Brasília - Luis Felipe Monteiro não é um secretário com tanta visibilidade no governo do presidente Jair Bolsonaro. Poucas pessoas, até do próprio governo, sabem, de fato, quem ele é. Mas ele está à frente de uma área que deve trazer uma economia de R$ 1,7 bilhão só neste ano.

Monteiro é secretário do Governo Digital e tem a missão de tirar o Brasil da vergonhosa posição que ocupa hoje entre os países mais digitalizados do mundo.

“Somos o 44º país do mundo em oferta de governo digital, entre 193. É uma posição muito ruim, já que somos a quarta população usuária de internet”, diz Monteiro. “Nossa meta, até o fim desta gestão, é chegar entre os 15 países mais digitais do mundo.”

No mundo, a transformação digital começou a ser tratada de forma mais acelerada por volta de 2001, sendo a Estônia um dos pioneiros a elaborar as estratégias para o segmento e que se apresenta como referência até hoje, seguida pela Dinamarca.

O começo dessa virada rumo a uma maior digitalização dos serviços começou com a criação da Rede InovaGov. A ideia é atrair usuários para um único endereço e o governo já está migrando todos os seus sites ligados ao poder executivo para um portal único, o www.gov.br, que visa unificar o acesso dos cidadãos aos serviços.

“A gente não quer que as pessoas tenham que descobrir onde o governo está na internet”, afirmou Monteiro. Não é, definitivamente, um trabalho simples. A estimativa é a de que existam mais de 1,5 mil sites com a extensão gov.br.

Em conjunto com a Secretaria de Governo, que cuida da comunicação do governo, já foram atualizados para o novo portal todas as páginas ligadas ao Palácio do Planalto. “Agora estamos começando o trabalho de migração dos órgãos diretos, dos ministérios em si”, diz.

Em relação aos usuários, o portal único já conta com 45 milhões de pessoas cadastradas. Ainda é pouco diante do mar de brasileiros que acessam a internet. Atualmente, os dados mostram que 70% da população acessam a internet. Ou seja, estaria habilitada para receber o serviço digital.

Além disso, a estimativa é que cada serviço digital custe 97% a menos do que uma transação presencial. “É só pensar em como os bancos operavam há alguns anos e como operam hoje, com mais tecnologia. Eles atendem dez vezes mais clientes, com dez vezes menos o custo por transação”.

Apesar de o brasileiro ser adepto a novidades e de existir um relativo consenso sobre a importância da modernização dos serviços, o Brasil teve sua primeira estratégia digital publicada em 2016.

“Nosso trabalho começou na transição de governo, eu estava no governo do presidente Michel Temer e fui convidado a ficar. E ali demos continuidade ao que vinha sendo feito, mas também fizemos uma sensibilização para mostrar que o quanto a informação digital é capaz de mudar o país”, explica.

Indicado pela Apolitical, organização internacional voltada à melhoria do serviço público, como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo em governo digital, em 2018, Monteiro é servidor da carreira de Analista de Planejamento e é um dos profissionais que acompanha o movimento de inovação no setor público desde o seu início.

Luis Felipe Monteiro, secretário de Governo Digital

Antes de assumir a Secretaria de Governo Digital, ele passou pela diretoria de Modernização e foi secretário de Tecnologia da Informação e Comunicação do Ministério do Planejamento.

Ao relatar as principais conquistas da área, Monteiro cita exemplos práticos que facilitaram a vida das pessoas, como a carteira internacional de vacinação digital e a emissão da carteira de trabalho em apenas um dia.

Isso significa que, ao baixar um aplicativo, você terá todas as informações da sua vida profissional virtualmente. Antes, para ter o documento, o brasileiro levava 17 dias. Apesar do serviço já estar disponível para o cidadão, ainda há o desafio de fazer com que as empresas se modernizem e aceitem o documento digital.

Segundo a área técnica da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, a única possibilidade de a empresa solicitar a carteira de trabalho física e não aceitar a digital é se ela ainda não estiver obrigada a usar o eSocial.

