A unidade brasileira da alemã Bayer no segmento farmacêutico resolveu fazer o “arroz com feijão” com seus produtos que tiveram a patente expirada, ao mesmo tempo em que vai concentrar seus esforços em medicamentos inovadores, em áreas como oncologia, ginecologia, pneumologia e diabetes, que garantem mais margem à farmacêutica.

O plano imediato é terceirizar a venda de produtos que já não contam mais com exclusividade no uso do princípio ativo. São oito medicamentos, que representam R$ 450 milhões de faturamento, cerca de 30% da receita da empresa no País.

“Pelo valor da marca, muitas pessoas seguem comprando o produto de referência, mesmo com os genéricos. E, para isso, é preciso estar muito presente nos pontos de venda, com uma equipe grande. Como hoje a Bayer é uma empresa de inovação, a gente achou por bem trazer alguém para fazer isso melhor”, diz Adib Jacob, presidente da divisão farmacêutica da Bayer para o Brasil e América Latina, em entrevista ao NeoFeed.

Nesse sentido, a empresa realizou duas parcerias para a venda desses produtos mais consolidados. Em março, a unidade brasileira da farmacêutica uruguaia Megalabs passou a ser responsável pela força de vendas de produtos como o contraceptivo Diane 35, o Angeliq (para reposição hormonal) e o anticoagulante Xarelto.

A farmacêutica Biolab, que fica em Agudos, no interior de São Paulo, assumiu o trabalho comercial envolvendo o contraceptivo oral Qlaira. “Não tínhamos espaço de investimento para aplicar nesses medicamentos com legado. E não vínhamos dando muita atenção a eles. Nossa estratégia agora está nos produtos inovadores”, afirma Jacob.

Antes de a patente do Xarelto expirar no Brasil, em 2021, o produto figurava no topo do ranking dos remédios mais vendidos do País, à frente do Dorflex, da Sanofi. Segundo a Bayer, ele representou 40% do faturamento da divisão farmacêutica no Brasil.

Hoje, genéricos a partir do princípio ativo rivaroxabana (genérico do Xarelto) são produzidos pelas farmacêuticas Eurofarma, EMS, Medley, Cimed, entre outras, que capturam parte importante da receita do medicamento no País.

“Há poucos setores que dependem tanto de investimentos em inovação quanto a indústria farmacêutica. E, dado o apetite das fabricantes de genéricos, a perda pode ser brutal”, diz Jacob.

Entre os produtos inovadores lançados recentemente no País está o Nubeqa, medicamento oral utilizado para proteger o paciente de câncer, principalmente em fase de metástase. Em 2025, ele deve passar de R$ 200 milhões em receita, a partir de novas indicações. Incorporado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), ele é comercializado via planos de saúde.

Na área cardiorrenal, a Bayer lançou o Firialta, que protege o rim do paciente diabético. A expectativa é de que alcance R$ 50 milhões em vendas em 2025. Na ginecologia, uma das principais áreas de atuação, a farmacêutica alemã aguarda a incorporação de DIUs hormonais para endometriose.

“Temos feito muitos desenvolvimentos no País. Hoje, há 85 estudos clínicos no Brasil em várias áreas. A participação dos brasileiros nas pesquisas globais é muito grande. E não apenas de privados. Há pacientes do setor público nesses estudos.”

Mais espaço na rede pública de saúde

A segunda alavanca de crescimento no Brasil passa pelo aumento da presença dos produtos da Bayer no rol de medicamentos oferecidos pelo governo federal no Sistema Único de Saúde (SUS), que hoje representa 20% do faturamento da Bayer.

Os demais 80% da receita da Bayer no Brasil estão concentrados no setor privado, divididos entre a venda direta nas farmácias e as compras realizadas pelas operadoras de saúde.

Mas o caminho de crescimento no setor público esbarra na burocracia da aprovação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec).

Um dos produtos é o Jivi, utilizado para pacientes com hemofilia. Ele foi incorporado há três anos pelo SUS, mas ainda não está disponível no serviço público. O Nubeqa, para câncer de próstata, é outro que está no horizonte para pedido de incorporação, principalmente a partir de nova indicação.

“Nos próximos três anos, a gente acredita que vai ter entre três ou quatro medicamentos com grande aplicação para serem incorporados ao SUS”, afirma Jacob. “Vamos ter uma discussão empática com os agentes públicos para decidir os valores desses medicamentos. É preciso respeitar o orçamento do SUS.”

Segunda unidade que mais cresceu no mundo em 2024, atrás apenas dos Estados Unidos, a subsidiária brasileira faturou R$ 1,5 bilhão, alta de 9,3%, contra aumento de 3% da divisão global. Para os próximos dois anos, a meta é chegar a R$ 2 bilhões.

Segurança jurídica

Para o presidente da companhia, no entanto, ainda que seja inevitável a entrada representativa das farmacêuticas que produzem genéricos, é necessário, na avaliação dele, que a segurança jurídica das patentes seja respeitada.

“A lei brasileira assegura 20 anos de depósito da patente, mas é importante que isso seja sempre garantido. As regras são claras. O país que não honra inovação não faz bem para sua população”, diz Jacob.

De acordo com ele, dados clínicos de uma nova indicação não são protegidos. E isso pode ser aperfeiçoado. "É preciso mais celeridade na liberação da patente”, afirma Jacob. “Trazer um remédio para o mercado custa pelo menos US$ 1 bilhão. A cada mil moléculas descobertas, só duas ou três viram medicamentos.”

Nessa argumentação, há uma preocupação embutida: segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares (ProGenéricos), o mercado de genéricos vem crescendo mais no País do que o mercado total.

Nos últimos 12 meses, a alta no volume das cópias autorizadas foi de 8,62%, contra 5,68% de todo o setor. A venda de medicamentos genéricos no Brasil em 2024 alcançou R$ 20,4 bilhões.

Até como uma forma de blindar esse avanço, a Bayer investe cerca de 20% do valor das vendas em projetos clínicos, apoio médico e produção de novos medicamentos. Isso significa um montante de R$ 300 milhões no Brasil.

Na América Latina, a divisão farmacêutica da Bayer alcançou receita de € 825 milhões no ano passado. Globalmente, o faturamento da companhia alemã na área farma foi de € 4,65 bilhões.

Somando todas as divisões - crop science (área agrícola), consumer health (itens que não precisam de prescrição médica) e farmacêutica -, a empresa alcançou receita de € 46,6 bilhões em 2024.

Na Bolsa de Frankfurt, as ações da Bayer acumulam valorização de 42% em 2025. A companhia está avaliada em € 27 bilhões.