Unibanco.

Com o digital, sem a necessidade de vultosos investimentos em agências físicas e sistemas legado, as coisas ficaram mais fáceis e o J.P. Morgan viu a possibilidade de cortar caminho ao comprar um grande pedaço do C6. “Nosso CEO sempre diz que o modelo digital muda essa equação e nos permite criar um negócio de varejo fora dos EUA, de maneira digital”, diz Darahem.

Apesar de ainda não ter completado dois anos de vida, o C6 já tem uma grande base de clientes. São mais de 7 milhões, muitos vindos de uma parceria com a operadora de telefonia TIM, que também proporciona equity para a companhia de telecom. O CEO do J.P. Morgan no Brasil diz que outros motivos de escolha foram o management, liderado pelo fundador Marcelo Kalim, e a marca. “É aspiracional, que os consumidores enxergam como premium e é como gostaríamos de nos posicionar.”

O valor do negócio não foi revelado, mas, diante do último valuation, quando o banco atingiu R$ 11,3 bilhões, essa participação chegaria a R$ 4,52 bilhões. Parte do dinheiro será usada para quitar debêntures de R$ 525 milhões emitidas em julho de 2020 e mais R$ 1,3 bilhão captados em notas estruturadas no fim do ano passado. “Também vai nos proporcionar capital para o nosso crescimento”, diz Marcelo Kalim, CEO e cofundador do C6 Bank, ao NeoFeed.

Para o C6, a entrada do J.P. Morgan traz alguns benefícios. Um deles é que diminui a necessidade da abertura de capital num curto espaço de tempo, algo que estava em estudo antes de o banco americano entrar na jogada. E o IPO não seria fácil, diante de outros competidores na fila, caso do Nubank, e da dificuldade em convencer os investidores, o que foi enfrentado pelo PicPay, que acabou adiando o processo para 2023.

Outro ponto que pode ajudar o C6 é na questão da imagem. Guardadas as devidas proporções, a chegada do banco americano ao seu quadro de acionistas pode servir como uma chancela parecida com a que o Itaú deu à XP quando comprou uma participação relevante na corretora de Guilherme Benchimol. Na época da aquisição, a XP já crescia, mas a chegada do Itaú, trazendo selo de confiança, fez o salto se tornar exponencial.

“Agrega muito à nossa marca, traz credibilidade e também um nível de padrão de excelência global. É um selo de qualidade inestimável”, diz Kalim. Aliás, o C6 pretende usar o dinheiro e essa chancela para avançar em novos produtos dentro de sua plataforma de investimentos. “Vamos agregar ao nosso app o acesso a bolsas internacionais e renda fixa internacionais. Outra aposta nossa é em uma carteira personalizada para cada cliente.”

Kalim explica que cada um poderá montar uma carteira sob medida com bolsa brasileira, bolsa americana, Nasdaq, S&P, ouro, tesouro americano. “É uma aposta que vai nos diferenciar, onde o cliente vai ter um aconselhamento diretamente do banco, sem a necessidade de um intermediário.” O J.P. Morgan, diz Kalim, também vai proporcionar acesso a mercados internacionais e a um robusto material de research.

Mesmo com a chancela internacional, o C6 ainda terá uma briga boa pela frente. Players como Inter, Neon e Nubank têm crescido a ritmos chineses e também contam com capital e acionistas que trazem credibilidade. O Inter, por exemplo, acaba de concluir um follow on em que captou R$ 5,5 bilhões ancorados pela Stone e se prepara para listar suas ações na Nasdaq.

Em setembro do ano passado, o Neon recebeu R$ 1,6 bilhão de General Atlantic, Black Rock, entre outros. E, recentemente, o Nubank, que deve abrir o capital nos EUA, recebeu um cheque de US$ 500 milhões de Warren Buffett, o que fez seu valor de mercado atingir US$ 30 bilhões.

A gestão do C6 continua a mesma, mas o conselho deverá sofrer alterações nos próximos meses. “Do ponto de vista de management não muda nada. Só vamos fazer esforço para nos enquadrar nas políticas internacionais do J.P. Morgan, o que é bom para nós”, diz Kalim.