“Com o eSocial, a empresa não tem mais a obrigação de realizar as anotações no documento físico, que são integralmente substituídas pelos registros no sistema. Não é necessária nenhuma outra adesão ou cadastro por parte do empregador. Do ponto de vista do empregado, basta ter o CPF”, explicou o órgão em nota.

No ano passado, o governo contabilizou mais de 500 serviços com acesso online. A meta, de acordo com o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Paulo Spencer Uebel, é que até o fim deste ano mais de mil serviços estejam à disposição do cidadão brasileiro.

“Até o fim da gestão queremos ter 100% dos serviços digitalmente transformados”, disse Uebel em um café da manhã com jornalistas, no qual NeoFeed estava presente. A essência da reforma administrativa que será debatida neste ano no Congresso Nacional carrega justamente a premissa de um governo mais digitalizado.

“O ministro Paulo Guedes sempre comenta que a nossa estratégia é digitalizar tudo e não aumentar a quantidade de funcionários públicos, pois esse modelo já está esgotado”, diz Uebel.

É preciso, entretanto, preparar os funcionários públicos para a revolução digital que está a caminho. Em 2019, em parceria com o Enap, mais de 15 mil funcionários públicos receberam treinamento, segundo o ministério da Economia.

Além desse desafio, há também o de comunicar para a população o que está sendo feito. Um exemplo concreto disso é o da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), que passou a ser digitalizada em novembro do ano passado.

Apesar da facilidade, até agora, apenas 5,4 milhões dos mais de 24 milhões de brasileiros habilitados passaram a ter seu documento online. Monteiro ressalta que, para conseguir angariar “cidadãos-clientes”, o governo tem que ser simples e acessível.

Renato Rebelo Morais, diretor de projetos do BrazilLAB, um hub de inovação que acelera soluções e conecta empreendedores com o Poder Público, destaca que atualmente o orçamento do governo federal para a área de TI é de R$ 8 bilhões. “No mundo estima-se um mercado de US$ 400 bilhões, é um mercado potencial muito grande”, afirma Morais.

A economia gerada com a digitalização dos atendimentos pode variar dos R$ 1,7 bilhão até R$ 4,7 bilhões ao ano, dependendo da velocidade de implantação das mudanças

Segundo um estudo realizado pelo BrazilLAB, em parceria com a Fundação BRAVA e o Centre for Public Impact (CPI), a economia gerada com a digitalização dos atendimentos pode variar dos R$ 1,7 bilhão (número estimado pelo governo) até R$ 4,7 bilhões ao ano, dependendo da velocidade de implantação das mudanças.

Os cenários foram projetados até 2030 têm como modelo a Austrália, país que elaborou um plano decenal para ampliar os atendimentos via canais digitais.

O estudo, que levantou 24 experiências internacionais de aplicação de tecnologias nas políticas do sistema previdenciário, mostra ainda que boas práticas internacionais podem trazer inspiração para atacar problemas presentes em quatro áreas da Previdência Social. São elas arrecadação de tributos, pagamento de benefícios, operações internas e atendimento ao cidadão.

A estimativa levantada é que o sistema previdenciário brasileiro deixa de arrecadar, por ano, R$ 66 bilhões com a inadimplência fiscal e outros R$ 62 bilhões com fraudes, sem contar as perdas de R$ 33 bilhões com a não-aderência dos informais, resultando em um total aproximado de R$ 161 bilhões.

Por causa de irregularidades como falsificações, registros desatualizados e ingerência interna (por exemplo, fornecimento de dados incorretos), o sistema gasta, aproximadamente, R$ 123 bilhões a mais todos os anos.

A BrazilLAB trabalha atualmente com 12 mil startups e já mapeou pelo menos 1.500 que estão aptas a prestar serviços ao governo. “O governo federal tem avançado na pauta de digitalização, mas ele ainda está muito focado em entregar serviços, mas a gente enxerga oportunidades de automatizar outros universos dentro do governo”, diz Morais.

O diretor da BrazilLAB reconhece que a questão da segurança é fundamental para o governo e para que a digitalização avance. “A evolução na segurança dos dados tem que andar junto com a transformação digital”, afirma.

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