Quando assumiu o comando da Oi, no segundo semestre de 2019, o executivo Rodrigo Abreu avisou ao mercado. “Eu tenho um plano, mas vai demorar”, dizia ele, em conversas com investidores e credores da empresa de telefonia, que estava em recuperação judicial desde 2016, com dívidas de R$ 65 bilhões.
Quase três anos depois, a Oi está perto de sair de uma das maiores recuperações judiciais da história do Brasil após uma venda massiva de ativos que incluiu toda a operação de telefonia celular, a infraestrutura de fibra óptica, data centers e sua divisão de torres. No total, os desinvestimentos trouxeram quase R$ 31 bilhões aos seus cofres.
Agora, a Oi começa uma nova fase em que vai testar no mercado seu novo modelo de negócio, transformando-se em uma empresa de serviços de fibra óptica e de soluções digitais. E Abreu tem um plano (de novo). “Quero ser a maior empresa de conectividade de fibra do País”, afirma Abreu, em entrevista ao NeoFeed. “E não nascemos pequenos: temos uma receita de aproximadamente R$ 10 bilhões.”
O plano principal é dobrar o número de clientes de fibra óptica, hoje na casa de 4 milhões, para 8 milhões até 2025. No começo do ano passado, a Oi tinha 2,7 milhões de clientes e, desde que Abreu assumiu a companhia, vem acelerando essa oferta como uma forma de já ir se preparando para quando todos os ativos estivessem vendidos.
A conta de Abreu para chegar aos 8 milhões de clientes é simples. A V.tal, a empresa controlada agora por fundos geridos pelo BTG Pactual e que ficou com a infraestrutura de mais de 400 mil quilômetros de fibra óptica da Oi, tem planos de atingir 34 milhões de casas passadas com a tecnologia até 2025. “Acreditamos que podemos conquistar 25% desse universo com nossos clientes”, afirma o CEO da Oi.
A Oi, que detém uma fatia de 35% na V.tal, será o principal cliente da empresa, alugando a infraestrutura da nova companhia para prestar os serviços de banda larga fixa aos seus consumidores. Atualmente, a empresa comandada por Abreu já é a segunda colocada no ranking de banda larga fixa com a tecnologia de fibra óptica. Fica atrás apenas da Vivo, que tem 5 milhões de clientes, segundo dados da consultoria Teleco. “Vamos brigar pela liderança”, diz Abreu.
A Vivo não é, no entanto, a única rival nesse setor. O grande competidor na área de fibra óptica são centenas de pequenas empresas que são chamadas de competitivas e estão espalhadas por todo o Brasil em municípios de pequeno e médio porte. Esse grupo conta com quase 16 milhões de clientes, uma fatia de mercado de mais de 60%.
Algumas dessas empresas não são tão pequenas, contam com investidores ou abriram o capital e estão ganhando porte para fazer frente nesta briga. São os casos da Alloha, da eB Capital, que tem 1,3 milhão de clientes. Ou da Brisanet, listada na B3, e que soma 932 mil consumidores. Na sequência aparecem Algar, com 683 mil; Desktop, 676 mil; e Vero (da Vinci Partners), com 639 mil.
O trunfo da Oi, que era a capilaridade da sua rede de fibra óptica, presente em 2,3 mil cidades, deixa de existir. Afinal, a V.tal agora se posiciona como uma rede neutra e vai oferecer os serviços para diversos concorrentes da companhia comandada por Abreu. “A V.tal vai correr atrás de outros clientes. Ela não pode ficar só dependente da Oi”, afirma Eduardo Tude, presidente da Teleco. “Se a Oi tiver problemas, ela vai fazer o quê?”
Após a conclusão do negócio de R$ 12,9 bilhões com a Oi, a V.tal divulgou Amos Genish, fundador da GTV, ex-CEO da Vivo e da Telecom Italia, como seu CEO. Em entrevista ao NeoFeed, ele disse que a companhia já tinha mais de 30 clientes e que deveria anunciar mais 10 em breve. O executivo afirmou também que a empresa negociava acordos com uma varejista, um marketplace e uma fintech, que querem oferecer serviço de banda larga aos seus clientes. “Novos players querem ser provedores de internet”, afirmou Genish, na ocasião.
