LIMA - Que a gastronomia peruana ganhou o mundo isso já se sabe. São vários os restaurantes do país que ano após ano emplacam os primeiros lugares nas listas dos melhores. O Central, do chef Virgilio Martinez, por exemplo, acaba de ser eleito o melhor do mundo da lista do 50 Best Restaurants de 2023, depois de ter conquistado a vice-liderança no ano anterior.
No ranking deste ano, outros dois peruanos subiram na classificação como o Maido (6º) e o Kjolle( 28º), e o Mayta (47 º) acaba de estrelar nesta seleção. A Casa do Porco, único brasileiro entre os 50, ficou na décima segunda posição.
Assim como o Central, os outros três já estão figurando no circuito internacional dos viajantes gourmants em Lima. Há pouco mais de três meses, contudo, um novo e bem guardado segredo abriu as portas em Surco, um bairro fora do eixo turístico mais conhecido de Miraflores ou mesmo do boêmio Barranco – hot spot muitas vezes comparado à Vila Madalena, em São Paulo.
Abrir as portas é, na verdade, maneira de falar. O restaurante do chef Ricardo Goachet funciona apenas com reservas e atende 25 comensais por noite. Não há placas na fachada e a entrada se dá por uma porta lateral da casa que um dia foi do sogro do chef e onde sua esposa, Fiorella, passou a infância e adolescência.
Apenas depois de descer uma escada e chegar à cozinha é que se encontra o salão, um lugar iluminado, com algumas plantas e uma decoração clean e ao mesmo tempo aconchegante.
Goachet faz questão de passar nas mesas explicando o menu aos clientes. Gente, como ele mesmo diz, que “gosta de comida e vivenciar novas experiências”. Mesmo servindo à la carte, ele recomenda o menu degustação.
“É uma oportunidade de experimentar um pouco de tudo, um jeito bem basco de vivenciar a comida”, contou Goachet, ao NeoFeed, relembrando os tempos em que viveu nessa região da Espanha e um dos redutos da gastronomia mundial.
“Minha escola de gastronomia é basca: tem técnica, rigor e amor pela tradição”, afirmou ele, que além de ter passado por alguns restaurantes da região, também se formou no Basque Culinary Center.
A carta muda com frequência e é baseada no que tem de mais fresco na temporada - os insumos vêm de uma agrofeira diretamente dos produtores em um bairro não muito distante dali - e privilegia ingredientes tipicamente peruanos como “olluco”, um tubérculo andino, peixes, mariscos como navajas (pouco conhecido dentre os brasileiros), além de alimentos comuns na Amazônia peruana, como “cecina” - uma carne de porco defumada.
“Minha cozinha é baseada em três pilares: técnica basca, muito uso de vegetais, como na culinária mediterrânea, e ingredientes peruanos.”
A “cecina” aparece no menu degustação no formato de croquetes servidos com um molho agridoce de manga. Já as navajas vêm acompanhadas com aspargos, outro legume abundante em terras peruanas. O peculiar “olluco” substitui as batatas e é o protagonista de uma “tortilla peruanita”, em clara alusão a um clássico da culinária espanhola, as tortillas de papas. O menu degustação com 7 pratos sai por 220 soles por pessoa, aproximadamente 300 reais e não inclui bebidas.
Depois de 16 anos vivendo na Espanha, e tido experiências em diversos restaurantes do país, incluindo um ano na cozinha de Martín Berasategui, um três estrelas Michellin, no País Basco, e em Valência, Ricardo, hoje com 39 anos, voltou à Lima em 2018.
Após dois anos procurado um imóvel para montar seu restaurante, estava com tudo pronto para abertura no início de 2020, quando foi surpreendido pelo fechamento de todos os estabelecimentos por conta da pandemia.“Tinha montado uma equipe com amigos que conheci nos anos que morei fora: espanhóis, argentinos e peruanos de outras regiões”, lembra.
“Na impossibilidade de trabalhar e se manter, todos foram morar na minha casa”, conta, relembrando o delicado momento para empreendedores de forma geral.
Criativo, burlou as dificuldades impostas pela pandemia fazendo caixas de “tapeos” - petiscos para serem finalizados pelos clientes em casa - e também compartilhando sua rotina e dos amigos nas redes sociais. “Às vezes postava a gente tomando vinho, pintando paredes, ou cozinhando uma paella valenciana”, conta.
Foi nessa época que também começou a fazer jantares temáticos em sua própria casa, uma vez por semana, para apenas 10 convidados. Tendo que criar um cardápio novo por semana, teve uma ideia nostálgica para a receita de uma sobremesa, e assim criou as “fresas con leche condensada”, uma releitura da clássica combinação infantil de morangos com leite condensado.
Atualmente no menu do Verbena, é pedida obrigatória para encerrar a noite: morangos cozidos, gelatina de Campari, sorbet de frutas vermelhas, musse e merengue de leite condensado e, para finalizar, beterraba em pó. Ingredientes simples, mas misturados com o a técnica e rigor da escola basca.