A malha rodoviária do Brasil tem pouco mais de 1 milhão de quilômetros, mas apenas 212 mil ou 12,4% do total, são pavimentados. O investimento para recuperar apenas os trechos pavimentados é estimado em R$ 72 bilhões pela Confederação Nacional de Transporte (CNT).

Com o custo de manutenção, essa conta sobe para R$ 94 bilhões. Trata-se de uma cifra que o governo federal e os estados não têm e nem terão nos próximos anos.

O grande gargalo do transporte rodoviário, responsável pela movimentação de mais de 60% das mercadorias entre os estados, está justamente nessas estradas asfaltadas, mais movimentadas e essenciais para unir um país de dimensões continentais.

Um amplo levantamento realizado neste ano pela CNT mostrou que 66% das rodovias pavimentadas do País - a maioria federal - foram consideradas regulares, ruins ou péssimas, ou seja, apresentaram algum tipo de problema. São nada menos que 2.610 pontos críticos.

Diante desse quadro, especialistas do setor consultados pelo NeoFeed apontam três caminhos que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva poderá seguir para tapar o enorme buraco do setor rodoviário.

Uma opção é manter o atual sistema de concessões. O segundo, apostar num modelo mais simples, em que empresas cuidam de pequenos trechos estaduais em troca de remuneração, fora do modelo de concessão.

A terceira alternativa passa por investimentos do Estado, por meio de recursos do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), responsável pelas rodovias federais, ou de programas estaduais, através de funding ou regras fiscais.

Mesmo assim, o diagnóstico não prevê uma melhora estrutural no médio prazo, tamanho os problemas da malha. Nesse cenário, o caminho mais factível é dar continuidade ao atual modelo de concessões de rodovias.

A Associação Brasileira de Concessão de Rodovias (ABCR) conta com 50 empresas associadas, responsáveis por 72 concessões, sendo 26 de rodovias federais, 44 estaduais e 2 municipais. Da malha rodoviária pavimentada, cerca de 25 mil quilômetros (12% do total) são administrados por concessionárias.

“As rodovias sob concessão têm um investimento em manutenção e operação três vezes maior do que as mantidas pelo governo federal", afirma Marco Giusti, diretor-executivo da ABCR.

"E isso se materializa em vários benefícios, incluindo redução de custo logístico e até do sistema de saúde, pois as rodovias sob concessão são quatro vezes mais seguras que as federais”, complementa.

O custo operacional (peças, combustíveis e pneus) por quilômetro numa estrada não pedagiada razoável ou ruim é o dobro da média de uma estrada sob concessão.

No governo do presidente Jair Bolsonaro, 12 mil quilômetros de sete rodovias federais foram entregues para concessão, o que gerou R$ 48,8 bilhões em investimentos privados. A expectativa é de que, nos próximos seis anos, outros 27 mil quilômetros sejam transferidos para a gestão privada, o que deve representar quase R$ 140 bilhões em investimentos.

A boa notícia é que o novo governo deverá dar seguimento ao programa – mesmo porque não tem opções. O otimismo do setor se deve ao fato de o chefe do grupo de transição de Infraestrutura, o senador Alexandre Silveira (PSD-MG), conhecer bem os problemas da área – ele foi diretor-geral do DNIT no primeiro governo Lula (2003-206).

Entre as sugestões do novo governo, Silveira acenou com a elevação dos desembolsos no setor por meio da PEC da Transição e por emendas parlamentares do Orçamento de 2023.

Por isso, Giusti, da ABCR, aposta num programa de parceria ou prestação de serviços com a inciativa privada, baseado numa modelagem que está sendo feita em alguns estados.

“Não se trata de concessão. Um grupo privado assume o investimento, contrata prestadores de serviços para manutenção de um trecho de uma rodovia em troca de remuneração”, diz. Esse modelo seria mais adequado para trechos de rodovias com menor movimento e os contratos, com prazo menor de duração.

Sem opções

A terceira alternativa exigiria investimentos do governo, o que parece inviável. Para se ter uma ideia da falta de recursos federais, o orçamento necessário para manutenção de rodovias para 2023 é estimado em R$ 12 bilhões. O DNIT não deve ter nem um terço desse valor pela proposta de Orçamento para 2023 apresentada pelo Ministério da Infraestrutura.

O engenheiro Paulo Resende, coordenador do Núcleo de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral e um dos maiores especialista do País na área, afirma que as concessionárias controlam menos de 10% da malha rodoviária pavimentada. Uma concessão só é interessante em rodovias com tráfego acima de 5 mil veículos por dia.

Nesse sentido, a previsão de novas concessões federais é positiva – trechos previstos da BR-116, BR-381 e BR-101, por exemplo, somam 10 mil quilômetros com tráfego de até 9 mil veículos por dia.

Mas, mesmo que o programa de concessões seja ampliado, será necessário um aumento de financiamento de estradas publicas, por causa do enorme volume de rodovias sob gestão do governo, seja federal ou nas esferas estaduais.

O pesquisador da Fundação Dom Cabral estima que será necessário um investimento anual em rodovias de, no mínimo US$ 10 bilhões (R$ 50 bilhões) nos próximos dez anos para colocar o País em posição de competitividade das dez principais economias mundiais.

Resende defende alternativas de investimentos do Estado, incluindo a emissão de títulos de longo prazo, os chamados bonds de infraestrutura, para levantar recursos para a manutenção e a melhoria da malha rodoviária brasileira.

“Todas as projeções indicam que o modal rodoviário vai prevalecer nos próximos 20 anos. A carga geral é rodoviarista e pulverizada, tem grande valor agregado e exige flexibilidade na logística porta-a-porta", diz ele. "Não tem jeito, o Brasil ficou dependente dessa logística."