O regime de metas para inflação no Brasil completa 24 anos e está pronto para mudança e consolidação. Mudança no tempo de aferição de resultados e consolidação da meta de 3% já vigente para 2024 e 2025 e cuja extensão a 2026 é vista como um gatilho para o corte do juro em agosto.

O Conselho Monetário Nacional (CMN) se reúne na quinta-feira, 29 de junho. A meta de inflação de 2026 é ponto alto da agenda econômica nos próximos dias que serão curtos para a relevância dos eventos programados.

Congestionarão a rotina, relatórios oficiais sobre crédito; dívida pública; resultado fiscal; dados do mercado de trabalho; IPCA-15 e IGP-M de junho, que devem avançar em território negativo; e sondagens setoriais da FGV Ibre.

Inflação e juro vão manter o Banco Central (BC) no centro das atenções – e críticas – do governo e de empresários frustrados com a falta de sinalização explícita de corte da Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom).

Mas não faltará oportunidade para o BC de Roberto Campos Neto se explicar.

Na terça, 27 de junho, a ata do Copom poderá renovar expectativas de queda da Selic mantida em 13,75% e acompanhada por sutis mudanças no comunicado sobre a decisão que abriu uma fresta para a queda do juro.

O comitê reconheceu melhora nas perspectivas de inflação, afirmou que os passos futuros da política monetária serão dependentes dos dados, mencionando a dinâmica da inflação corrente, e excluiu a afirmação de comunicados anteriores de que não hesitaria em retomar a alta do juro se o processo desinflacionário não ocorresse conforme o esperado. Menos mal.

Na quinta-feira, 29 de junho, Campos Neto e Diogo Guillen, diretor de Política Econômica do BC, apresentam o Relatório Trimestral de Inflação. Uma oportunidade e tanto para o BC marcar posição: refirmar o discurso ainda conservador ou adotar um tom mais flexível quanto à gestão monetária.

A meta da reunião

Neste mesmo dia, segundo programação oficial, acontece a reunião do CMN que deverá seguir o rito definido há décadas para o mês de junho e definir a meta de inflação a ser cumprida três anos à frente e com chance de rever alvos fixados anteriormente.

As metas passíveis de revisão são as já definidas para 2024 e 2025 idênticas a 3% e com margem de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos com o objetivo de acomodar choques de preços.

Apesar da pressão do presidente Lula, ministros palacianos e PT para a elevação das metas e pelo corte do juro, é improvável que o Conselho altere o alvo de 3%. Assim, evita o risco de ampliar a desancoragem de expectativas.

De todo modo, a composição do colegiado favorece o cumprimento do desejo de Lula. Integram o CMN, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, e o presidente do BC, Roberto Campos Neto. O Executivo, portanto, tem maioria de votos. A palavra final.

Entretanto, é mais provável que o colegiado opte por uma decisão consensual que evite arranhões à credibilidade do BC – executor legal do regime de metas – e suavize a prática do regime, demonstrando, de quebra, que o governo tem compromisso com o controle da inflação futura.

É isso o que indica o insistente esforço de comunicação liderado pelo ministro Fernando Haddad, que semeou com sucesso junto ao mercado financeiro, a ideia de que a mudança provável no regime de metas será a derrubada do ano-calendário para a aferição de resultados.

O ano-calendário, que compreende o período de janeiro a dezembro, poderá ser substituído pela “meta contínua de inflação”. E, se confirmada, sua adoção tira o BC da camisa de força imposta pela obrigação legal de cumprir metas em ano fechado. Chova ou faça sol.

A “meta contínua”, se acolhida pelo CMN, dará maior flexibilidade à política monetária e também deverá fortalecer a expectativa de que o Copom já prepara os motores para iniciar a redução da Selic – anseio geral da nação.

O Brasil foi um dos primeiros países do mundo a abraçar o regime de meta de inflação. O precursor foi a Nova Zelândia, em 1990. Aqui, o regime começou a ser praticado em 1999, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. E a primeira meta foi fixada em 8%.

Mas durante 14 anos dos 24 de vigência, a meta brasileira foi mantida em 4,50%. Não é à toa, portanto, que o presidente Lula já disse e repetiu 4,50% como um percentual palatável para a inflação no país.

Praticamente os dois primeiros mandatos de Lula (2003 a 2010) transcorreram com esses 4,50% que vigoraram de 2005 a 2018. Em 24 anos, a meta foi ajustada em alguns momentos e descumprida 7 vezes.

É fato que a maioria dos países que pratica o regime, construído para dar mais previsibilidade à economia e ao planejamento de famílias, empresas e até do governo, segue o ano-calendário para manter a inflação nos trilhos.

Porém, os maiores bancos centrais do mundo – Federal Reserve (Fed) e Banco Central Europeu (BCE) – não trabalham com prazos. E, nem por isso, suas políticas são ineficientes ou escapam de questionamentos.

O encontro dos banqueiros centrais

Eles devem emergir no Fórum dos Bancos Centrais, em Sintra, Portugal, de segunda a quarta-feira, 26 a 28 de junho.

Promovido pelo BCE anualmente, esse fórum é o “esquenta” para o Simpósio de Jackson Hole, organizado pelo Fed de Kansas City, em agosto. Jackson Hole é o palco de maior relevância para encaminhamento de mensagens que orientam políticas dos bancos centrais no mundo inteiro.

Há um ano, em Sintra, quando o Fed ainda estava no início da alta de juro e o BCE sequer tinha iniciado seu movimento, os bancos centrais comprometeram-se a tomar “todas as medidas necessárias” para controlar a espiral inflacionária, ainda que o ajuste fosse doloroso às suas populações.

Trazer a inflação para a meta de 2% vigente nos EUA, Zona do Euro e Inglaterra era a palavra de ordem das principais autoridades monetárias do Ocidente para frear pressões derivadas do desarranjo de cadeias de suprimentos e do choque de energia decorrente da guerra da Ucrânia – variáveis que elevaram a inflação aos maiores níveis em 40 anos.

Agora, um ano depois, a inflação global arrefece e o fim do aperto global parece mais próximo. Não está claro, porém, quando isso ocorrerá porque a inflação ainda supera, em muito, as metas.

Enquanto Jerome Powell, presidente do Fed, voltava a sinalizar mais altas de juros em pronunciamento no Senado americano, na quinta-feira, 22 de junho, elevaram suas taxas o Banco da Inglaterra, o BC da Suíça e o BC da Turquia, enquanto na Indonésia e Filipinas as taxas ficaram inalteradas.

Esses movimentos confirmam que a incerteza – ainda que menor – prevalece e eleva a expectativa com o Fórum dos Bancos Centrais em Sintra, quando discursam no encerramento a turma do barulho: Christine Lagarde, presidente do BCE; Powell, do Fed; e Andrew Bailey, do Banco da Inglaterra.