Se, de um lado, a maré baixa. De outro, ela sobe. É a regra dos mares. No mundo dos investimentos, isso parece que está acontecendo. Ao mesmo tempo em que os aportes de venture capital estão secando no mercado brasileiro, os recursos aplicados por fundos de private equity estão em alta.

É o que revela a pesquisa realizada pela KPMG e pela Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP), divulgados com exclusividade pelo NeoFeed.

Nos seis primeiros meses deste ano, os investimentos de private equity atingiram R$ 16,5 bilhões, uma alta de 617,4%. Em venture capital, os aportes chegaram a R$ 11,6 bilhões, queda de 48,2% no primeiro semestre. “O fluxo de investimento em private equity caiu drasticamente nos últimos anos”, diz Piero Minardi, sócio da Warburg Pincus e presidente da ABVCAP. “Agora, está voltando a subir de novo.”

Levando-se em conta apenas os números do segundo trimestre de 2022, o desempenho é ainda mais impressionante. No período, os aportes de fundos de private equity alcançaram R$ 11,3 bilhões, alta de 2.725%. O volume de venture capital recuou 62% para R$ 5,2 bilhões.

O resultado em private equity foi impactado por alguns cheques muito grandes, o que não acontecia há muito tempo nessa indústria, que costuma investir em empresas de porte médio e mais maduras de diversos setores da economia.

É o caso do aporte que a gestora canadense Brookfield fez, em maio deste ano, na compra de 12 prédios corporativos da BR Properties. Foi um negócio de R$ 5,92 bilhões, em uma das maiores transação imobiliária dos últimos anos no Brasil. Os edifícios adquiridos estão espalhados por São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília.

Outro cheque bilionário foi a venda dos ativos da Unidas para a Brookfield, que controla a Ouro Verde. O negócio, de R$ 3,5 bilhões, era uma condição do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para que a fusão de Localiza e Unidas fosse aprovada.

Além desses dois negócios bilionários, a Advent comprou uma fatia de 25% da empresa de tubos e conexões Tigre por R$ 1,35 bilhão, em fevereiro deste ano. O recurso será usado pela companhia para avançar em sua estratégia de internacionalização.

“A base de comparação é muito baixa e houve acordos enormes no período”, afirma Roberto Haddad, sócio-líder de private equity e venture capital da KPMG no Brasil. “Mas o private equity está voltando a ter a relevância que sempre teve no Brasil.”

O que explica essa volta do private equity? Há múltiplas razões. Uma delas é que nos últimos três anos, o Brasil não cresceu, o que prejudica esse tipo de investimento, muito atrelado a expansão do País – o que é diferente de venture capital.

Nos seis primeiros meses deste ano, os investimentos de private equity atingiram R$ 16,5 bilhões, uma alta de 617,4%

Outra razão foi a alta liquidez do mercado de capitais brasileiro e global, com taxas de juros baixas e, em muitos casos, negativas. Isso fez com que muitas empresas, em especial no Brasil, pulassem o estágio do private equity e fossem direto para o IPO.

No ano passado, por exemplo, foram realizadas 45 ofertas iniciais de ações na B3, que captaram R$ 65,2 bilhões. Neste ano, até agora, nenhum IPO aconteceu na bolsa brasileira. E a expectativa é de que a janela possa se abrir apenas no fim deste ano ou no começo de 2023, após as eleições presidenciais.

“Um mercado que não está fechado é o mercado privado, que a gente chama aqui de private placement”, disse Eduardo Miras, head do banco de investimentos do Citi Brasil, em entrevista ao NeoFeed, referindo-se a fundos de private equity e investidores institucionais.

De acordo com Miras, esses investidores têm bolso fundo para investir em transações privadas e estão olhando para companhias que têm potencial de virem ao mercado nos próximos dois, três anos. “O ciclo de venture capital começa a dar espaço para companhias mais estabelecidas, que são líderes de mercado e têm planos de negócios interessantes.”

Minardi, da Warburg Pincus e da ABVCAP, vislumbra também o começo de um novo ciclo virtuoso para o private equity. Em sua visão, muitos dos recursos que iriam para a China, por conta de lockdowns e outras restrições ao capital estrangeiro, vão precisar ser alocados em outras regiões.

“E o Brasil tem uma boa chance de ser um dos destinos desses recursos em um ou dois anos, passando a volatilidade e a eleição, independentemente de quem vencer”, diz Minardi.