Além da fibra
A fibra não vai ser o único pilar da nova Oi – embora deva ser o mais importante deles. Abreu diz que a companhia vai se expandir oferecendo também uma série de novos serviços digitais. “Esse é um território vasto que vai desde serviços tradicionais, como financeiros, até saúde e educação”, afirma Abreu. O modelo em que a Oi pretende atuar compreende desde ter os serviços próprios, passa por parcerias e pode chegar a participações societárias em novas empresas.
Um exemplo de serviço próprio é o Oi Expert, que já faz parte do menu da companhia, e que dá atendimento técnico desde instalação de banda larga até outros serviços de tecnologia. Outro, que envolve parcerias, é o feito com PagSeguro e BTG Pactual, em que os serviços de conectividade da Oi são oferecidos em uma oferta comercial. A Oi ainda não tem ainda nenhum negócio na qual é sócia.
Não se trata, porém, de algo inédito. As empresas de telefonia rivais, como Vivo e TIM, já vêm atuando dessa forma. A TIM, por exemplo, se tornou sócia do banco C6, em uma estratégia que usava sua base para levar clientes ao banco digital em troca de uma participação – essa relação acabou parando em uma Câmera de Arbitragem em meio a uma briga pela rescisão do contrato. A Vivo fez uma joint venture com o Ânima na área de educação.
Outro braço será a área corporativa através da Oi Soluções, unidade que integra soluções de tecnologia e de telecomunicações de diversos fornecedores para grandes empresas e governos. São serviços como segurança, gestão de ativos, big data, analytics e computação em nuvem, entre muitos outros.
Em uma conta em que arredonda dados, Abreu diz que a Oi Soluções deve representar uma fatia de R$ 3 bilhões da receita da nova Oi. Serviços para pequenos e médias empresas deve movimentar mais R$ 1 bilhão. E a maior fatia do faturamento da companhia virá do que o executivo chama de residencial, como os serviços de fibra e de conteúdo, que ficará com até R$ 6 bilhões.
Nesta nova fase, a estimativa é que a margem Ebitda fique na casa dos 20%, bem menor do que os 32,9%, no quarto trimestre do ano passado. Essa queda deve-se ao fato de a empresa não ter mais a telefonia móvel e de precisar pagar pelo uso da infraestrutura para a V.tal.
Abreu diz também que o fluxo de caixa operacional positivo não acontece neste ano. “Só no fim de 2023 e começo de 2024.” Para Tude, da Teleco, a Oi deveria trabalhar para ter um fluxo de caixa positivo o mais rápido possível. “Não pode demorar, se não a empresa vai começar a se endividar novamente”, diz o consultor.
O passado não perdoa?
Apesar de estar perto de sair da recuperação judicial, a Oi tem ainda um legado para lidar. Um deles é a dívida com os credores, que seguirá sendo paga até 2025. No quarto trimestre de 2021, o endividamento líquido estava em R$ 32,57 bilhões. Mas cerca de R$ 12 bilhões devem ser abatidos no segundo trimestre deste ano, por conta dos recursos dos desinvestimentos realizado ao longo dos últimos anos.
A Oi precisa lidar ainda com o fato de ser uma concessão, com obrigações ligadas a telefonia fixa, que são bastante deficitárias. Essa “batalha”, na visão de Abreu, foi adiada diante da urgência de resolver a dívida com os credores. “Precisamos equacionar a questão da concessão, que não é sustentável”, afirma o CEO da Oi.
Avaliada em R$ 3 bilhões na B3, as ações ordinárias (OIBR3) caem mais de 30% em 2022. As preferenciais (OIBR4), 22,8%. O mal humor do mercado com a empresa é fácil de entender. Os novos termos da renegociação das dívidas da empresa com a Anatel, de mais de R$ 20 bilhões, não agradaram os analistas de bancos de investimentos. Outro fato foi o fechamento do negócio da V.tal, em que ficou com uma fatia menor da companhia.
“Acreditamos que a combinação desses dois anúncios terá impacto negativo significativo no valor da Oi”, escreveram os analistas do BTG Pactual, Carlos Sequeira e Osni Carfi, em um relatório, na semana passada.
Cabe agora a Abreu, que conseguiu conduzir a conturbada recuperação judicial da Oi até perto do seu fim, o trabalho de recolocar a companhia nos trilhos em sua nova fase. Ele diz mais uma vez que tem um plano. O tempo dirá se vai funcionar.