Ian Baiocchi é o chef mais celebrado do Centro-Oeste. Vira e mexe concorre consigo mesmo pelo título de melhor restaurante na região com suas casas ÍZ, 1929 Trattoria e Grá, em Goiânia. Em 2020, por exemplo, foi o escolhido pelo Itamaraty para apresentar a cozinha do Cerrado ao mundo durante a Expo, em Dubai.

Ainda assim, só na quinta-feira, dia 21 de julho, fará sua estreia em um evento aberto ao público no exigente mercado paulistano. “Já fiz jantares fechados para clientes que me levavam para mostrar aos amigos paulistas, mas agora é diferente. Tem uma responsabilidade alta”, diz ele, que estará à frente da 7ª edição do Grand Taste – Chef’s Table, evento realizado pelo hotel Grand Hyatt São Paulo (R$ 350 por pessoa).

Na lista de opções estão o bombom de queijos brasileiros e marmelada da comunidade quilombola Santa Luzia, o robalo com missô de pistache, e a barriga de leitão com tzatziki de linguiça, alho assado com baunilha do cerrado e pó de crisântemo. “Busco trabalhar com ingredientes locais, mas não de forma maçante ou óbvia. Não pode ser o uso pelo uso. Os elementos precisam conversar.”

O “frio na barriga” para o evento remete à emoção do início de carreira no Brasil e no exterior quando trabalhou ao lado de nomes estrelados da gastronomia mundial como Alex Atala (D.O.M.), Helena Rizzo (Maní), Sérgio e Javier Torres (do extinto Eñe), Joan Roca (El Celler de Can Roca - Espanha) ou Andoni Aduriz (Mugaritz -Espanha). Mas experiência e segurança já não lhe faltam.

Aos 33 anos, o chef empreendedor comanda três restaurantes premiados em sua terra natal: ÍZ, mais autoral e contemporâneo; 1929 Trattoria, uma homenagem à avó de origem italiana, mas com toque moderno; e o Grá, o maior de todos, com 170 lugares e influência francesa. Além de buffet, um restaurante pop-up, uma hamburgueria (Burger For a Day) e uma rede de sorveterias (Alata), as duas últimas lançadas durante a pandemia. Operações que, juntas, contam com 250 funcionários.

O 1929 Trattoria foi eleito o restaurante do ano do Centro-Oeste pela revista Prazeres da Mesa

“Nunca quis ser empresário. Entrei na gastronomia para ser cozinheiro”, diz ele, que começou a carreira solo em 2012, ao voltar da Europa e assumir a cozinha do Palácio das Esmeraldas, sede do governo de Goiás. “Foi ali que aprendi a ser chef de verdade. A treinar e liderar equipe, lidar com limitações de ingredientes e recursos, usar a criatividade e as técnicas para ser transformador”, lembra.

Paralelamente, deu início ao buffet que ajudou a financiar a abertura do ÍZ, em 2015, e cuja estrutura ainda hoje serve de suporte para as demais frentes. “Como sempre gostei de fazer tudo artesanal, acabei tendo padaria, açougue, confeitaria, que acabaram motivando a abertura de novos negócios”, explica. Foi, por exemplo, como justificativa para o alto investimento no maquinário necessário para fazer o próprio sorvete que surgiu a ideia de ter uma sorveteria.

“Sorvete na sobremesa faz todo sentido no calorão de Goiânia, mas queria fazer algo com a nossa cara”, diz. Assim, em junho de 2020 nascia a Alata Sorvetes, com sabores inovadores como pitaya com morango e hibisco, bolo de cenoura, clitória (flor que empresta coloração lilás à massa e sabor de cinnamon roll, e estará no menu do evento em São Paulo), castanha de baru com doce de cajuzinho do cerrado, entre outros.

Sabores originais da sorveteria Alata:clitória cinnamon roll e capuccino de Bayles

“Chegamos a vender mil casquinhas num único dia e ter filas de 50 minutos.” Resultado: em apenas dois anos a marca já conta com três lojas em Goiânia, com planos de expansão para outros mercados, a começar por São Paulo. “É um produto muito intelectualizado”, garante.

Não por acaso, a marca esteve entre as finalistas na categoria Sorveterias, do prêmio Melhores de 2022, da Revista Prazeres da Mesa. Mesma premiação que colocou novamente lado a lado os restaurantes ÍZ e 1929 Trattoria entre os melhores da região Centro-Oeste.

Com criações como agnolotti de pato com castanha do Pará e pizzeta de polvo com salsa de abacate, shissô, molho de tomate e queijo Serra do Bálsamo, a Tratttoria sagrou-se vencedora frente criações mais contemporâneas do ÍZ como o queijo coalho tostado com melado de cana, pó de manteiga de garrafa, ciboulette e falso caviar de jabuticaba, ou o cupim braseado com caramelo de banana, alho negro, gema marinada e creme de arroz negro.

“Ter de competir comigo mesmo é das coisas que mais me deixa frustrado”, desabafa o chef, que domina o mercado local, sempre com casas lotadas, mas que mesmo assim não se acomoda.

Seu fenômeno mais recente é o Gutxi, restaurante pop-up com inspiração ibérica instalado durante a mais recente edição da Casa Cor Goiânia, evento que serve de laboratório para suas casas desde 2018, quando lançou ali, o Grá Bistrô. “O Gutxi foi um sucesso. Já nasceu supermaduro. Por isso mesmo acho que o lançar agora poderia prejudicar as demais operações. Talvez esse seja o ano para reformular as outras casas, trazer mais frescor e novidades, para depois ter outro.”

Equacionar o tamanho do mercado foi uma lição aprendida um ano antes da pandemia bater na porta, quando mesmo com as casas cheias, as contas começaram a empatar. “Com o crescimento ficamos, de certa maneira, deslumbrados com o faturamento alto, trabalhávamos apenas para vender, mas estávamos no escuro nas contas”, confessa.

Um dos destaques do ÍZ : queijo coalho tostado com melado de cana, pó de manteiga de garrafa, ciboulette e falso caviar de jabuticaba

O susto fez com que Baiocchi e o sócio Domingos Neto revisassem todos os processos e custos numa operação-tarefa de seis meses para colocar tudo novamente nos trilhos antes que o lockdown pegasse todos de surpresa. Com tudo fechado, e as casas faturando apenas 15% da receita regular com o delivery, a salvação veio com a criação do Burger for a Day, instalado dentro da estrutura do buffet.

O projeto, que antes não passava pela cabeça do chef acostumado à alta gastronomia, nasceu em apenas uma semana com a proposta de lançar um sanduíche diferente por dia, em quantidade limitada, valendo-se inicialmente dos estoques pré-existentes nas casas do grupo.

“Durante a pandemia o faturamento dela sozinha foi acima de R$ 450 mil/mês, praticamente igualando com o do restante das casas. E em alguns meses chegando a R$ 500 mil, R$ 600 mil”, lembra. “Se eu tivesse só a hamburgueria e não o passivo dos outros negócios teria feito um pezinho de meia bom durante a pandemia.”

O chef avalia agora se reformula ou não a receita que deu certo. Quem sabe mudar o nome? Está inquieto novamente. Nada de acomodação.