Em maio deste ano, Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, visitou à fábrica da Ford, em Dearborn, Michigan. Na ocasião, ele relembrou a infância, quando o pai administrava uma rede de concessionárias, e destacou o papel essencial que a indústria automobilística exerceu na geração de empregos e no crescimento do país.
Mas, à parte das recordações, ressaltou. “O futuro da indústria automobilística é elétrico. Não há como voltar atrás. E a indústria automobilística americana está em uma encruzilhada”, afirmou Biden, na ocasião. “A verdadeira questão é se vamos liderar ou ficar para trás nessa corrida e dependeremos de outros países.”
Diante das transformações do setor, Biden elegeu um rival, em particular. “No momento, a China está liderando essa corrida. É um fato. Hoje, eles têm tem uma escala de manufatura maior do que todos os outros países. E estão usando essa escala para produzir baterias não apenas na China.”
Na sequência, o mandatário deixou bem claro que os carros elétricos e, em particular, as baterias que os alimentam são o mais novo front de batalha na disputa entre Estados Unidos e China. E acrescentou: “Eles acham que vão vencer. Bem, eu tenho um recado: eles não vão ganhar. Não podemos deixá-los.”
Biden, de fato, não tem economizado nesse embate. Em abril, o presidente americano anunciou um plano de investimentos de US$ 174 bilhões para impulsionar a categoria e dar tração ao país nessa corrida.
Entre outras ações, o plano vai oferecer incentivos fiscais na compra de carros elétricos fabricados no país, além de subsídios para governos estaduais e locais, e o setor privado, para construir uma infraestrutura nacional de 500 mil postos de recarga de baterias até 2030.
A fabricação doméstica das baterias é, no entanto, um dos componentes de maior peso para que os Estados Unidos consigam alcançar ou mesmo superar o país da Grande Muralha. E há um bom caminho a ser percorrido para que isso aconteça.
Dona do maior mercado interno de carros elétricos do mundo, com 1,33 milhão de unidades vendidas em 2020, segundo a consultoria EV-Volumes, a China investiu mais de US$ 60 bilhões em infraestrutura e subsídios para incentivar o crescimento do setor.
Hoje, a categoria responde por 12% das vendas totais de carros no mercado chinês. Nos Estados Unidos, que somaram 328 mil veículos elétricos vendidos em 2020, esse índice é de aproximadamente 2,1%.
Mas é justamente no campo das baterias, um dos componentes mais essenciais da categoria, que a China mostra o seu amplo domínio. Hoje, o país é responsável por 75,3% de toda produção global, de acordo com dados da consultoria Benchmark Mineral Intelligence. A fatia dos Estados Unidos nessa cadeia, por sua vez, é de 7,6%.
“Agora, as baterias de íon-lítio são globalmente geopolíticas”, afirmou Simon Moores, diretor da Benchmark, em entrevista ao portal americano Business Insider. “Elas estão no topo da agenda chinesa, da União Europeia e, pela primeira vez, dos Estados Unidos. Tudo isso aconteceu este ano.”
Moores destaca ainda o tamanho do desafio à frente dos Estados Unidos. “Eles estão atrasados nesse capítulo”, disse. “Leva cinco anos para construir e ampliar uma fábrica de baterias. Então, investir agora significa que os Estados Unidos terão uma capacidade significativa de células de bateria em 2027 para ganhar uma posição na indústria emergente de elétricos.”
Mesmo ampliando a carga nesse circuito, a Benchmark entende que o cenário global não passará por mudanças significativas nos próximos anos e estima uma participação de cerca de 11% dos Estados Unidos até 2030, contra 68,6% da China.
Para ganhar terreno, um dos caminhos escolhidos por Biden tem sido incentivar a reforma de fábricas de automóveis em todo o país para adaptá-las a essa nova realidade. Ao mesmo tempo, algumas montadoras têm anunciado projetos e investimentos nessa área.
Em junho, por exemplo, a General Motors (GM) ampliou seu plano em carros elétricos com a nova estimativa de investir US$ 35 bilhões no segmento até 2025. Como parte desses esforços, a empresa anunciou a construção de duas fábricas de células de bateria até meados dessa década. Hoje, a GM já tem unidades em desenvolvimento no Tennesse e em Ohio.
Antes, em maio, a Ford informou que assinou um memorando de entendimento para a criação de uma joint-venture com a sul-coreana SK Innovation, voltada à fabricação de células de bateria para veículos elétricos nos Estados Unidos.
“À medida que a indústria muda, temos que recorrer a recursos internos agora”, afirmou Jim Farley, CEO da Ford, na época. O executivo ressaltou que, além das transformações do setor rumo aos carros elétricos, as dificuldades atuais com a escassez de semicondutores só reforçaram essa demanda.
Outra empresa com planos de fabricação de células de bateria no país é a Stellantis, fruto da fusão entre a FCA e a PSA. No início desse mês, o grupo anunciou um plano de investimento de € 30 milhões até 2025, que inclui cinco fábricas nesse prazo, na América do Norte e na Europa.
Já conhecido, outro investimento que reforçará a base americana é a ampliação da Gigafactory, da Tesla, instalada em Nevada, cujo projeto tem 30% das suas etapas concluídas.