O CEO de uma grande gestora de private equity, com alguns bilhões de reais sob gestão e outros bilhões à disposição para investir, diz incrédulo: “Não sei o que está acontecendo com esse mercado de private equity. Está tudo parado”, diz ele, que pediu anonimato, ao NeoFeed.
Em outros períodos como o que o Brasil está vivendo, de empresas precisando de capital em um complicado cenário macroeconômico e a janela de IPOs fechada, as gestoras de private equity faziam a festa. Com dinheiro farto, entravam no momento certo nas empresas.
“Foi assim na época da crise do governo Dilma”, diz esse mesmo gestor. Mas agora, repete ele, “está tudo muito esquisito”. Não é algo que esteja acontecendo só com a gestora dele. Trata-se de uma percepção geral entre algumas empresas de private equity com as quais o NeoFeed conversou.
Os números atestam isso. Nesse primeiro trimestre, a indústria de private equity anotou a pior marca desde 2019, quando os números do setor passaram a ser compilados. Foram investidos apenas R$ 600 milhões, 92% a menos do que no último trimestre de 2022 e 87% a menos do que no primeiro trimestre do ano passado.
Os dados fazem parte de um relatório que acaba de ser divulgado pela ABVCAP (Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital) em parceria com a TTR Data. No total, os investimentos em Private Equity (PE), Venture Capital (VC) e Corporate Venture Capital (CVC) atingiram R$ 2,2 bilhões no período.
O montante é 79% menor do que o apresentado no último trimestre de 2022 e significa uma redução de 84% se comparado ao primeiro trimestre do ano passado. Indagado sobre o que está acontecendo no setor, o presidente da ABVCAP, Piero Minardi, acredita que o setor está em compasso de espera.
Ele lista alguns pontos. Um deles é o cenário político. No último trimestre do ano as gestoras já estavam mais cautelosas por conta das eleições presidenciais. “Nesse primeiro trimestre, nos primeiros cem dias de governo, esperava-se um rali na bolsa e isso não aconteceu”, diz Minardi.
O segundo ponto foi o fator Americanas, que assustou os investidores diante do rombo escondido e o enxugamento de crédito. Por último, uma resistência dos empreendedores, donos de empresas, em aceitar valuations menores.
Nos últimos três anos, o mercado assistiu a uma efervescência, que beirou a irracionalidade, nos valuations de empresas fechadas, startups e companhias abertas. Só que o mercado mudou e a cabeça dos empreendedores não. “Ficaram mal-acostumados com valuations irreais”, diz um gestor de uma empresa de private equity.
Minardi, por sua vez, acredita que o mercado será destravado no segundo semestre. Por conta dos juros altos, muitas empresas estão com dívidas financeiras muito altas – e crescendo. Isso vai levar a uma onda de oportunidades para empresas de private equity entrarem.
É um movimento que vem desde o ano passado. A Actis, por exemplo, desembolsou R$ 700 milhões por uma posição na Omega Energia. A General Atlantic, famosa por ter investido na XP no início da companhia, comprou um lote de ações da XP no ano passado por US$ 100 milhões porque o papel era considerado barato.
Na Locaweb, onde começou a montar posição no ano passado, a gestora atingiu mais de 15% de participação. Agora, a GA está liderando uma proposta em conjunto com a Dragoneer para fechar o capital da Arco Educação, companhia que ela já tinha posição e ajudou a levar para IPO na Nasdaq em setembro de 2018. A proposta na mesa é de US$ 355 milhões. Detalhe: são velhas conhecidas da GA.
Um tarimbado gestor de private equity diz ao NeoFeed que esse movimento vem acontecendo porque na bolsa o valuation está dado, está barato e os fundos não precisam fazer uma diligência tão grande para investir – as informações são públicas. Mas não parece ser tão simples assim.
Outro profissional de mercado tem uma visão mais crítica. “Desde o evento Americanas, os investidores internacionais passaram olhar as empresas com mais atenção”, diz ele. “A diligência em uma empresa de capital fechado aumentou muito e nas de capital aberto fica ainda mais complicado assinar um NDA, coloca as empresas de private equity em uma zona cinzenta.”
A boa notícia é que, por enquanto, os negócios não estão saindo por falta de liquidez. As gestoras estão com dinheiro. “E não temos pressa”, diz um dos gestores ouvidos pelo NeoFeed. “Vai demorar mais um pouco, mas o segundo semestre será mais quente.”